Se, grosso modo, pudéssemos separar dois grupos de espécimes de humanos, poderíamos denominar uma enorme população de “maioria silenciosa”, vulgarmente chamada de “Maria vai com as outras”, e o outro grupo dos chamados “façam o que eu mando”.
Em geral, a sociedade nos treina para sermos bonzinhos, bem-mandados, obedientes. Dizer: “sim” , “pois não”, “é claro”. Andar e agir em manada. Cabeça baixa, sem reclamar e deixando escapar suspiros recheados de falsa fé, do tipo “é Deus quem quer”. Por questões sociais, familiares, nos esforçamos ao máximo para agradar ao outro. Principalmente, se esse outro for importante, rico, chefe, autoridade ou alguém que tememos ou admiramos. Portanto, como dizer não ?! E se... ele me punir? E se... ele me evitar? E se... ele se frustrar comigo? E se... milhões de besteiras?
Ai de quem não sabe dizer um sonoro “Não!”. Simples assim. Não, pois não gosto; não, pois não quero; não, pois não estou a fim. Agradeço o convite e gosto de você. Mas , simplesmente, não! Que liberdade, que coerência. Na mesma proporção que direi “sim” feliz e entusiasticamente ao que desejo, anseio, sonho fazer ou ser. Pois quem é escravo do temor do julgamento alheio, quem é “Maria vai com as outras”, teme dizer o tal do “não”. Equivale a um terreno baldio. Uns invadem e plantam horta, outros vão lá fazer xixi e jogar lixo. E quer saber? Bem feito! Pois não se iludam. Sempre existe o grupo que adora usar e abusar dos bonzinhos, dos educadinhos, da maioria silenciosa. A turma dos invade terra, grilheiros que adoram um usocapião. Aí que entra os “façam o que mando”: os tiranos, chefes abusadores, donos implacáveis, os autoritários e bravos, os imaturos que não aceitam ouvir o “não”. São os que exploram os bobos transvestidos de bons, os que aceitam os jogos de culpa, gritos, constrangimento. Aqueles que assumem o papel de vítimas das tragédias familiares, os coitadinhos em geral. Os que se calam.
Comedores de sapos, ruminadores de mágoas, sabotadores silenciosos da própria insatisfação. Maioria silenciosa a resmungar maldizendo políticos, cônjuges, filhos, colegas de trabalho. Mas sempre dizendo o que não pensa para agradar, sorrindo falsamente quando gostaria de chorar, fazendo coisas que odeia fazer. Segue a fila, vira manada. Em silêncio. E iluda-se, pois mil vezes que disser “sim” te chamarão de príncipe encantado. Um dia , tomando coragem inédita, finalmente dirá seu primeiro “não”. Quase por encanto, te transformarão num sapo barbudo.
Assim caminha a humanidade. E já que encanto existe para ser quebrado, que tal rever essa baixa auto-estima e na busca de sua libertação dos conflitos intrapsíquicos, buscar um mínimo de coerência: dar a resposta verdadeira a cada estímulo que receber. Mas, lembre-se, vivemos a era da imaturidade. Ninguém quer escutar nada que não seja aquilo que quer ouvir. Então, saiba que há grande chances de ser deletado de redes ou massacrado por ciberbulling. Nada do que não acontece nas chamadas “conversas de vestiário”. Mil vezes melhor o “tô nem aí” do que o tal do infernal e adoecedor “e se...”
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- Eduardo Aquino
- Artigo
Dos que não sabem dizer ‘não’, aos que não suportam ouvi-lo
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