Do jornalista Joaquim Ferreira dos Santos, em sua última crônica: “Cronista é aquele que muda de assunto. Se resolver bater no Crivella, fa-lo-á de trivela, procurando chutar a semântica com três dedos. Sua causa maior é a procura de outras palavras, de preferência aquelas que não ostentem autoridade vernacular. O descalabro denunciatório deve ser publicado na editoria competente”.
Não sei se o que faço é crônica. Nem sei se devo, por exemplo, não seguindo à risca o conselho do colunista, escrever sobre o prefeito fujão Marcelo Crivella. Não sou carioca, nem mesmo por adoção, como aconteceu e ainda acontece com muitos mineiros. Há alguns em minha própria família. Trabalhei anos seguidos em empresa carioca. Sou apenas um apaixonado pelo Rio, cujo povo sofrido respeito e admiro.
Mesmo não sendo carioca, se pudesse (ah, se pudesse!), gostaria de ter esperado a chegada do prefeito fujão ao aeroporto, acompanhado da multidão carioca que hoje o execra, para apresentar-lhe, só para ser assinada, sua renúncia definitiva ao cargo para o qual, por inacreditável equívoco, foi eleito. Nem precisaria passar pela prefeitura para apanhar algum de seus pertences, se é que deixou por lá algum. Qualquer bedel, sem nenhum demérito à função, faria isso com eficiência. Como disse a jornalista Dorrit Harazim, em seu artigo no “O Globo” do último domingo, “Crivella é o retrato de um político que está no lugar errado, na hora errada, em companhia das pessoas erradas”.
De longe, o fujão nos enviou este vídeo: “Oi, pessoal aí do Brasil, aqui está frio pra chuchu...”E, esfregando as mãos: “Estamos trabalhando muito, pegando muita informação para saber o que há de mais moderno em termos de vigilância, em termos de Vant (Veículo Aéreo Não Tripulado), em termos de drones, em termos de informações...”
Faça você, leitor, o julgamento do recado do prefeito. De minha parte, estou certo de que não é sobre ele que queria escrever. Mudemos, então, de assunto. Aceitemos, enfim, o conselho do cronista.
O Brasil assumiu feições de um enorme esgoto, cuja tampa jamais fora aberta. A podriqueira que veio se formando ao longo de muitos anos afinal encontrou saída por meio da operação Lava Jato, que, apesar de correr o risco de ser contida, já nos deu preciosos frutos.
Por coincidência, relendo aos pouquinhos (e contendo a emoção…) as memórias de meu pai, dei com esta preciosidade, que confirma o que venho dizendo do país, mas, sobretudo, de nós mesmos: “País onde descarregam os cidadãos toda sua bílis contra governantes, que se querem perfeitos taumaturgos, e a quem muito se adula por um lado, e por outro muito se calunia, sendo, entretanto, pequeno o número dos críticos que não propugnam, para si e para os seus, as mais generosas sinecuras, nas mais gostosas sombras com água fresca, empregando concomitantes manhas para sonegarem ao máximo os tributos a que são obrigados por direito natural, por leis divinas, por leis humanas. Dir-se-ia que para tais cidadãos, às vezes muito acatados, só vai bem a causa pública quando ótima para eles”.
Continua meu pai: “Perdão, leitor amigo. Quem escreve agora estas memórias ou mixórdias contraiu, nas suas atividades pedagógicas, o hábito pouco simpático de pregar o conserto do mundo já por muitos tido por inconsertável. Se você tem a ventura de ser jovem, espere uns dois decênios, se tanto, e me dará razão”.
Isso foi escrito há cinco decênios. De quantos mais precisaremos para entender que o mundo é o retrato fiel do que somos?
'Cronista é aquele que muda de assunto' e vai de Crivella ao pai?
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