Neste domingo (15/6), o secretário de Estado de Cultura e Turismo, Leônidas Oliveira, postpou em seu perfil nas redes sociais que os Saberes do Rosário: Reinados, Congados e Congadas deverá se tornar nesta terça-feira (17) patrimõnio cultural imaterial do Brasil pelo Instituto dos Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Para o presidente do Iepha-MG, João Paulo Martins, o reconhecimento reforça a importância desses grupos na formação de nossa identidade e cria uma política de patrimonialização que também tem um caráter de reparação histórica.

“Faz com que se criem políticas públicas para esses grupos e que eles se apropriem delas para adquirir mais direitos, Quando se tem reconhecimento nacional, os interesses se tornam os mesmos, e assim podemos trabalhar ações de salvaguarda em conjunto com a União”, destaca.

Nesta matéria selecionamos cinco localidads que promovem fstas e congados e reinados para você visitar e participar nos próximos meses.

Minas Novas

Com mais de 200 anos, a Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha (foto acima, Reprodução / Instagram), começou no domingo (15/6), com novenas cantadas em latim, barraquinhas no entorno da Igreja e leilões.

Segundo Irene Barbosa Sena, irmã do Rosário, um dos destaques da festa é o reinado, quando rei, rainha e sua corte desfilam pelas ruas centenárias, acompanhados pelo Congado de São Benedito e Santa Ifigênia, dos tambozeiros do Rosário, da Banda de Taquara Bem Posta e da Banda de Música Euterpe Conceição.

Na madrugada do dia 12 de junho, no entanto, congadeiros e moradores buscam água no rio Fanado para lavar a igreja, seguido por um almoço. No dia 23, acontece a Buscada da Santa, quando rei, rainha, grupos folclóricos e moradores vão buscar Santa na Pedra do Rosário, sobem as ruas em cortejo até a igreja e são recebidos pelo padre. À noite, após a novena, o mastro é hasteado com show pirotécnico, e as casas dos reis velhos e novos recebem o “chá da fogueira”.

No dia 24, Dia do Reinado, a guarda de honra, o congado, a Banda de Taquara, a Banda Euterpe e os tamborzeiros buscam o rei e a rainha, ou juízes maiores, eleitos no ano anterior, em suas residências e desfilam em cortejo pela cidade, com celebração de missa. Na sequência, tem lugar a tradição de distribuição de doces, quitandas e licores, em especial a cavaca, patrimônio imaterial do município. No final da tarde, é realizada a coroação, seguida de shows.

 “O Dia do Cofre, ou Dia da Posse (25), é o único em todo o ano que uma pessoa pode se tornar irmão do Rosário”, conta Irene. Os irmãos, então, vão à igreja vestidos de Opa, uma veste litúrgica amarela, em busca do cofre para recolher os donativos. À noite todos participam da coroação dos “reis novos”, que assumirão o reinado no ano seguinte.

Chapada do Norte

A 22 km de Minas Novas está Chapada do Norte, onde a tradição dos congados ultrapassa dois séculos. A Festa de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos (foto acima, crédito: Acervo Iepha/MG / Divulgação) foi o segundo bem inscrito no “Livro dos Saberes - Livro da Celebração”, atrás apenas do modo de fazer o queijo da região do Serro.

“No trabalho de pesquisa, o Iepha alegou a preservação da essência da festa, da cultura, da culinária e da manutenção das tradições de matriz africana por mais de dois séculos”, enfatiza Maurício Costa, procurador geral da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos.

Segundo Costa, quem assistir à festa verá a preservação de suas principais características. O evento ocorre no segundo domingo de outubro – neste ano, a festividade é celebrada de 3 a 13 de outubro. É uma expressão genuína de religiosidade e fé.

