O golpe do "Falso Advogado", que vem afetando cada vez mais pessoas em Minas Gerais, já teria feito pelo menos 500 vítimas no Estado desde o início de 2025. O número foi confirmado nesta segunda-feira (18/8) pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG), que acredita que a quantidade real de vítimas pode ser ainda maior, devido à grande subnotificação, especialmente entre as vítimas que perceberam a tempo que se tratava de um estelionato e não fizeram nenhuma transferência.
Conforme divulgado por O TEMPO no último sábado (16/8), os criminosos têm se passado por diversos advogados e, até mesmo, oficiais de Justiça. Após acionarem por um aplicativo de mensagens pessoas com ações tramitando nos tribunais, os estelionatários afirmam que a vítima obteve uma vitória no processo e, por isso, teria valores altos a receber.
A diretora de Prerrogativas e conselheira estadual da OAB/MG, Carla Silene, explica que os criminosos estariam tendo acesso a informações dos processos das vítimas por meio das plataformas do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). "O que percebemos é que estão diversificando o método. Agora, já estão enviando as falsas decisões judiciais para as vítimas. Tivemos casos até mesmo que se passaram por um juiz, inclusive simulando uma audiência. Também registramos alguns golpes em que os suspeitos conseguiram acessar o sistema depois de terem invadido o login e a senha de advogados que estão na ativa", detalha.
A reportagem conversou com duas pessoas — um motorista e uma servidora pública — que, por muito pouco, não caíram no elaborado golpe. Nos dois casos, os golpistas chegaram a enviar um arquivo em PDF com a suposta decisão judicial dando causa ganha para as vítimas.
O motorista, que preferiu não ser identificado, conta que, além do perfil com a falsa identidade de advogado, um suposto oficial de Justiça também entrou em contato, o que reforçou a suposta veracidade dos documentos falsos enviados. "Este ano eu estava buscando um carro para trocar e acabei achando um em uma agência do Barreiro. Fiz a compra e, após algum tempo, fui parado pela polícia, que me comunicou que o carro tinha indícios de adulteração no chassi e nos vidros do carro. Tive que entrar na Justiça e usaram esse processo para tentar aplicar o golpe", detalha.
Ele conta que, ao saber do suposto pagamento de quase R$ 57 mil, sorriu "de orelha a orelha". "Como a foto era do meu advogado mesmo, e ele enviou até o arquivo da decisão, eu acreditei muito. Felizmente, percebi o golpe a tempo e procurei meu advogado", lembra o motorista. Da mesma forma a servidora pública, que também não será identificada, foi abordada pelos suspeitos. “Alguém se passou pelo meu advogado, falou que a causa estava ganha e me mandou documentações. Ficamos dialogando um tempo pelo WhatsApp, como se fosse ele. Só que, na verdade, era o estelionatário”, relatou.
Assim como no caso do motorista, um segundo contato também entrou em contato com ela, supostamente um servidor do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo ela, os criminosos prometeram a liberação imediata de quase R$ 40 mil, mas condicionaram o pagamento a uma taxa inicial de R$ 5 mil. “Quando a gente escuta um valor desse, empolga. Eu pensei: ‘Se eu pagar R$ 5 mil, ainda ficarei com R$ 34 mil’. Eu já estava preparada para fazer o Pix, mas o banco emitiu um alerta de golpe na tela do meu celular. Foi aí que acordei”, disse.
Carla Silene, diretora de Prerrogativas da OAB/MG, explica que, quando se vence uma causa na Justiça, é possível sim que seja necessário o pagamento de taxas, como as chamadas custas processuais. Entretanto, isso não ocorre por meio de transferências bancárias. "Para convencer as vítimas, ele pedem para transferir para alguém o escritório que fará o pagamento da guia. Outros simulam como se fosse um título, mas é falso e direciona para uma transferência. Por isso, recomendamos que, ao ser procurada por alguém dizendo que se venceu uma causa, o correto é entrar em contato diretamente com o seu advogado", orienta Carla.
Diante do aumento de casos, a OAB/MG vem investindo em campanhas de conscientização da população e dos advogados. "A OAB vem intensificando uma campanha para conscientização, tanto para a população como com os escritórios de advocacia, para tentar estabelecer uma espécie de código, ou a utilização de um único número para comunicação com seus clientes, para evitar esse tipo de crime. Também acionamos o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a Polícia Civil", completa Carla.
Vítimas devem registrar BO, diz polícia
A Polícia Civil foi procurada por O TEMPO e informou, por nota, que a servidora pública, de 49 anos, registrou ocorrência no último dia 6 de agosto. "Cumpre salientar que o crime de estelionato é de ação penal pública condicionada à representação da vítima, o que significa dizer que, para a instauração de inquérito policial, é necessário fazer representação criminal no momento do registro da ocorrência", completou a instituição.
Ainda conforme a diretora da OAB/MG, o número de 500 casos em 2025 possivelmente é subnotificado. "Tive conhecimento de um único escritório de advocacia que teve mais de 50 causas que foram usadas pelos golpistas. Portanto, acho que o número é, na verdade, muito maior. Infelizmente muitas pessoas não estão registrando as ocorrências", disse Carla.
Ainda na nota enviada pela Polícia Civil, a instituição policial orientou que qualquer cidadão que tenha sido vítima do golpe ou de uma tentativa de golpe, deve registrar o fato em uma unidade policial ou, até mesmo, pela Delegacia Virtual.
A população também pode ver outras orientações sobre este tipo de crime por meio da cartilha "Golpe, só se for nos criminosos".
TJMG alerta para golpes em nome do tribunal
Também por meio de nota, o TJMG informou que realiza campanhas permanentes para alertar a população sobre fraudes que utilizam o nome da instituição. “O Tribunal de Justiça de Minas Gerais realiza ações recorrentes, no portal da instituição e em suas plataformas oficiais, para alertar a população sobre possíveis golpes envolvendo o nome do TJMG”, diz o comunicado.
No site oficial, o tribunal já publicou orientações à sociedade. Segundo o TJMG, nenhum servidor ou magistrado entra em contato com partes ou advogados por telefone ou aplicativo de mensagens para solicitar pagamento de custas, taxas ou qualquer depósito para liberação de valores.
Mais detalhes podem ser conferidos no material divulgado pelo próprio tribunal.