O asfaltamento de ruas localizadas próximas ao centro histórico de Diamantina — tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1938 e reconhecido como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) em 1999 — tem gerado debates entre os moradores. Enquanto a prefeitura da cidade, situada na região do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, alega que a intervenção visa melhorar a mobilidade urbana, alguns moradores se mostram contrários, argumentando que o calçamento faz parte da história de Diamantina e, portanto, deveria ser preservado.

O debate sobre a pavimentação das vias foi reacendido após uma camada de asfalto ter sido colocada sobre o calçamento da rua Jogo da Bola no último sábado (12 de abril). A via, conforme explica o historiador Erildo Nascimento, está "na fronteira da área tombada" e é "vizinha" da casa de Chica da Silva e da Escola Júlia Kubitschek, projetada por Oscar Niemeyer.

"O calçamento é uma arte tricentenária de Diamantina. Ele começa com o calçamento pé de moleque e se aprimora com o capistrana. É de uma beleza incrível, sem falar que os calceteiros — trabalhadores que calçaram as ruas e outros caminhos com pedras — que eram analfabetos deixaram suas marcas nas pedras, com letras e símbolos, para marcar qual havia sido colocada por ele. Ou seja, os próprios executores souberam da beleza artística e do bem público", diz Nascimento.

Rua foi asfaltada na cidade histórica (Arquivo pessoal) 

O asfaltamento próximo ao centro histórico vai ainda, conforme destaca o historiador, contra um trecho do hino da cidade. "Logo no início do hino é enfatizado: 'Quando a noite a linda lua torna as pedras cor de prata, Diamantina sai à rua transformada em serenata'. Falar da beleza do calçamento de Diamantina é até desnecessário para quem reconhece que é um bem tombado e um bem artístico".

Descaracterização

O jornalista Américo Antunes destaca que outro ponto desfavorável ao asfaltamento próximo ao centro histórico é a descaracterização das ruas. "O asfalto está sendo jogado por cima das pedras e isso vai comprometer a impermeabilização do solo. Sem falar que destrói a beleza de toda a técnica usada nas ruas da cidade. E é essa beleza que também é um fator de atração de turismo para a cidade."

Antunes também teme o impacto nos casarões da cidade. "A partir do momento que se favorece o trânsito de grandes veículos você abala as estruturas dos casarões que são, em sua maioria, de madeira pau a pique. Os riscos que se coloca sobre o patrimônio é grande", afirmou.   

'Processo respeita o tombamento'

O prefeito de Diamantina, Geferson Burgarelli (MDB), compartilhou nas redes sociais a obra de pavimentação da Rua Jogo da Bola e destacou que a intervenção foi "pensada com muito carinho para melhorar a mobilidade urbana". "Só é capaz de ter uma gestão com muito trabalho e energia para o povo com todos dedicando e trabalhando. Quero deixar registrado que tudo que está sendo feito foi consultado ao Iphan. Estamos fora da área de tombamento", afirmou o gestor, que também é vice-presidente da Associação das Cidades Históricas de Minas Gerais. Burgarelli ponderou ainda que a "rica história e identidade" de Diamantina será preservada. 

Na postagem do prefeito, foi informado que já há projeto para que aconteça a revitalização da Rua do Rio Grande. O local, conforme esclarecido pelo historiador Erildo Nascimento, fica próximo da primeira rua da cidade: a Burgalhau. "Essa é outra intervenção que muito nos preocupa", alertou.

O historiador ressalta que não é contra a pavimentação em outras áreas da cidade, mas desde que não seja nas redondezas do centro histórico.

O Iphan e a Prefeitura de Diamantina foram procuradas pela reportagem. Os posicionamentos são aguardados.