Em outubro, durante 15 dias, a celebração preserva o Meio Dia de Novenas (primeiro dia da novena), as novenas (preparação espiritual para a festa), os leilões (durante cinco noites após a celebração da novena), a lavagem da igreja pelas mulheres, a bênção e a distribuição do angu (distribuição de refeição), a buscada da santa (encenação da aparição da Virgem do Rosário), o mastro a cavalo (após a última celebração da novena e considerado o apogeu da festa), o reinado (caminhadas e cortejos que conduzem os reis festeiros), as missas, a distribuição do doce, a coroação, a buscada do cofre, os divertimentos noturnos, a feira dos mascates, os tamborzeiros e a congada.

Ouro Preto

Na cidade histórica, o som dos tambores, as cores, a dança e a tradição marcam a Festa do Reinado de Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito (foto acima, créfito: Anne Souz / Divulgação). O evento é realizado em todo segundo domingo de janeiro. 

A festa celebra a figura do rei Galanga, que veio do Congo ao Brasil como escravo, foi batizado como “Francisco” e se estabeleceu em Ouro Preto, realizando a primeira festa de congado. Na cidade histórica, ele conseguiu comprar uma mina de ouro e, depois, sua alforria e a de outros conterrâneos, reconstruindo seu reinado. E assim nascia a lenda de Chico Rei.

Os festejos foram retomados em 2019 e hoje são patrimônio imaterial de Ouro Preto. Atualmente, a cidade tem cinco grupos de congada e um de Moçambique, mas a festa reúne cerca de 35 guardas de congado, moçambique, marujos, caboclos, catupés e folias de várias regiões do Estado.

Kedison Guimarães, capitão da Guarda de Moçambique, Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia e diretor de Promoção da Igualdade Racial de Ouro Preto, conta que, no primeiro domingo de janeiro, os grupos pedem a benção na escadaria da igreja de Santa Efigênia e hasteiam as bandeiras dos santos.

Paralelamente às festividades, são realizadas palestras, oficinas e apresentações na Casa da Ópera. Na quinta-feira, começa o Tríduo Pascal, que dura até sábado. E, no domingo, a festividade se inicia às 5h com Alvorada em direção à igreja matriz, com a chegada das guardas de outras cidades. Um cortejo vai até a capela de Nossa Senhora do Rosário de Padre Faria e depois até a Mina de Chico Rei, onde pega o trono e o leva à capela, com realização de missa e descendimento das bandeiras.

Quem quiser conhecer mais sobre a festividade pode assistir ao documentário “A Fé que Canta e Dança”, produzido, em 2021, pelo fotógrafo Vinícius Terror.

Uberlândia

Na cidade do Triângulo Mineiro teria surgido a primeira ideia de registro das congadas de Minas como patrimônio cultural do Brasil. A Festa de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito  (foto acima, crédito: Acervo Iepha-MG / Divulgação) é uma das mais antigas do país e data de 1874.

Em 2006, Jeremias Brasileiro e Anderson Ferreira, então funcionários da Secretaria Municipal de Cultura, solicitaram que as congadas de Minas se tornassem patrimônio cultural do Brasil, com o apoio dos municípios de Campos Altos, Frutal, Monte Alegre e da Fundação Cultural de Uberaba e da Associação de Congados e Moçambique de Ibiá. 

“A primeira redação foi produzida por mim”, fala orgulhoso Jeremias Brasileiro, comandante geral da Festa do Congado de Uberlândia desde 2005. “Enquanto detentores desses saberes, temos a responsabilidade de manter essa tradição e, inclusive, de participar diretamente de sua construção”, acrescenta.

Jeremias Brasileiro (foto abaixo, crédito: Terezinha Souto / Divulgação) que também participou da redação final do dossiê, ele diz que o reconhecimento do Iphan é uma sustentação jurídica importante para a manutenção dos congados e reinados em todo o país

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De acordo com Denilson Nascimento, presidente da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, existem atualmente 24 grupos de congos, marujos, marinheiros, catupés e moçambiques na cidade, além de quase 4.000 dançadores.

A festa começa com a Bandeira do Aviso no dia 6 de julho, quando os grupos levam suas bandeiras de devoção para a igreja de Nossa Senhora do Rosário para bênção e o início das visitas às casas dos devotos para rezas e leilões visando arrecadar fundos. As novenas começam nos nove dias que antecedem o domingo da festa.

