Cicatrizes

Mineiros que presenciaram tragédias em 2022 falam sobre novas perspectivas

Mineiros contaram ao Super Notícia como vão iniciar o novo ano com gratidão, companheirismo e compaixão, apesar das tragédias que vivenciaram em 2022

Por Clarisse Souza
Publicado em 30 de dezembro de 2022 | 03:00
 
 
 
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Quais memórias do ano velho você pretende levar para 2023? No momento em que somos levados a fazer um balanço das experiências de 2022 e a projetar planos para o futuro, quem viveu grandes desastres ou situações traumáticas no ano que termina pode se perguntar: como deixar para trás a dor e achar motivação para recomeçar? Para ajudar a encontrar essa resposta, o Super ouviu especialistas em psicologia e revisitou a história de quatro mineiros que tiveram a vida impactada por perdas e tragédias que repercutiram no noticiário nacional em 2022.

Sobrevivente da tragédia de Capitólio – que deixou dez mortos em 8 de janeiro, após uma rocha se desprender do cânion no Sul de Minas e atingir lanchas com turistas –, a fotógrafa Ana Martins da Costa, de 50 anos, ainda lida com as cicatrizes do desastre. Não se trata apenas da marca no pulso direito, que precisou de reconstrução com placa e parafusos após fratura. São cicatrizes emocionais, deixadas pela lembrança de afundar nas águas do lago de Furnas enquanto pensava: “Meu Deus, não me deixa morrer. Tenho dois filhos pequenos”. 

Moradores de BH, Ana, o marido e as crianças sofreram lesões e precisaram lidar com os danos psicológicos causados pela tragédia. Porém, quase um ano após o acidente, a fotógrafa afirma que a gratidão por ter sobrevivido já é maior que o trauma, e é este o sentimento que ela pretende carregar para 2023: “Agradeço a Deus todos os dias, rezo por todo mundo que estava lá. É muita gratidão”.

Sentimento semelhante é descrito pelo engenheiro David Abu-Gharbil, de 31 anos. O mineiro de Coqueiral, no Sul de Minas, morava e trabalhava em Kiev, na Ucrânia, quando o primeiro bombardeio russo atingiu a cidade, em 24 de fevereiro, dando início à guerra. Em 17 dias em fuga rumo à Polônia, ele viu um rastro de destruição e morte e quase foi atingido por bombas até deixar o país, com ajuda da embaixada. 

Apesar da situação traumática, Abu-Gharbil extrai boas lembranças dos dias de conflito. “Fiz amigos que vou levar pra vida e vi muita gente se ajudando. É essa compaixão e companheirismo que quero levar para 2023”, conta.

Lembranças que emocionam

O engenheiro David Abu-Gharbil se emociona ao lembrar das crianças em meio ao caos da guerra na Ucrânia. “Algumas atravessavam (a fronteira com a Polônia) sozinhas, porque os pais tinham morrido”, conta. Também o impactou o pedido de ajuda de um soldado ucraniano de 18 anos: “Ele perguntou se não conseguiríamos passaporte brasileiro para ele sair dali”.

Sobreviventes de Capitólio ainda enfrentam traumas

Quase um ano após a tragédia de Capitólio, o jornalista Alexandre Campello, de 54 anos, marido de Ana Costa, não superou totalmente o trauma que a família vivenciou no desastre. Para ele, presenciar o desespero dos filhos, de 9 e 11 anos, foi o mais difícil. “O que mais me impactou foi ver os dois machucados esperando socorro. Foi um sofrimento muito grande. Você fica numa condição de incapacidade, impotência”, relata. 

Foi preciso acompanhamento psicológico para que a família conseguisse conviver com as memórias daquele dia chuvoso, porque eles tinham pesadelo e não conseguiam dormir, como contou Ana. “Mesmo assim, a gente ainda fica assustado quando ouve barulho de chuva ou vê muita água”, detalhou a fotógrafa.

Alexandre disse que, apesar de já ter superado grande parte da dor, ainda sofre. “Se você me perguntar se eu voltaria ao local, eu diria que não”, admite.

Gratidão gera solidariedade

A gratidão por ter escapado com vida da tragédia de Capitólio aflorou em Ana Costa o desejo de ajudar outro sobrevivente. O proprietário da lancha em que ela estava perdeu a embarcação, avaliada em R$ 400 mil. Ao saber do prejuízo, a fotógrafa criou uma vaquinha virtual e arrecadou R$ 22 mil em prol do profissional. 

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