Uma mulher de 1,90m não passa despercebida, especialmente se seu rosto é familiar em qualquer lugar do mundo onde se pratica vôlei. Mas a discrição é característica certa para descrever Walewska, belo-horizontina campeã olímpica em Pequim (2008). A ex-jogadora demorou 11 anos para aderir ao Instagram. Foi o ponto de partida para dar aos fãs mostras de sua história e de seu dia a dia, que tiveram o relato ampliado no documentário "O último ato" (2022) e, agora, são detalhados na autobiografia "Outras Redes", que em BH será lançada nesta quarta-feira (8), às 19h.
Cosmopolita por exigência do trabalho, Walewska morou no Paraná (quando jogou pelo Rexona Curitiba), em São Paulo (Açúcar União São Caetano, Vôlei Futuro, Vôlei Amil e Osasco Audax), na Itália (Perugia), na Espanha (Murcia) e na Rússia (Odintsovo). Em Minas, também viveu em Uberlândia (Dentil Praia Clube), onde encerrou a carreira em maio de 2022, aos 42 anos de idade e após 30 de esporte. Com a aposentadoria, fixou residência na capital paulista, mas a base da família segue em Belo Horizonte.
O palco para divulgar o livro na capital mineira não poderia ser mais sugestivo: o Minas Tênis Clube, onde a ex-atleta chegou aos 12 anos. Como os tempos são outros, Walewska não precisa mais pegar o extinto 2004 (linha de ônibus substituída pelo Move 5106) para ir do bairro Jaraguá à rua da Bahia, mas, daquela época, guarda uma saudade que espera desfazer em breve.
"Estou convocando para o lançamento do livro as meninas que jogaram comigo quando eu tinha 14 anos, e elas estão confirmando que vão, que vamos nos reunir e fazer uma foto daquela turma. Tenho esse resgate também em Belo Horizonte, dessa coisa afetiva que eu não tive tempo de cultivar tanto, mas que permanece muito em mim", afirma a ex-jogadora, que, em entrevista a O Tempo Sports, também falou sobre a vida pós-vôlei e analisou o momento atual da seleção brasileira feminina.
Walewska, como e quando surgiu a ideia de fazer o livro, em parceria com o escritor Teco Condado?
Primeiro, tivemos a ideia de entrar no Instagram, porque eu nem tinha. As pessoas perguntavam muito como eu era fora da quadra, o que gostava de fazer, onde ia... Começamos a fotografar os lugares onde frequento em São Paulo, os museus, os restaurantes, os teatros de música clássica, que eu amo. Depois, dentro da temporada, minha equipe sugeriu registrar meus últimos momentos na quadra e contar minha história desde os 12 anos, quando peguei o ônibus e entrei no Minas para fazer meu primeiro teste. Começamos a filmar o documentário. Quando parei de jogar, um amigo que tinha acabado de escrever um livro falou 'sua história é tão bonita, deveria passar isso para um livro'. Minha equipe novamente disse 'vamos contar sua história, mas o documentário termina com você saindo das quadras. Vamos contar no livro o que você vai fazer depois.' O livro, acho que a partir do sétimo capítulo, tem essa nova fase.
O livro mata a curiosidade dos seus fãs sobre aspectos da sua vida pessoal?
Eu entro um pouco na minha infância, em algumas coisas que eram lindas, como a festa do Dia dos Pais, em que a gente ensaiava danças e músicas. Com a pressa do documentário, a gente não consegue entrar nessas histórias. Algumas delas também tem meu marido, que foi muito importante, e amigos. Tem muita coisa que o livro dá e que o filme não consegue, por falta de tempo.
E fala, também, de momentos importantes da sua carreira, como os bastidores da derrota marcante do Brasil para a Rússia, nas semifinais das Olimpíadas de Atenas, e a conquista olímpica quatro anos depois, num processo que parece ter sido de grande aprendizado?
Conta como aquela equipe entendeu a derrota e como eu e a [levantadora] Fofão, as remanescentes de 2004, lideramos esse time. Como foi muito duro para a gente essa responsabilidade de liderar e ajudar o Zé (técnico José Roberto Guimarães), como conseguimos construir esse novo caminho diante de derrotas que ainda aconteceram e como a gente chegou lá. Falo, também, da minha sensação de ter pego essa medalha em 2008 e do que ela representa para mim, de quantas mãos estavam lá comigo, juntas, das gerações todas que construíram isso. Está muito detalhadinho, é o ponto alto do livro.
