Ancara, Turquia. Um grupo de militares do Exército anunciou nessa sexta-feira (15) ter assumido o poder na Turquia, provocando uma onda de violência que deixou ao menos 17 policiais mortos e vários civis feridos em Ancara e Istambul. Ainda de madrugada, o premiê turco, Binali Yildirim, anunciou que a tentativa de golpe estava “controlada” e havia fracassado.
Antes, porém, a agência oficial Anatólia informou que o Parlamento turco, em Ancara, tinha sido bombardeado, sem dar mais detalhes sobre o ataque.
Apesar do ataque ao Parlamento, o premiê Yildirim afirmou que “essa iniciativa idiota fracassou” e a situação “está amplamente sob controle”. As declarações ao canal NTV se seguiram a um comunicado dos serviços de inteligência turcos sobre o “retorno à normalidade”.
O presidente turco, Recep Tayyp Erdogan, levado para um local “seguro” na noite dessa sexta-feira (15), chegou de avião a Istambul ao amanhecer deste sábado (16).
Horas de tensão. Em Istambul, os militares golpistas abriram fogo contra uma multidão durante um protesto contra a tentativa de golpe, ferindo vários civis. Os soldados atiraram contra a multidão em uma das pontes sobre o Bósforo, que une Europa à Ásia, onde vários civis feridos foram socorridos por ambulâncias.
Na capital Ancara, um caça F-16 da Força Aérea derrubou um helicóptero Sikorsky das forças “golpistas”, informou uma fonte ligada à presidência. Vários tanques do Exército cercaram o Parlamento em Ancara e o aeroporto internacional Ataturk, em Istambul. Violentas explosões foram ouvidas na capital, acompanhadas de troca de tiros no centro da cidade, enquanto aviões sobrevoavam a metrópole sem parar, a baixa altitude.
Erdogan apareceu na TV com o rosto pálido e visivelmente preocupado, para denunciar “a sublevação de uma minoria do Exército”, e exortou os turcos a resistir à tentativa de golpe. Nos últimos meses, ele vem sendo acusado de promover uma deriva autoritária no país, atingindo até alguns de seus aliados. Além disso, o país convive com a ameaça do terrorismo do Estado Islâmico e de grupos separatistas curdos. O partido AKP, fundado por Erdogan, é acusado de interferir na Justiça para abafar casos de corrupção e de censurar a imprensa.
Unesco
Reunião sobre a Pampulha é suspensa
Com o golpe militar em curso na Turquia, foi suspensa a 40ª Sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), que decidiria hoje sobre o título de Patrimônio Cultural da Humanidade que poderá ser concedido ao Conjunto Moderno da Pampulha.
O adiamento da reunião foi confirmado pela assessoria de imprensa do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). De acordo com o órgão, ainda não se sabe se uma nova data para o evento será marcada ou se a reunião foi, de fato, cancelada.
A diretora do Conjunto Moderno da Pampulha, braço da Fundação Municipal de Cultura (FMC), a arquiteta Luciana Rocha Feres, que está em Istambul para participar da reunião, contou que está presa no hotel.
O Itamaraty orientou Luciana e outros brasileiros a não deixarem seus aposentos, uma vez que o país está sofrendo um golpe militar. O ministro da Cultura, Marcelo Calero, também está preso no hotel. A assessoria de imprensa FMC informou que Luciana passa bem. (Lucas Ragazzi / Camila Kifer)
Isolamento e caos
Aeroportos. Voos com destino a cidades da Turquia estão sendo desviados por conta da tentativa de golpe de Estado em curso no país.
Redes. O acesso às redes sociais na Turquia esteve restrito durante a tentativa de golpe militar no país. Os relatos de organizações que monitoram a internet no país irformaram que estava “difícil” ou “impossível” o acesso ao Facebook, Twitter e YouTube.
Repercussão. O secretário de Estado americano, John Kerry, disse esperar a paz, a estabilidade e a continuidade do poder na Turquia, enquanto seu colega russo, Serguei Lavrov, pediu aos turcos que evitem qualquer “confronto sangrento”.
Tensão nas ruas
Apreensão. O Itamaraty e o Ministério dos Esportes estão buscando informações sobre 240 atletas brasileiros que estão na Turquia para participar dos Jogos Mundiais Escolares (Gymnasiade). Os jovens estão na cidade de Trabzon, distante 900km de Istambul.
Movimento. Moradores de Istambul relatam um clima de apreensão nas ruas. Um toque de recolher foi anunciado pela rede de TV pública e as pessoas aconselhadas a voltar para casa na noite dessa sexta-feira (15).
Saída. “As pessoas não estão correndo pelas ruas, até porque não teria como. As vias estão apinhadas de gente, porque não conseguem encontrar táxis e os ônibus estão lotados”, disse a publicitária Selen Bayrak, que mora em Istambul.
Depoimento
Em Esmirna, minha cidade-natal, está tudo tranquilo por enquanto, mas já ouvimos dizer que as ruas serão fechadas neste sábado (16). A situação toda é muito complicada, e é impossível saber o que vai acontecer.
Havia um governo antidemocrático no poder na Turquia. Agora, o Exército resolveu fazer alguma coisa a respeito. As pessoas estão ficando loucas: algumas estão indo para as ruas protestar, outras estão indo para os supermercados para comprar e estocar comida, ou aos bancos, para retirar dinheiro. Ninguém sabe ao certo o que fazer.
Algumas pessoas estão defendendo que tudo isso faz parte de um plano do próprio presidente Erdogan para fortalecer seu poder. Acham que, na semana que vem, ele pode vir a público afirmando que eles tentaram matá-lo e que o país precisa de um governo democrático. Outros acreditam que isso possa ser um plano com o aval do governo dos Estados Unidos para derrubar Erdogan. Há 50% de chances de ser qualquer uma das duas hipóteses.
Eu, particularmente, prefiro que seja um plano com o aval dos EUA. Apesar de não achar que um governo militar seja bom, Erdogan tem que sair do poder.
(Traduzido por Raquel Sodré)
FOTO: Douglas Magno – 20.3.2015 |
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Yavuz Ugurtas Jornalista turco |