O governo federal tem até 17 de julho para enviar ao Congresso Nacional um texto alternativo ao Projeto de Lei (PL) nº 2687/2022, que propõe considerar a Diabetes tipo 1 (DM1) uma deficiência. O projeto havia sido vetado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro, e, desde então, segue com o Congresso para derrubar ou manter o veto. No dia 17 de junho, o assunto seria pauta na Casa Legislativa, mas o governo pediu 30 dias para enviar o novo texto.

O assunto tem causado intenso debate, principalmente entre as entidades médicas que apoiam o PL. “O projeto, aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, por unanimidade, representa um marco fundamental na promoção da equidade e na redução das desigualdades enfrentadas por essa população, entre as diferentes classes sociais e regiões do Brasil”, diz nota conjunta da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) e Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

De acordo com a coordenadora do Departamento de Saúde Pública da SBD, Karla Melo, a expectativa é que o governo mande o novo texto até o prazo final, enquanto a oposição está fechada para derrubar o veto presidencial e a base do governo diz sobre a possibilidade de os ajustes serem enviados ainda esta semana. "O que nos preocupa é que o novo texto deve chegar durante o recesso parlamentar, o que vai levar a votação a ser adiada mais uma vez", diz Karla.

O que diz o projeto?

De autoria da deputada Flávia Morais (PDT/GO), o PL equipara a Diabetes tipo 1 a uma deficiência. Portanto, a ideia é que a pessoa com essa doença passe a ser amparada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência.

“Não existe amparo legal que garanta ao estudante com DM1 atendimento adequado enquanto permanece dentro do estabelecimento escolar. Milhares de mães deixam seus empregos para poderem aplicar insulina em seus filhos para que possam, simplesmente, lanchar na escola”, diz trecho da argumentação do projeto de lei. 

“O País não conta com uma política pública estruturada para o paciente com DM1, tanto que menos de 25% dos pacientes apresentam controle adequado da doença, dado que se reflete no elevado grau de complicações associadas, tais como, perda da visão, doença renal crônica, amputações, cardiopatias, além de transtornos alimentares e quadros depressivos”, diz outro trecho. "É imprescindível que esta condição seja, por lei, classificada como deficiência, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, Reino Unido, Espanha e Alemanha", argumenta o texto.

E o que é a Diabetes Tipo 1?

Trata-se de uma condição que geralmente é diagnosticada na infância. É uma doença autoimune em que o pâncreas para de produzir insulina, e o paciente passa a depender das injeções de insulina pelo resto da vida. Em muitos casos, além de serem diárias, essas aplicações de insulina ainda podem ser múltiplas em um único dia. Estima-se que, no Brasil, existam ao menos 600 mil pessoas com a doença. 

“É uma deficiência de um órgão. O pâncreas para de funcionar, então é justo considerar deficiência”, comenta Jaqueline Correia, de 37 anos, presidente do Instituto Diabetes Brasil (IDB). Mãe de um menino de 12 anos com DM1, ela conta que esse tipo de diabetes é, por diversas vezes, uma barreira para o portador. “Há casos em que, quando a mãe vai matricular a criança, a escola barra porque não tem estrutura e profissional capacitado para aplicar insulina”, diz. Se a diabetes tipo 1 for considerada deficiência, amparada pela lei, a criança portadora de DM1 teria o direito resguardado e a escola seria obrigada a aceitá-la.

Jaqueline cita ainda outras questões como concursos públicos que deixam especificada a exclusão de candidatos com diabetes, além de vagas de emprego no âmbito privado que deixam de ser preenchidas por diabéticos após a empresa tomar conhecimento da condição. “Se a gente for verificar o que é uma deficiência, são barreiras, impedimentos de convivência em sociedade, e a diabetes tipo 1 traz essas barreiras”, argumenta Jaqueline. 

Outro ponto apresentado pela presidente do IDB é o gasto de uma família quando um dos membros tem diabetes tipo 1. Ela lembra dos gastos com alimentação, medicamentos de alto custo, equipe multiprofissional e atividades físicas. “Só o diagnóstico de diabetes tipo 1 sozinho pode falir uma família, tudo é caro”, frisa. Se a pessoa com DM1 for considerada PCD (pessoa com deficiência), ela passa a ter acesso a diversos incentivos, descontos e garantias, como todo PCD.

E por que o PL foi vetado?

No veto publicado no Diário Oficial da União, no dia 10 de janeiro, o presidente Lula pontua que o Estatuto da Pessoa com Deficiência “reconhece que a deficiência resulta da interação entre a pessoa e as barreiras sociais, e não de uma condição médica específica”. Além disso, por considerar que a inclusão poderia gerar despesas para União, já que pessoas com deficiência têm direito a diversos incentivos, diz que “a proposição legislativa também incorre em vício de inconstitucionalidade” por não apresentar “estimativa do impacto orçamentário-financeiro correspondente e previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa”.

Quais os próximos passos?

Agora, a expectativa é que o governo envie nova proposta de texto para substituir o projeto de Lei, até 17 de julho. No entanto, mesmo que não envie, há ainda a possibilidade de adiamento por mais um período. Funciona assim: no dia 17 de junho, em que a derrubada do veto seria votada, o governo pediu 30 dias para preparar um texto substitutivo do projeto de lei em questão, caso contrário, a derrubada seria votada pelo plenário com o fim do prazo. Esse pedido precisou ser aprovado pelas lideranças partidárias presentes, que aceitaram a proposta. No dia 17 de julho, quando se encerra o prazo, se houver nova proposta e as lideranças aceitarem, um novo prazo pode ser estipulado.

Agora, toda a expectativa está na chegada de um novo texto e na possível votação da derrubada do veto na semana que vem.