“Professora, eu não consigo ler nem em português, que dirá em inglês!”. A professora da língua estrangeira Lucienne de Castro, da Escola Municipal José Madureira Horta, na região da Pampulha, escutava com frequência relatos como esse durante as atividades de leitura. O diagnóstico de que seus alunos, do quinto e sexto ano do ensino fundamental, encontravam dificuldades para ler, sobretudo em inglês, gerou bastante preocupação na professora, e ela passou a pesquisar formas de sanar o problema identificado. Até que, em uma pesquisa na internet, no ano passado, encontrou o Whisper Phone.
A engenhoca permite aos alunos escutarem a própria voz enquanto leem sem interferência externa. Segundo a professora, essa possibilidade permite que todos os estudantes possam ler ao mesmo tempo, sem se incomodar com o colega ao lado. “A leitura em voz alta surte mais efeito do que em voz baixa, mas em uma sala de aula essa tarefa não é tão fácil. O WhisperPhone permite isso”, comenta a professora.
A docente descobriu o aparelho no ano passado, em um site norte-americano. Nos Estados Unidos, o método é bem disseminado e possui até uma marca própria para os produtos. O valor encontrado por Lucienne foi de US$ 60, por seis “telefoninhos”. Devido ao preço alto e a impossibilidade de chegar ao Brasil, ela procurou uma forma de baratear e elaborou uma versão artesanal da engenhoca, utilizando tubos de PVC. “Gastei R$ 65 e produzi 30 aparelhos”, comenta.
Ela testou em casa com seus filhos e depois aplicou em sala de aula. “O nível da aula melhorou, a concentração dos alunos, o comprometimento, tudo. Foi um ganho muito grande”, comemora.
FOTO: fotos arquivo pessoal |
Lucienne de Castro leciona inglês em uma escola municipal |
“Gosto de passar o que sei, faz parte da profissão de professora. E me preocupa bastante saber que muitas crianças estão com dificuldades na leitura, não estão aprendendo. O que puder fazer para ajudar vou fazer.” Lucienne de Castro, professora
Resultados. Para obter um “feedback”, ela pediu para que os estudantes escrevessem em um papel o que acharam do equipamento. “Eu achei excelente, eu percebi meus erros e tentei consertar”; “Achei ótimo, pois pude escutar melhor a minha voz e não precisei me preocupar com o que os outros achariam da minha leitura”; “Percebi que trocava as letras, antes não sabia disso”, revelaram os alunos nos bilhetes solicitados por Lucienne.
“O aparelho revelou inúmeras dificuldades dos meus alunos que passavam despercebidas. Percebi alunos que tinham dislexia, alunos com déficit de atenção. E o melhor é que ele deu autonomia e confiança para que eles possam procurar pela melhoria”, comenta.
Com objetivo de ampliar os ganhos alcançados com a engenhoca, Lucienne ofereceu sua versão para a Prefeitura de Belo Horizonte, e, neste ano, o município ministrou uma oficina para professores da rede. “Me preocupa bastante saber que muitas crianças estão com dificuldades na leitura, que não estão aprendendo. O que eu puder fazer para ajudar meus alunos e outras crianças eu vou fazer”, afirma a docente.
A Secretaria Municipal de Educação informou que o método apresentado por Lucienne – como toda boa prática apresentada por algum professor da rede – passa por avaliação, mas que ainda não há nenhum projeto sistematizado para a implantação do Whisper Phone nas escolas da rede.
Estados Unidos
Utilização. Nos EUA, o aparelho é usado, sobretudo, para ajudar na alfabetização de crianças diagnosticadas com autismo, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e dislexia.
Jovens se mostram mais confiantes
Dentro de uma aula de inglês, a pronúncia é um dos pontos mais importantes, e treinar nem sempre é uma tarefa muito fácil, pois esbarra na falta de confiança dos alunos em ler para o resto da sala. Com o “WhisperPhone”, a professora Lucienne de Castro diz que conseguiu restaurar, de maneira significativa, a confiança de seus alunos, deixando-os bem mais desinibidos para ler diante de toda a classe e até mesmo para fazer apresentações.
“Pedi aos alunos que lessem uma poesia em voz alta, e a leitura foi um pouco confusa e muito tímida. Então, entreguei a um grupo de estudantes os fones. Pedi a todos para lerem a poesia que estava no quadro, e os alunos que utilizaram os fones leram com confiança, enquanto alguns alunos que não os tinham não se ‘arriscaram’ a ler em voz alta”, conta.
Depois, ela pediu aos estudantes que utilizaram os fones para que os passassem aos colegas que não o tinham utilizado. “Dei-lhes outra poesia (‘Yellow’) e fiz o teste novamente. Resultado: os alunos leram os textos com mais confiança”, diz. “A motivação dos alunos também foi estabelecida. As crianças mostram vontade em aprender e participar”, comemora. (FM)