Ninguém que se torna ídolo de uma torcida como a do Flamengo se perde pelo caminho. É até curioso apontar que um jogador de 28 anos não tem mais paixão pelo futebol. As opiniões sobre Gabriel Barbosa são sempre muito peculiares e exageradas. A trajetória do camisa 9 do Cruzeiro sempre foi tão precoce que parece que ele já viveu absolutamente tudo que tinha para viver no futebol — e hoje é um veteraníssimo, à beira da aposentadoria dos gramados.
Esse é o problema de uma sociedade descartável, que muitas vezes rotula o trabalho de uma pessoa por uma fase ruim. Isso não define ninguém. Muito pelo contrário.
A questão de Gabigol, ao menos para mim, está mais ligada a uma readaptação e própria reconstrução de si mesmo dentro de novas características e funções em campo. Com as polêmicas que se envolveu na temporada passada e o banco aplicado por Tite, Gabigol tornou-se um jogador reserva, de baixa minutagem e que não se enquadrou mais em um time que passou a ter Pedro como referência absoluta. Também pudera. A qualidade do atual centroavante do Flamengo é inegável. É um absurdo o que Pedro joga.
Dentro desta perspectiva, passou-se a discutir bastante se Gabigol poderia atuar ao lado de Pedro. E eu lembro claramente de uma entrevista do Romário falando sobre um alerta que ele faz ao hoje jogador do Cruzeiro em relação às características de jogo.
"Gabigol é um cara que frequenta muito a minha casa. Eu falei para ele quando o Pedro foi contratado pelo Flamengo: 'se você mudar seu jeito de jogar, vai perder teu espaço para o Pedro, tanto no Flamengo quanto na seleção brasileira'. Pergunta a ele se eu não falei isso. Ele acabou mudando. Jogava na frente do gol, para fazer os gols, dar o último toque", disse o Baixinho.
"Chegou o Pedro, não sei se alguém mandou e entendeu que ele podia jogar de outra forma, mas não deu certo. Hoje o Pedro é o melhor atacante que temos no Brasil, pelo menos antes da lesão que teve", acrescentou Romário.
Na minha avaliação, Gabigol está ainda preso a este impasse sobre suas atribuições em campo, perambulando entre o papel de referência, a função de um segundo atacante, a busca constante pela bola e uma adaptação ao novo time. Não sou técnico de futebol, mas é preciso trabalhar também a confiança do atleta. O próprio Jardim disse que Gabigol é um finalizador nato. Creio que uma equipe de futebol precisa ter esquemas variados. Por que não treinar uma formação onde as características de Gabigol se encaixem? Trabalhar especificamente sua finalização e o capricho melhor nas jogadas?
Não estou aqui para ser advogado de Gabriel Barbosa. Inclusive acho que Jardim tem, neste momento, razão em deixá-lo no banco, priorizando um jogo de mais transição, de ataque à primeira bola, especialmente porque o Cruzeiro vem sofrendo defensivamente e atuar com Gabi nessas condições não favorece ao time e nem ao próprio atleta. É o mesmo caso de Dudu, inegavelmente superior tecnicamente a Wanderson.
Só que um time de futebol não vive só de um conceito. É preciso abrir o leque e potencializar o que suas peças podem produzir de melhor. Além disso, obviamente, está também o próprio suor do atleta. Uma briga por posição não faz mal a ninguém, ainda mais quando se está escrevendo uma nova história em um clube totalmente diferente daquele onde você foi simplesmente absoluto —ao menos na maior parte de sua trajetória.
A história do Cruzeiro em 2025 está apenas em um terceiro ato — baseando-se na contagem de técnicos —, mas parece que o time já viveu tantas coisas. Acredito que muitas outras situações ainda virão pela frente, inclusive a saga de Gabriel Barbosa, o 9 tão desejado por Pedro Lourenço.