Conhecidos como "irmãos Gabry", um trio de mineiros de Além Paraíba, cidade de 30 mil habitantes da Zona da Mata, é apontado desde 2019 como líderes de uma organização criminosa especializada no furto de petróleo de oleodutos da Transpetro em cidades do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. Nesta quarta-feira (2 de julho), a operação "Infractio", deflagrada pela Polícia Civil e o Ministério Público do Rio de Janeiro, terminou com um deles preso e outro sendo considerado como foragido.
Chefiada pelo Grupo de Atuação Especializada no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, a ação cumpriu três mandados de prisão e vinte de busca e apreensão contra os integrantes da organização criminosa, que é voltada para o furto de petróleo bruto.
"O inquérito revelou o alto grau de sofisticação da organização criminosa, que utilizava veículos alugados por terceiros, contas bancárias de interpostas pessoas e comunicações criptografadas, com o objetivo de dificultar a identificação dos verdadeiros responsáveis. A atuação coordenada entre a Polícia Civil e o MP foi determinante para o robusto conjunto probatório reunido, que evidenciou o papel de liderança exercido pelos líderes, que mantinham atuação contínua no planejamento, financiamento e execução das empreitadas ilícitas", detalhou a polícia carioca.
Márcio Pereira Gabry foi preso em Além Paraíba, enquanto seu irmão, Mauro Pereira Gabry, continua sendo procurado pelas forças policiais. O terceiro irmão, Marcelo Pereira Gabry, que já foi citado em outros processos pelo envolvimento com a organização, não foi alvo desta operação policial.
O terceiro mandado de prisão da operação desta quarta foi cumprido contra Franz Dias da Costa, mais conhecido como "Francis", que já estava detido. Ele é citado pela Justiça como por fazer do furto de petróleo "seu verdadeiro modo de vida", uma vez que insistia na prática criminosa mesmo após ter sido alvo de várias denúncias em operações anteriores.
Em julho de 2023, a operação Exagogi denunciou 27 pessoas pelos crimes, entre eles os "irmãos Gabry", que foram apontados pelo MPRJ como líderes da organização. "O trio figura como responsável por manter contato com os demais operadores do esquema, realizar pagamentos e organizar cada evento criminoso. Também foi denunciado o policial militar Anderson Cordeiro Machado, apontado como braço armado da organização criminosa, responsável por informar as oportunidades em que o crime pode ser executado com menor vigilância policial", divulgou o órgão de Justiça.
Ameaça ao abastecimento em três estados
A nova operação contra o grupo, que é alvo de ações desde 2017, decorre da identificação de novo furto cometido pelo bando em agosto de 2024 em um município do interior fluminense. Segundo o Ministério Público do Rio, felizmente a tentativa de furto foi descoberta, evitando que um rio fosse atingido pelo petróleo e, consequentemente, três estados tivessem o abastecimento de água afetado.
"As investigações revelaram a existência de um túnel escavado com aproximadamente sete metros de extensão, construído para acesso clandestino ao duto Orbel II da Transpetro, na região de Abarracamento, em Rio das Flores. A denúncia oferecida pelo MPRJ à Justiça também aponta grave risco ambiental, uma vez que a perfuração clandestina ocorreu nas proximidades do Rio Paraíba do Sul, cuja contaminação poderia afetar diversos municípios em três estados da federação", detalhou o órgão de Justiça.
O furto de petróleo e seus derivados por meio da perfuração de dutos da estatal é classificado como "crime de alta periculosidade social". Isso porque, além de causar prejuízos econômicos à empresa e, indiretamente, aos consumidores, cria ainda um risco concreto de "vazamentos, incêndios, explosões e danos ambientais", ameaçando comunidades próximas aos dutos violados e o meio ambiente.
Quadrilha era financiada pelo jogo do bicho
Os alvos dessa ação conjunta são alvo de operações policiais desde 2017, quando dois motoristas que transportavam petróleo furtado foram detidos em flagrante. A partir da prisão deles, a polícia conseguiu chegar até a organização criminosa especializada que seria financiada por um contraventor do jogo do bicho famoso da capital fluminense.
Em fevereiro deste ano, a Delegacia de Defesa dos Serviços Delegados (DDSD) promoveu a operação "Ouro Negro", que identificou que o grupo era liderado pelo "contraventor com forte conexão com o jogo do bicho", que seria responsável por financiar diretamente o furto de petróleo em dutos subterrâneos. Na ocasião, foram cumpridos mandados de busca e apreensão em residências dos alvos, empresas de fachada e depósitos clandestinos.
"Segundo as investigações, o líder do grupo tem envolvimento em diversas atividades ilícitas, como jogo do bicho, agiotagem, lavagem de dinheiro e corrupção. A ação visa a impactar o esquema de furto de combustível, mas também as bases financeiras da contravenção", detalhou, na época, a Polícia Civil do Rio de Janeiro.
Na época, foi divulgado que a organização criminosa operava com uma estrutura "hierarquizada", com setores especializados. Essas "divisões" eram separadas entre os responsáveis pela perfuração dos dutos da Transpetro; o transporte e armazenamento dos combustíveis; uma rede de informantes para monitorar ações policiais e evitar operações (que contava, inclusive, com policiais militares e seguranças contratados pela Transpetro); e, por fim, empresas de fachada e "laranjas", que lavavam o dinheiro obtido com a venda dos produtos ilícitos.
"Toda a atividade ilegal era financiada com recursos do jogo do bicho, que era empregado para comprar equipamentos sofisticados de perfuração de dutos, para alugar veículos para transporte de combustíveis e movimentação de recursos e para pagar colaboradores e intermediários envolvidos na proteção do esquema criminoso", completou a polícia em fevereiro deste ano.
Furtos eram organizados em grupo chamado "Ratobras"
Em junho de 2022, em uma das várias operações já deflagradas contra o bando chefiado pelos irmãos mineiros, a polícia divulgou que os crimes contra a Transpetro, que é uma subsidiária da Petrobras, eram organizados em um grupo criado em um aplicativo de mensagens batizado de "BR Ratobras".
Para ilustrar o grupo onde os crimes eram planejados, os suspeitos usaram uma espécie de "logomarca", conforme a polícia, com a imagem de um rato que segurava um fuzil nas "mãos".
"As investigações apontaram, ainda, que a comunicação entre os integrantes da quadrilha é feita por meio de aplicativo de mensagens, no qual planejam estratégias de atuação, principalmente em áreas remotas e em horários noturnos", disse a polícia carioca.