A adrenalina de voar a mais de 200 km/h, de cabeça para baixo, com dezenas de pessoas ao redor, faz parte da rotina do mineiro Rogério Menezes. Nascido em Belo Horizonte e radicado em Boituva, no interior de São Paulo, o atleta de 42 anos faz parte do grupo de 16 brasileiros convocados para integrar o The Vertical Elite, grupo internacional que tentará quebrar o recorde mundial de salto em formação vertical entre os dias 16 e 22 de agosto, na cidade de Ottawa, no estado de Illinois, nos Estados Unidos.
A meta é ousada: reunir 200 atletas em queda livre, todos de cabeça para baixo, formando uma figura sincronizada no céu. O objetivo é superar o recorde atual, de 164 paraquedistas, estabelecido em 2015, também nos Estados Unidos.
Em entrevista exclusiva para O TEMPO Sports, Rogério conta que, além de reunir o grupo, todo o salto foi estudado a partir de cálculos e precisou ser redesenhado após duas tentativas fracassadas, em 2018 e 2022, para que agora se concretize.
“Achavam que 164 era o limite. Mas os organizadores estudaram o que deu errado, mudaram a lógica da formação, como os grupos se aproximam no ar. Essa nova engenharia funcionou nos eventos menores. Agora vamos tentar com 200”, explica o paraquedista.
Vice-campeão brasileiro na modalidade Freefly (que inclui acrobacias e movimentos no ar com movimento do corpo) ele atua também como organizador de eventos no Brasil. Em 2023, liderou o recorde sul-americano de formações verticais, com 54 atletas conectados em queda livre, em Boituva, no interior de São Paulo.
“Foi tudo muito rápido. Eu fiz meu primeiro salto duplo em 2019, na Serra do Cipó, como turista. Vi outras pessoas saltando sozinhas e decidi me aprofundar. Um mês depois, eu já estava fazendo o curso. Comecei a ir pra Boituva duas vezes por mês e logo mergulhei no alto rendimento”, conta Rogério Menezes.
Antes de ser convocado para a equipe do recorde mundial, o atleta mineiro participou de diversos eventos classificatórios nos Estados Unidos, como os recordes estaduais da Califórnia e da Flórida. Nessas formações, com grupos de 30 a 60 paraquedistas, os organizadores avaliaram o desempenho de cada paraquedista e depois selecionar os nomes que estarão no salto principal
“Ninguém te convida à toa. Você vai crescendo passo a passo. Começa no túnel de vento, depois salta sozinho, depois com um instrutor, depois em grupos menores. Quando você começa a mostrar consistência, começa a receber os convites. Mas com o convite vem também a cobrança”, reforça.
Salto exige técnica e cuidado
Campeão brasileiro de paraquedismo, Rogério diz que o salto Head Down faz parte da técnica chamada Freefly, que permite voar por todos os eixos do corpo: de barriga, costas, sentado ou de cabeça para baixo. A modalidade exige alto controle corporal, treino intenso e atenção a cada detalhe.
“Essa posição, apesar de parecer radical, é aerodinâmica. O corpo corta o vento melhor. A gente consegue mais velocidade e mais controle. No salto, cada pessoa precisa estar no ponto exato, no tempo exato. Se um atleta erra o tempo, atrasa, chega mais rápido ou fora do eixo, coloca todo mundo em risco”, explica Rogério Menezes (foto).
Durante o salto nos EUA, para estabelecer o novo recorde mundial Head Down (de cabeça para baixo), os atletas deixarão nove aeronaves a quase 6 mil metros de altitude (o equivalente a um prédio de 2 mil andares). Cada um seguirá um caminho definido para ocupar o lugar certo na figura que será formada no ar. A separação, momento em que os atletas se afastam para abrir os paraquedas, é a etapa mais sensível.
“O momento mais crítico é o break-off, que é quando todo mundo se separa. Ninguém pode abrir o paraquedas muito perto do outro. Na hora da abertura, pode haver instabilidade, o paraquedas pode sair torto ou desestabilizar. Se você estiver próximo de alguém, uma colisão é fatal.”
Rogério diz que chegar ao mundial é resultado de um processo longo, que começa em treinos individuais no túnel de vento e passa por formações menores em eventos seletivos no Brasil e no exterior.
“Ninguém chega no mundial de um dia para o outro. Você vai subindo degrau por degrau. Na abertura, o paraquedas pode pender para os lados ou apresentar alguma pane. Se estiver muito perto, o risco de colisão é real.”
De salto turístico a recordista sul-americano
A trajetória no esporte começou há apenas seis anos. O primeiro salto foi em 2019, como turista, na Serra do Cipó, em Minas. A experiência o levou a buscar formação profissional, frequentar Boituva, fazer cursos e participar de eventos. Logo passou a organizar recordes e a representar o Brasil em desafios no exterior.
“Fiz o curso um mês depois do salto duplo. Me envolvi rápido. Passei a ir para Boituva duas vezes por mês e logo comecei a praticar em alto rendimento.”
Rogério participou dos recordes estaduais da Califórnia e da Flórida, nos Estados Unidos. Também foi um dos responsáveis pelo recorde sul-americano, com 54 pessoas em formação, realizado em Boituva. Ele lembra que o salto mais impactante da carreira não foi em um recorde tradicional, mas em um evento noturno, com pirotecnia, que ele mesmo organizou.
“Voar à noite, com o céu escuro, a cidade iluminada lá embaixo e uma cascata de fogo saindo do seu pé enquanto você está de cabeça pra baixo… é difícil explicar. A visão pra quem tá no chão parece de um meteoro chegando.”
Regras oficiais
Por ser a modalidade mais perigosa, em que se atinge a velocidade de cerca de 350 km/h no ar, o salto em grandes formações Head Down é considerado a “Fórmula 1 do paraquedismo”. A tentativa de quebra de recorde mundial de paraquedismo vai contar com o uso de nove aeronaves, que subirão até 19 mil pés de altitude. A essa altura, o grupo terá 60 segundos para realizar a manobra.
Para o recorde ser validado, os 200 paraquedistas deverão se conectar com precisão (conforme um padrão previamente definido e bastante complexo) e sem qualquer erro, antes de se separarem e abrirem os paraquedas.