É de causar revolta o que fizeram com Tinga. Como pode uma torcida inteira discriminar um jogador por sua raça, cor de pele? Onde já se viu, em pleno 2014, nós sermos obrigados a assistir a espetáculo tão odioso?
Sou Tinga. Somos Tinga. Tamo junto, Tinga.
As manifestações de apoio ao jogador do Cruzeiro são comoventes, incluindo a da torcida do rival, que, no clássico do último domingo, estampou vários cartazes contra o racismo e uma faixa em que se lia: “No Galo, o preto e o branco sempre andaram juntos”. Que bonito!
Como é de encher os olhos de lágrimas ouvir Tinga dizer que trocaria todos os seus títulos pelo fim do preconceito e por igualdade.
É inaceitável que isso ainda aconteça. Vamos todos nos unir para impedir que outros jogadores não passem o mesmo que Tinga!
Sou Tinga. Somos Tinga. Tamo junto, Tinga.
E para o Tinga? Tudo!!!
Ah, como dormimos tranquilos e sonhamos que somos pessoas do bem, sem preconceitos e cheios de valores, quando manifestamos nosso apoio a um Tinga da vida! Como nos percebemos superiores àquele bando de infelizes imitando macaco, quando nos solidarizamos com Tinga! Como nos sentimos uma corrente pra frente quando postamos nosso repúdio à intolerância e curtimos outros repúdios à intolerância no Facebook, a vitrine maior da nossa cidadania!
E que feliz coincidência na semana que acontece um ato tão nojento contra Tinga, podermos nos solidarizar também com as manicures de Brasília e repudiar a cliente australiana racista!
Por que será então que não nos sentimos pequenos quando, no estádio, cheios de alegria, cantamos musiquinhas homofóbicas para Richarlysson? – “boi, boi, boi, boi da cara preta pega o Richarlyson que tem medo de boceta”.
Por que não sacamos como somos minúsculos quando chamamos o time adversário de bambi e os torcedores rivais de Marias, viadinhos e bichinhas?
Por que não nos manifestamos quando uma certa torcida paulista fez uma faixa em que estava escrito: “A homofobia veste verde”?
Por que o Tinga tem todo o nosso apoio e o Richarlysson, nenhum?
Por que o desabafo de Tinga é digno de comoção e o de Richarlysson, de chacota?
Por que achamos legítimo chamar a bandeirinha de piranha ou puta ou vagabunda?
Por que nossa homofobia extrapola o campo de futebol e, no nosso local de trabalho, nos damos
ao desfrute de fazer piadinhas homofóbicas, livremente, mesmo sabendo que o nosso colega, na mesa ao lado, é homossexual?
Por que vivemos condenando mulheres pelo jeito que se vestem, a ponto de acharmos “natural” elas serem vítimas de assédio ou estupro?
Por que sempre lançamos mão de termos como “mal-amada”, “malcomida” para uma mulher estressada e nunca para um homem na mesma condição?
Por que vias será que chegamos à conclusão de que preconceito contra negro é inaceitável, mas contra gay e mulher, não?
Ah, sei lá... Não faz pergunta difícil.
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