Fora da lista de exceções do tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o café, a carne e as frutas brasileiros ainda têm destino incerto. Diante desse cenário, surge a questão: uma alternativa viável seria o governo federal comprar a produção excedente desses produtos? Especialistas apontam que essa é uma possibilidade, mas os desafios seriam diversos.

Professor do curso de administração da ESPM, Jorge Ferreira dos Santos destaca que o decreto-lei número 79, de 1966, traz as normas para que a União compre produtos agropecuários pelo preço mínimo fixado. Vencidos os aspectos legais, porém, há os desafios de realmente colocar isso em prática.

“Com a compra de excedentes, o governo protege a renda do produtor. Porém, há custos para os cofres públicos, e pode haver uma distorção de mercado. Outro desafio é que será necessário fazer a gestão dos estoques. Como isso seria realizado? Além disso, qual seria o escopo de atuação do governo? Não daria para comprar a safra toda”, destaca ele. 

Sócio da neXtCapital Wealth, David Martins ressalta que a compra pública dos excedentes é uma ferramenta legítima de apoio ao produtor rural, especialmente em momentos de crise de preços. No entanto, ressalta ele, esse tipo de intervenção precisa ser muito bem calibrada.  

“Se mal desenhada, a política gera distorções no mercado, incentiva a superprodução e impõe um custo fiscal elevado ao país. Além disso, interfere nos sinais naturais da economia e pode acabar desestimulando a diversificação produtiva. Em vez de garantir segurança ao setor, uma ação ampla e mal conduzida pode desequilibrar toda a cadeia agrícola e afetar negativamente o consumidor final”, afirma.

Para Adenauer Rockenmeyer, delegado do Conselho Regional de Economia (Corecon-SP) a compra dos produtos pelo governo brasileiro pode contribuir para a estabilização dos preços, garantindo uma rentabilidade mínima aos produtores. No entanto, ele ressalta que há os impactos fiscais, relacionados à própria compra, além dos desafios logísticos, como a necessidade de estruturas de armazenamento para os produtos agrícolas. Por isso, segundo ele, a medida não pode ser implementada indefinidamente.

“A política de garantia de preços mínimos, embora válida e necessária para garantir a rentabilidade e a sustentabilidade da produção, deve ser concebida com um planejamento estratégico, incluindo um período de implementação definido, visando o equilíbrio entre o apoio ao produtor e a promoção do desenvolvimento do mercado”, diz ele.

Histórico

Rockenmeyer lembra que o governo brasileiro implementa vários instrumentos para assegurar um preço mínimo aos produtores rurais. “Um exemplo proeminente é a política de garantia de preços mínimos, amplamente utilizada na década de 1980. Após a Constituição de 1988, essa política foi gradualmente reduzida, tornando-se menos frequente na década de 1990. Contudo, o governo mantém esse mecanismo à disposição”, destaca ele.

Um exemplo mais recente é de junho deste ano, quando o governo federal anunciou que estava avançando nas tratativas para compra do excedente de arroz no país. O objetivo seria a viabilidade econômica dos produtores e a garantia do abastecimento da população.

A reportagem entrou em contato com o governo federal e aguarda retorno.