Relatórios

Abin alertou que dados de Covid-19 em Minas Gerais são pouco confiáveis

Segundo os documentos, há “dúvidas sobre a proporção de infectados pelo coronavírus em relação a outras complicações respiratórias

Por Da Redação
Publicado em 31 de maio de 2020 | 13:29
 
 
 
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A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), em relatórios enviados ao Palácio do Planalto, destacou a alta subnotificação de casos da Covid-19 no país por falta de kits para diagnóstico. O órgão citou Minas Gerais como exemplo desse cenário. Segundo os documentos, há “dúvidas” sobre a proporção de infectados pelo coronavírus em relação a outras complicações respiratórias. Neste cenário, a agência usa a alta de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) para estimar suspeitos da pandemia.

Para a Abin, “circunstâncias locais” têm grande impacto sobre a subnotificação de casos em Minas. No fim de abril, o órgão observou que os dados daquele Estado eram pouco confiáveis, pois o número de suspeitos acabava sendo 30 vezes maior do que o de casos confirmados. Os relatórios da agência foram obtidos e divulgados pelo jornal “O Estado de S. Paulo” neste domingo (31).

Estudo feito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) apontou elevada subnotificação da doença no Estado. De janeiro a abril de 2020, Minas registrou cerca de 200 mortos pela Covid-19. No mesmo período, no entanto, houve 539 óbitos por SRAG, uma elevação de 648%, segundo o estudo. Para os pesquisadores, é forte a hipótese de que mortes por coronavírus não tenham sido identificadas por falta de testes.

Em 13 de maio, a Abin afirmou que o país está na fase de “aceleração da epidemia”. “Além disso, o Brasil ainda tem testagem com baixa representatividade (cerca de 3 mil por 1 milhão) e distribuída de modo não uniforme, o que impossibilita avaliar de forma precisa a incidência e sua evolução em cada cidade”, argumentou a agência.

Desde o começo do avanço da doença, o Ministério da Saúde estima que 900 mil exames do tipo RT-PCR para Covid-19 foram realizados no país, mas o dado é impreciso. O período de maior necessidade de exames deve ocorrer em junho, segundo a Abin, por ser o momento de maior circulação de vírus respiratórios. Neste mês, a agência acredita que 70 mil testes diários serão feitos.

Cada relatório da Abin sobre o novo coronavírus tem cerca de 20 a 30 páginas. A agência analisa o cenário da doença no Brasil, em cada Estado, e em países de todos os continentes. Também resume estudos sobre diagnóstico e impactos econômicos e sociais da pandemia no mundo.

A equipe de inteligência afirmou, no último dia 12, que a proporção dos novos casos do Brasil sobre dados globais é mais relevante do que aparenta. “A participação do Brasil torna-se mais significativa se for considerado que o país tem 10 a 15 vezes menos testes diagnósticos realizados por milhão de habitantes que os demais (países) e, portanto, é provável que os números brasileiros estejam subestimados e sejam de maior proporção do que os apresentados”, diz um dos relatórios.

Procurada por O TEMPO, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) respondeu que, entre as hipóteses  para o aumento do número de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), estão a maior sensibilidade em notificar casos de SRAG, a circulação de outros vírus sazonais e, também, a circulação da Covid-19 na população mundial. “Qualquer quadro de insuficiência ou dificuldade respiratória aguda que apresente febre (ou sensação febril), foi hospitalizado ou evoluiu para óbito por SRAG independentemente de internação, é notificado como ‘SRAG hospitalizado’”, diz a nota.

A pasta também afirmou que a escassez de testes é uma “realidade mundial, não só em Minas Gerais”, e que segue orientação do Ministério da Saúde para realizar os testes, que são aplicados nos casos de SRAG cujos pacientes foram hospitalizados, nos óbitos suspeitos, nos profissionais da saúde e da segurança sintomáticos, por amostragem representativa (mínimo de 10% dos casos ou três coletas), no público privado de liberdade e na população indígena aldeada. A SES-MG informou ainda que esse aumento de notificações não refletiu linearmente na sobrecarga do sistema público de saúde, já que “a ocupação de leitos de UTI, por pacientes acometidos por Covid-19 ou por suspeita da doença está em 9,86% da capacidade total do Estado”.

 “Um dos fatores que impede a ampliação da testagem é a alta demanda para aquisição, em contexto de disputa internacional, o que seria necessário para ampliar a testagem para outros públicos. Com relação às notificações, mesmo não realizando exames em 100% dos casos notificados, a SES possui mecanismos de controle capazes de avaliar o real cenário da doença, como o acompanhamento diário dessas notificações por meio do Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (CIEVS- Minas)”, completa a nota da SES-MG.

Subnotificação

Durante uma entrevista coletiva na terça-feira (26), o subsecretário de Vigilância em Saúde, Dario Ramalho, admitiu que há subnotificação em Minas Gerais e disse que a estimativa com a qual o governo trabalha é de 1 caso confirmado de coronavírus para cada 10 casos assintomáticos no estado. Após a entrevista, o governo de Minas publicou uma nota em que declarou que “não existe subnotificação no Estado relacionada a casos sintomáticos e suspeitos de Covid-19 que procuram atendimento ambulatoria e que a subnotificação, como no mundo todo, pode ocorrer em pacientes assintomáticos que não procuram atendimento hospitalar". "Foi justamente focando neste grupo que o subsecretário de Vigilância em Saúde, Dario Ramalho, se espelhou quando disse que apenas um em cada 10 casos suspeitos podem ser de coronavírus”, disse a nota de terça (26).

Estudo

Conforme a pesquisa da Universidade Federal de Pelotas (RS), que é financiada pelo Ministério da Saúde, menos de 1% da população no Estado está ou já foi infectada pela Covid-19. Com quase 21 milhões de habitantes, o resultado aponta, mais uma vez, a alta subnotificação em Minas Gerais: a estimativa revelada pela pesquisa mostra que podem existir até 21 mil registros nas cidades. De acordo com o levantamento, foram realizados 1.972 testes rápidos em oito municípios mineiros. Desse total, somente três testaram positivo, o que aponta que a imunidade de rebanho, quando 70% da população é contaminada, deve nem se tornar realidade. "Isso significa que menos de 1% da população, das cidades testadas, foi infectada pelo Covid-19", conclui o estudo.

O boletim especial divulgado pela pasta traz outros panoramas sobre a evolução da pandemia em Minas Gerais. Segundo os dados, os municípios do Estado estão "no início do aumento exponencial no número de casos – de forma que se sugere o acompanhamento diário do incremento de novos casos e sejam intensificadas as orientações de prevenção em âmbito municipal".

A expectativa é que o pico seja alcançado até o fim de julho, com uma normalização de contaminações pelo coronavírus a partir de setembro. O documento lembra ainda alerta sobre a “interiorização” e “popularização” da doença. "Acredita-se que ao alcançar o interior e os aglomerados o número de casos irá aumentar consideravelmente, assim como observado em alguns estados".

(atualizada às 16h40 com a resposta da SES-MG)

 

(com Estadão Conteúdo)

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