Três urubus caíram em uma casa e assustaram moradores no bairro Alípio de Melo, na região Noroeste de Belo Horizonte, na tarde dessa quarta-feira (6/8). Abrindo as asas, cuspindo uma “saliva” branca e fazendo um barulho conhecido como “grasnado”, um dos animais permaneceu no quintal da residência de dois irmãos, que ficaram com medo e conseguiram espantá-lo, enquanto os outros dois voaram e pousaram sobre o telhado.

Os outros dois voaram e pousaram sobre o telhado. Foto: João Godinho / O TEMPO

Nesta quinta-feira (7/8), a reportagem foi até a casa dos irmãos Ivan Rabelo, de 67 anos, e Ronaldo Rabelo, de 63. Ronaldo contou que as aves entraram no quintal por volta das 16h da tarde dessa quarta-feira e que permaneceram por lá durante toda a noite. “Quando a gente se movimentava, ele emitia sons, batia as asas e cuspia uma saliva branca. Meu irmão o espantou para a rua. Depois disso, desapareceu, e as outras duas permaneceram no telhado. Ficamos com medo, pois eu não sei que tipo de doença um urubu pode transmitir. Não sei se ele ataca, se ele pica”, contou.

Diante da situação, por volta das 8h da manhã desta quinta (7), Ronaldo entrou em contato com a Zoonoses, que alegou que a remoção do animal não era de competência do órgão. Em seguida, ele contatou o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), que foi ao local cerca de sete horas depois. A veterinária do instituto, Maria Isnaia Silva informou que, por não ter analisado de perto a situação do urubu que ficou no quintal, não pode diagnosticar se o animal estava doente ou se havia sofrido envenenamento. Maria orientou os irmãos a fazerem uma limpeza na casa, já que o urubu expeliu o líquido branco em uma escada e em partes do chão do quintal.

Veterinária do IMA foi até o local e orientou os moradores. Foto: João Godinho / O TEMPO

“Geralmente, nesses casos, nós coletamos amostras do animal para análise laboratorial, incluindo material da cloaca, traqueia, intestino e cérebro. Essas amostras são encaminhadas ao laboratório para análise e, posteriormente, se necessário, enviadas para Campinas. Por não ter visto o urubu de perto, não consigo fazer um diagnóstico. Mas pode haver possibilidade de envenenamento”, ressaltou a veterinária.

Em nota, o IMA informou que se dirigiu ao local, no bairro Alípio de Melo, assim que recebeu a notificação sobre a situação dos animais e está adotando os procedimentos necessários, conforme a atuação técnica e criteriosa da instituição. Entre as medidas, o órgão apontou a coleta de amostras biológicas a serem encaminhadas a laboratórios oficiais para o devido diagnóstico.

Espuma pode ser mecanismo de defesa do urubu, diz bióloga

A bióloga e mestre em sustentabilidade Fernanda Raggi Grossi, ao ver a foto, explicou que trata-se de um urubu jovem. Essas aves, quando novas, têm penas claras. Ela acredita ainda que o animal se machucou na queda e, por isso, apresentava uma espécie de saliva na boca — o que acontece quando a ave se sente acuada. A tal saliva é, na verdade,  o suco gástrico “vomitado”. Segundo a bióloga, o suco gástrico dos urubus é mais ácido que o dos demais animais — e o nosso — e pode funcionar como um mecanismo de defesa para afastar predadores, além de ajudar na limpeza do trato digestório e na neutralização de bactérias e toxinas que podem vir dos animais mortos dos quais eles se alimentam.

Líquido branco foi expelido pelos urubus no chão. Foto: João Godinho / O TEMPO

“Quando se sentem ameaçados, os urubus vomitam ácido estomacal, que pode queimar a pele e os olhos de predadores, dando-lhes tempo para escapar. Esse suco gástrico dos urubus é extremamente ácido, com um pH muito mais baixo que o dos humanos, quase perto de 1, o que permite que eles se alimentem de carcaças em decomposição, neutralizando bactérias e toxinas presentes na carne. Ao regurgitar esse ácido, os urubus também ajudam a limpar o trato digestório de restos de alimentos e possíveis patógenos. Além do vômito ácido, os urubus utilizam suas fezes e urina para limpar as patas e evitar infecções bacterianas após pisarem em carcaças. Resumindo: a ‘espuma’ na boca dos urubus é, na verdade, uma estratégia de defesa e higiene, demonstrando as adaptações incríveis que essas aves têm para seu papel no ecossistema como decompositores”, ressaltou.

A bióloga ainda afirmou que a “saliva” expelida pelos urubus não representa um risco de contaminação para os humanos, exceto se houver contato direto com o suco gástrico. “Os urubus, por serem responsáveis pela reciclagem na natureza, consomem animais em decomposição. O contato com esse líquido pode causar irritação na pele, nos olhos ou em ferimentos. Mas não há outros riscos associados”, pontuou Fernanda.

Outro urubu também voou e pousou sobre a lage. Foto: João Godinho / O TEMPO

O que diz a Prefeitura de Belo Horizonte?

Em nota, a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que a Subsecretaria de Bem Estar Animal (SUBEM) atua nesse contexto como órgão orientador, não executando resgates diretos.

"Em caso de resgate de ave silvestre viva o CETAS/IBAMA deve ser acionado, por meio do e-mail (cetas.bh.mg@ibama.gov.br) ou telefone (31) 3555-6100. É crucial não manusear o animal diretamente para evitar agravo das lesões. Caso seja necessário contê-las até o resgate, recomenda-se acomodá-las em local escuro, ventilado e seguro (ex.:como uma caixa de papelão com furos)", disse a PBH.

O órgão reiterou que a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) é responsável pelo recolhimento de animais mortos. Nesse caso, o pedido deve ser realizado no PBH APP, pelo telefone 156, ou no Portal de Serviços da PBH.