Preços que sobem e demoram para cair não aconteceram apenas durante a crise de abastecimento provocada pela greve dos caminhoneiros. Para os economistas, o fenômeno é explicado pela tributação, por mercados fechados, interferência do Estado, cartéis, pouca concorrência e pelo próprio consumidor.

“O brasileiro, como o próprio Estado, não sabe poupar. É uma questão de cultura que é explicada pela nossa história de hiperinflação, golpe militar, insegurança frente a várias políticas econômicas”, avalia o professor de estratégia da Fundação Dom Cabral, Paulo Vicente. Para ele, o caso da greve dos caminhoneiros é exemplar. “Esse comportamento de estocar é visto em outros países também, mas com histórico de desastres naturais. A pessoa fica insegura e, independente do valor, vai ter alguém para pagar”, diz. Com isso, a oferta diminui mais ainda e os preços sobem, segundo o professor. 

A falta de produtos fez a maquiadora Elisa Ferreira Kacowicz, 37, aceitar pagar R$ 87 por um botijão de gás, 16% a mais do que o último que tinha comprado, por R$ 75. Ela demorou dois dias para conseguir o produto. “Normalmente faço uma pesquisa, comparo preço em aplicativo. Mas, desta vez, comprei o que tinha, e pelo preço que pediram. Era isso ou ficar sem gás”, diz.

Além da pressão da lei da oferta e da procura, a pouca concorrência também ajuda a manter preços altos. “Em um mercado fechado como o do Brasil, a formação de cartéis é mais comum. O livre mercado ensina o consumidor a cobrar mais qualidade e menos preço”, avalia o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP) Wellington da Rocha.

Para o professor de educação física Gilmar Fernandes, 42, a pior consequência da greve dos caminhoneiros foi o aumento do preço da gasolina. “Acho que interferiu mais. No resto, aos poucos está voltando ao normal. Na minha opinião, os postos de gasolina são uma espécie de cartel, fazem um combinado para todo mundo sair lucrando, menos nós”, opina.

Já o presidente do Sindicato dos Postos de Gasolina do Estado (Minaspetro), Carlos Guimarães, afirma que o problema são os impostos. “Sem os tributos, um litro de gasolina em Belo Horizonte custaria R$ 2,28. O problema não é o posto de gasolina ou a política de preços da Petrobras, são os impostos cobrados”, diz Guimarães.

Para Wellington da Rocha, o fato de cerca de 43% de todo imposto no Brasil ser arrecadado por meio da atividade econômica, ou seja, na compra de mercadorias, também é um elemento que dificulta a variação de preços para baixo. 

O professor Paulo Vicente concorda que os tributos mantêm os preços altos. “A carga tributária só poderá ser discutida no Brasil quando diminuirmos o tamanho do Estado. Pagamos, em média, 30% de impostos. Em outros países, como os Estados Unidos, quando o governo diminui a carga tributária, consegue aumentar a receita porque a sonegação cai e estimula a economia”, explica. 

De onde vêm os preços altos

Mercado fechado. A falta de concorrência foi apontada como motivo de o Brasil ter preços mais altos do que outros países do mundo. “O setor de bancos é um exemplo. Temos apenas cinco grandes bancos, que cobram o que querem”, diz Paulo Vicente, da Fundação Dom Cabral.

País continental. Para Vicente, o tamanho do país gera custos de transporte e de aumento da cadeia de fornecedores. “Quanto mais atravessadores, mais caro o produto. Mas em um país do tamanho do nosso, muitas vezes ele passa em várias empresas antes de chegar ao destino”, explica. 

Dinheiro caro. Sem cultura de poupar para comprar, o brasileiro paga caro em juros. “Eles são embutidos no preço e pagamos de qualquer forma”, diz o professor Wellington Rocha, da FEA/USP. 

Tabelar frete pode agravar o problema

Para o professor da FEA/USP Wellington da Rocha, um tabelamento do frete no país é uma “solução populista”. “O mercado deveria se regular. Se existe uma oferta maior de frete, não é o governo que deve interferir”, afirma Rocha.

Para o diretor executivo da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Ricardo Santin, o frete mínimo terá impacto no preço dos produtos. “A tabela de frete será um custo bem pesado para produtores (de carne suína, de aves e ovos) em um momento de perdas. Foram mais de 70 milhões de frangos que morreram em função da greve”, afirma Santin. 

Para Rocha, o tabelamento de preços é prejudicial para a relação entre empresas e compradores. “O tabelamento não é uma solução para preços altos. Superproteger um lado, seja o consumidor, seja o caminhoneiro, nesse caso, não permite que as relações de consumo amadureçam”, diz.

Logística é outro efeito em cascata

Problemas logísticos no país também se tornam preços mais altos. “Estamos transportando pelas rodovias produtos de baixo valor agregado, que poderiam ser transportados em vagões. Essa dependência da matriz rodoviária e o que se transporta tornam o produto muito caro”, explica o coordenador do Núcleo de Logística, Supply Chain e Infraestrutura da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, que enxerga uma “dependência” das rodovias no país. 

Investir em armazenagem poderia ser um caminho. “Em outras economias, como na China, há uma tradição de investimento em armazenagem, o que não é um traço cultural do Brasil”, acrescenta. Empresas brasileiras gastam 12,37% do faturamento com custos logísticos. Nos Estados Unidos são 8,5% e, na China, 10%. “Estamos em um patamar bem mais alto que as 20 maiores economias do mundo”, explica Resende.