Seguirá na cadeia o corretor imobiliário Marcelio Lima de Barros, de 57 anos, que na última terça-feira (28 de maio) invadiu uma concessionária em Belo Horizonte e executou o consultor Alexandre dos Santos Queiroz, de 65 anos. Nesta quinta-feira (30), após audiência de custódia, a Justiça converteu a prisão em flagrante do suspeito em prisão preventiva. 

Segundo o Fórum Lafayette, na decisão, a juíza de plantão Herilene de Oliveira Andrade destacou que, após cometer o crime e ser preso, o suspeito confessou espontaneamente o homicídio, afirmando que isso ocorreu após ele ter sido "destratado pela vitima no ano de 2022 quando realizou um serviço em seu veículo"

"Vê-se que o delito supostamente praticado pelo réu é grave, pois, ao que tudo indica teria agido por motivo fútil e utilizando-se de recurso que tornou impossível a defesa do ofendido, levando-o a óbito em razão dos disparos da arma de fogo. Ainda, tal fato causou clamor social. Assim, entendo que a decretação da prisão preventiva é medida que se impõe, para garantia da ordem pública, para aplicação da lei penal e para assegurar a instrução criminal, não sendo o caso de aplicar as medidas cautelares diversas da prisão, porque seriam, ao que tudo indica, inócuas", disse a magistrada.

Com isso, foi expedido um mandado de prisão preventiva contra o suspeito. Em seu depoimento na delegacia, Marcílio chegou a dizer que "acordou e decidiu" matar Alexandre. A vítima foi enterrada em meio à muita comoção na última quarta-feira (29), no Cemitério Bosque da Esperança. 

Depoimentos

Na quarta-feira (29), a reportagem de O TEMPO teve acesso ao teor dos depoimentos colhidos pela Polícia Civil com Marcílio, que confessou ser o autor dos disparos, e duas testemunhas que estavam no interior da concessionária onde aconteceu a execução, no bairro Liberdade, na região da Pampulha, em Belo Horizonte.

Natural de Cuiabá e pai de uma garota de 13 anos - que já o denunciou por abuso sexual -, o atirador disse ao delegado que atualmente trabalha com imóveis, entretanto, estaria vivendo uma "crise econômica" que o deixou sem fonte de renda. Ele disse ainda ter sido abordado pela Polícia Militar (PM) no momento em que se dirigia para a delegacia para se entregar pelo crime. 

"Questionado sobre a motivação do crime, afirma que no ano de 2022, levou o veículo VW UP para corrigir um vazamento na bomba de água e foi atendido na época pela vítima Alexandre (consultor da oficina). Afirma que foi mal tratado e desrespeitado por ele, que não foi xingado, nem agredido e nem ameaçado, mas afirma que foi tratado de forma ríspida", dizem as autoridades policiais no relato encaminhado para a Justiça.

Ainda conforme o depoimento, ao ser questionado sobre o que seria "forma ríspida", o autor respondeu que Alexandre mandou ele "colocar a chave do veículo no painel' em um tom alterado. Além disso, o atirador diz que o serviço no local custou R$ 3 mil e que, poucos dias depois, choveu e o seu carro ficou tomado de água no interior, e que ele acredita que o problema, que custou outros R$ 2 mil, seria consequência de "pilantragem" da homem executado por ele. 

"Após o fato não foi cobrar Alexandre e não o procurou, tendo feito apenas uma reclamação para o chefe da vítima, em 2022. Que nunca mais teve contato com Alexandre e nunca mais o viu, porém, o sentimento de indignação pela forma que foi tratado permaneceu ao longo dos anos. Até o dia de hoje, mesmo sem nunca mais terem contato posterior, afirma que acordou e decidiu matar Alexandre", continua o depoimento. 

Homem nega premeditação, apesar de ter raspado arma

Marcelio também deu detalhes aos policiais sobre onde adquiriu a arma usada no crime, uma pistola. Ele disse que a comprou em 2001, em um clube de tiro localizado no bairro Gutierrez. Apesar de ter sido devidamente registrada por anos, o suspeito afirma que, após não renovar o porte, perdeu a autorização e o armamento passou a ser ilegal. 

Em seguida, o homem confessa que raspou o número de série da arma há cerca de uma semana, o que ele teria feito, em sua versão, somente por conta do registro vencido, e não por ele ter premeditado o crime, reforçando, mais uma vez, que "acordou e decidiu matar a vítima" pelo ocorrido em 2022. 

Testemunhas contam o que viram

Além do suspeito, que confessou a autoria do crime, também foram ouvidas na delegacia duas testemunhas: um colega de trabalho de Alexandre e uma cliente, que estava esperando para ser atendida na concessionária. 

