LUIZ TITO

Caminhamos para a barbárie

Redação O Tempo


Publicado em 05 de dezembro de 2017 | 03:30
 
 
 
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Está nas redes sociais um vídeo gravado dentro de um avião que retrata a abordagem de uma passageira ao senador Romero Jucá. É um diálogo em que ela fala e ele escuta, exceto por um momento em que ele parece tentar tomar das mãos de sua opositora o celular pelo qual a cena era registrada. Ele tentou ainda responder ao que ouvia, mas a moça emendava uma acusação na outra e não lhe abria qualquer espaço para revide. Soube-se depois pelos jornais que o bate-boca foi interrompido por ordem do comandante da aeronave e, ainda, que o senador Jucá, ao desembarcar, dissera de sua intenção de processar na Justiça sua contendora.

Não conheço o senador Jucá, nunca votei nele, tampouco me interesso por suas posições; também nunca vi a passageira. Sinto-me assim com toda a liberdade para dizer o que penso desses episódios, muito frequentes nos espaços públicos – shoppings, campos de futebol, aeroportos e outros locais com essas características. Quando um político está presente em um deles, surge sempre alguém que se acha com autoridade moral para ofender, julgar e condenar tais pessoas. Transformamo-nos, investimo-nos de direitos e autoridade que nós mesmos nos outorgamos para em seguida condenar quem divirja de nossas posturas e convicções. Políticos em especial; eles agora são a bola da vez. Como cidadãos, votamos, apoiamos, legitimamos, batemos palma, tudo sem qualquer critério mais refinado, como se pode ver no perfil das bancadas de vereadores, deputados, senadores e nossos governantes – prefeitos, governadores e presidentes da República –, vários implicados em processos de corrupção, formação de quadrilha, peculato e outras práticas delituosas, sempre envolvendo trapaças as mais diversas e sempre com recursos do erário. Dezenas de operações realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público e transformadas em processos judiciais têm em sua titularidade homens públicos nos quais votamos, sem o quê não estariam onde estão ou estiveram.

Sentir toda repulsa por eles, motivada por suas práticas aéticas, quando não criminosas, gritar para que não voltem a seus mandatos nas próximas eleições, nada é mais legítimo; as sociedades organizadas têm seus instrumentos para assim se manifestarem. Um deles é o voto, que ainda tem essa faculdade. E esperamos que assim continue.

Mas assenhorar-se da prerrogativa de julgar publicamente quem quer que seja não é direito de ninguém senão daqueles a quem o próprio Estado outorga poderes, nos limites das leis próprias, para fazê-lo.

Ao contrário, nascem os desvios sociais e, com eles, a intolerância e, em seguida, os torturadores, os justiceiros, as milícias, os rebeldes sem causa, as gangues, os “comandos vermelhos”, por meio dos quais as instituições se estiolam no medo, na covardia e na mediocridade, e a civilidade se curva e se rende à barbárie. Nesse caminho, o que esperarmos? Que Brasil teremos, nesse quadro de deformações, de intolerância, de ódio e da justiça construída conforme o entendimento e o interesse de cada um?

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