No livro você também fala sobre a vida agora fora das quadras. Em setembro do ano passado, você foi comentarista do Sportv no Mundial feminino de seleções. O que achou da experiência?
Se eu fizer isso de novo, não vou fazer completamente diferente – fui super genuína –, mas com uma tranquilidade muito maior, porque minha estreia já aconteceu. Terminei minha participação muito mais segura do que comecei. É uma coisa trabalhosa, porque você tem que estudar. Eu fiz parte disso por muitos anos e é muito fácil para mim ler um jogo, mas, para saber informações das outras jogadoras, onde estão etc., precisa ter foco e estudar, para fazer direitinho, porque gosto de fazer bem as coisas.
Você pensa em ter essa experiência de comentarista mais vezes?
Esses eventos esporádicos são bacanas. Fiquei 20 dias no Rio, pude viver outras coisas. Gosto muito de conhecer os lugares, serve para isso também. Esses eventos esporádicos me chamam mais a atenção do que uma coisa fixa. Não quero, hoje, me definir como uma coisa, porque o meu leque é grande. Tenho muitas coisas para fazer e não gostaria de ficar presa só em uma.
E como tem sido sua rotina agora fora das quadras?
Eu estou 'correndo', mas é correndo com agenda, horário, calma e estrutura. É um 'correndo' diferente, escolhendo o que quero fazer, dizendo 'não' para coisas com as quais não me identifico, para parcerias que não me traduzem. Tempo e escolha são duas coisas que, hoje, eu consigo ter. E aí vou formatando meu dia a dia, pensando na saúde também, em buscar novos exercícios, para não ficar naquela coisa maçante da academia, que fiz durante anos. Sinceramente, não estou tendo prazer em ir à academia. Tenho buscado novas formas de movimento. Uma delas foi uma parceria linda que eu fiz com o Ivaldo Bertazzo, um ex-dançarino que lida com a reeducação do movimento.
E como está o joelho? (Desde o início da carreira, Walewska lidou com uma lesão no joelho, pela sobrecarda de treinos)
O joelho está lindo! (risos). Dia desses, um amigo do prédio me chamou para ir a um jogo de vôlei que ele participa às quintas-feiras. Eu fui e foi a primeira vez que bateu uma vontadezinha, sabe? Fiz um aquecimento com ele, com bola. Acho que vi a alegria com que eles estavam jogando e acho que isso se refletiu em mim. E aí me deu uma vontade de bater uma bolinha, mas, com homens, aquela rede gigantesca... fiquei só no aquecimento. E eu não jogo há muito tempo. Falei 'não vou arriscar, não'.
Fora isso, não dá vontade de bater uma bola de vez em quando?
Zero vontade. Não tive vontade ainda de entrar na quadra, de pegar uma bola jogar.
Mas certamente você tem acompanhado a seleção, que tem contado com muitas jogadoras jovens. Como você analisa a renovação na posição de central, em que você atuava?
O meio de rede teve uma safra muito boa nos últimos dez anos, pelo menos. Essa renovação tem que acontecer. Não podemos ter esse imediatismo que o brasileiro tem de que as meninas já estão prontas para ganhar uma nova medalha. Isso é uma construção. O vice-campeonato no último Mundial foi muito importante, porque nove das jogadoras nunca tinham disputado a competição. E quem já jogou sabe que Mundial e Olimpíada são diferentes dos outros campeonatos. A falta de experiência aconteceu na final do Mundial. É necessário que as jogadoras de 19 e de 20 e poucos anos disputem os campeonatos. Temos que entender o processo e o caminho e, às vezes, a gente tenta atropelar esse processo.
Serviço I
O quê: lançamento do livro "Outras Redes", autobiografia de Walewska
Quando: quarta-feira (8), às 19h
Onde: Minas Tênis Clube, na rua da Bahia, 2.244, bairro Lourdes, em BH
Serviço II
O quê: lançamento do livro "Outras Redes", autobiografia de Walewska
Quando: quinta-feira (9), às 17h
Onde: Loja Gam's, na rua Vancouver, 29 (lojas 8 e 9), bairro Jardim Canada, em Nova Lima