Segundo o testemunho do homem de 47 anos, ele trabalha há 13 anos com a vítima, e que, no dia, por volta das 14h, ouviu tiros e chegou a ver o suspeito efetuando disparos na cabeça do colega de trabalho que já estava caído no chão. "Nos dias que antecederam o fato, Alexandre não demonstrou nervosismo e nunca mencionou que estava sendo ameaçado. No período matutino do presente dia, Alexandre estava bem e tranquilo", contou em depoimento. 

Já segundo a cliente, de 60 anos, ela estava esperando para ser atendida quando avistou o funcionário caminhando tranquilamente e sem perceber que já era seguido pelo suspeito, que, segundo ela, estava armado e "sem fazer questão de esconder". 

"Acredita que Alexandre não percebeu que estava sendo seguido, pois estava calmo e de costas para o homem armado. Não ouviu nenhuma discussão antes do fato e o homem armado, sem dizer nenhuma palavra, efetuou múltiplos disparos", detalhou a mulher à polícia. 

Em entrevista a O TEMPO, sem conseguir conter as lágrimas, o amigo da vítima, Paulo Rocha, descreveu a dor de perder um companheiro. “Ele era a melhor pessoa do mundo. Todos gostavam dele”, acrescentou, ainda com incredulidade sobre o assassinato. Em depoimento à polícia, a família também disse desconhecer qualquer problema ou desavença que Alexandre, que trabalhava na concessionária há cerca de 10 anos, pudesse ter.

Alexandre dos Santos Queiroz estava no trabalho, na concessionária, quando foi surpreendido pelo agressor. Funcionários e clientes do estabelecimento relataram que Marcelio chegou em silêncio, foi até a vítima e puxou o gatilho sem hesitar. O assassinato foi registrado pelas câmeras de segurança do estabelecimento.

Um vendedor de carros de uma concessionária de veículos, de 61 anos, foi assassinado na tarde desta terça-feira (28) com cinco tiros - dois nas costas e três disparos no rosto. Câmeras registraram o momento do crime, que ocorreu no interior da revendedora de carros em que a… pic.twitter.com/QnPbJYm9Gc

— O Tempo (@otempo) May 28, 2024

Na sequência, sem qualquer constrangimento, ele fugiu em um carro modelo UP branco. O atirador foi preso pelo Batalhão de Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) na avenida Pedro I e levado para a Central de Flagrantes I, que fica no bairro Floresta, na região Leste de BH. Foram ao menos cinco disparos em várias regiões do corpo, entre elas, cabeça e costas.

O atirador que atirou contra o funcionário de uma concessionária, nesta terça-feira (28), na região da Pampulha, chegou em silêncio na delegacia. Questionado pela reportagem, o homem adotou o silêncio, não quis comentar sobre o crime e, sob escolta policial, entrou na Central de… pic.twitter.com/qsEwnR3Xsf

— O Tempo (@otempo) May 29, 2024

O que motivou o crime?

O crime teria sido motivado por uma revolta de Marcelio com relação a uma manutenção feita no veículo dele. Para os policiais, ele contou que, em 2022, levou o veículo à concessionária para realizar um reparo na bomba de água. À época, desembolsou R$ 3.000 pelo serviço e foi atendido pela vítima (Alexandre dos Santos Queiroz). Após uma semana do reparo, o veículo apresentou mais um defeito depois de uma tempestade.

O desentendimento entre os dois, ainda de acordo com o relato do preso, teve início quando Marcelio foi ao estabelecimento se queixar do conserto. O funcionário o teria tratado de maneira "grosseira e arrogante" e, por isso, ele teria levado o carro para outra oficina, onde gastou mais R$ 2.500. "Ao final de tudo isso, tive um gasto de R$ 5.500", contou à PM.

Marcelio disse que se manteve revoltado com a situação por dois anos e que o sentimento foi agravado, conforme o relato dele, pelo fato de estar desempregado. Ele disse aos policiais militares que, nesta terça-feira, decidiu ir até a concessionária por "motivo de vingança" e atirou porque "acredita que a vítima danificou seu carro de maneira proposital".

Arma do crime

A arma usada, conforme o relato de Marcelio, foi comprada em 2001 em um clube de tiros localizado no bairro Gutierrez, na região Oeste de Belo Horizonte, por R$ 2.000. Ele ainda confessou que raspou a numeração da arma há cinco dias — o que torna a arma ilegal.

Antecedente criminal

Além do assassinato na concessionária na Pampulha, Marcelio Lima de Barros tem antecedentes criminais por outro crime. Ele é suspeito de cometer importunação sexual contra a própria filha, ato que teria ocorrido anos atrás, de acordo com fontes da Polícia Militar.

Concessionária nega que suspeito tenha sido cliente

Em nota, o grupo Líder, proprietário da Concessionária Mila, afirmou que o suspeito dos disparos “nunca foi cliente” da empresa. Além disso, disse desconhecer “qualquer episódio que envolva acordo comercial que não tenha seguido os protocolos e as normas da empresa, que sempre prezam pela boa conduta”.

A concessionária lamenta a morte do funcionário e “se solidariza com os familiares e amigos do colaborador”.