No segundo domingo de outubro, os grupos de congadas se concentram na sede da irmandade e seguem em cortejo até a praça do Rosário, num percurso de 2 km. No mesmo dia, à tarde, tem missa, procissão e coroação de Nossa Senhora.

Na segunda-feira, os ternos de congados visitam os casais de festeiros e um casal de Rei Perpétuo. A partir das 18h, retornam à igreja no centro para fazer a despedida. Em ambos os dias, cada grupo se apresenta para um público de cerca de 30 mil pessoas.

Cada terno estabelece seu ritmo musical e cânticos específicos, sendo seus capitães e madrinhas puxadores desse ritmo. Devido a essa diversidade marcante, há vários instrumentos que simbolizam o festejo – como caixas, sanfonas, viola, pandeiros, chocalhos, patagonas, gungas e instrumentos de percussões diversos. 

A história do congado em Uberlândia remonta ao século XIX, quando a cidade ainda era um pequeno povoado. Naquela época, os negros escravizados realizavam suas festividades em segredo, já que não tinham liberdade para praticar suas crenças e tradições. Com o fim da escravidão em 1888, os negros puderam expressar livremente sua cultura e religiosidade. 

O congado em Uberlândia teve um papel importante na formação da identidade cultural da cidade, reunindo pessoas de diferentes origens e classes sociais em torno de uma tradição comum.
 
No Dia de Reis, 6 de janeiro, Chico Rei e sua família foram conduzidos em um grande cortejo festivo pela irmandade e coroados na capela de Santa Efigênia. Após a coroação, ele e sua família desfilaram pelas ruas de Vila Rica, embaixo de um pálio e escoltados por uma guarda de moçambicanos. Assim foi criada a Festa do Reinado em Ouro Preto, posteriormente reproduzida em várias cidades de Minas Gerais.

Montes Claros

Na cidade do Norte de Minas, a 184ª edição das Festas de Agosto (foto acima, crédito: Júnia Rebello / Divulgação)  acontece entre 12 e 17 do mesmo mês, coincidindo com o feriado de Assunção de Nossa Senhora. As Festas de Agosto contam com a participação de cerca de 600 dançantes, divididos em sete grupos: quatro ternos de catopés (que usam vestes brancas e capacetes, dois com devoção à Nossa Senhora, e dois a são Benedito); dois de marujada (de referências portuguesas, com vestes vermelhas e azuis); e um de caboclinhos (representando os indígenas, com vestes vermelhas e penas coloridas).

Durante cinco dias, catupés, marujos e caboclinhos desfilam pelas ruas da cidade vestidos com suas fardas, tocando instrumentos e dançando em homenagem a Nossa Senhora do Rosário, Divino Espírito Santo e são Benedito. Fora do período que é propriamente destinado à festa, os ternos visitam a casa dos mordomos (que guardam as bandeiras) e os reinados, responsáveis pelos cortejos nas festas.

Na quarta, quinta e sexta-feira, os ternos de congadas buscam as bandeiras dos santos do dia e conduzem seus reinados até a igreja do Rosário, onde participam de uma missa, cantando no templo. No domingo, a procissão com todas as guardas e os cortejos se reúnem e realizam uma missa em frente à igreja. “São três festas em uma, onde os ternos celebram seus santos de devoção”, resume Júnia Rebello, secretária municipal de Cultura e Turismo.

Paralelamente à festividade, é realizado também o Festival Folclórico, um evento onde outros grupos de cultura popular com referências africanas e tradições regionais diversas  encontram espaço para apresentações nas ruas e nos palcos, fazendo shows e apresentações. Além das manifestações folclóricas e da parte religiosa, o evento conta com programação de apresentações musicais e barraquinhas de comidas típicas. 

“Em Montes Claros, abrimos a festa a outros grupos da região. Nosso congado também é diferente, mais alegre e festivo, exatamente porque os escravizados daqui trabalhavam nas lavouras e na pecuária e tinham um grau maior de alegria", conclui Júnia.