Truculência

Ação da PM deixa 20 feridos e 10 presos durante festa em distrito de Ouro Preto

Segundo os moradores de Antônio Pereira, feridos durante a ação truculenta teriam sido presos ao buscar socorro em UPA da cidade; PM alega que foi atacada por presentes na festa

Por José Vítor Camilo
Publicado em 31 de julho de 2023 | 15:23
 
 
 
normal

Pelo menos 20 pessoas ficaram feridas, e dez foram presas, durante uma ação da Polícia Militar (PM) para "acabar" com uma festa que acontecia, no início da noite desse domingo (30 de julho), em Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto, na região Central de Minas Gerais. Segundo os moradores, policiais chegaram ao local atirando e feriram, inclusive, idosos e uma mulher que trazia um bebê no colo. Os moradores afirmam ainda que um homem foi baleado na perna por um projétil de calibre .40, e que uma arma, que foi apreendida pela corporação, teria sido "plantada" para justificar a ação truculenta. Por nota, a PM alega ter sido atacada pelos moradores.

A reportagem de O TEMPO conversou, nesta segunda-feira (31 de julho), com dois moradores do distrito que estão indignados com a situação. Eles não serão identificados por medo de represálias. Segundo uma das pessoas ouvidas, a festa não reunia 300 pessoas, como informado pela PM. A celebração acontecia desde a parte da tarde e, segundo os moradores, contava com, no máximo, 100 pessoas — reunindo crianças, famílias e amigos dos jogadores do Candeal, time local que venceu a 2ª Copa Gigantex.

Assista ao vídeo que mostra parte da confusão:

"A gente saiu do campo, até mesmo para não provocar o time que perdeu, e fez a comemoração em outro ponto. Temos vídeos mostrando que tudo acontecia com muita tranquilidade. Até que, pouco depois das 18h, chegaram estes policiais, que vieram de Belo Horizonte inclusive, já atirando balas de borracha e jogando bombas de gás", denuncia.

Ainda segundo ela, os feridos, entre eles um homem baleado na perna, se deslocaram para a policlínica, mas, na unidade de saúde, acabaram presos pelos policiais. "Alegaram que eles confrontaram a polícia, mas isso não aconteceu. Tem uma senhora de idade que levou um tiro no rosto. Uma mulher, que estava com um bebê no colo, corre risco de ficar cega após ser atingida por uma bala de borracha no olho", protestou a moradora.

Festa veio com 12 anos de espera pelo título

Torcedora do Candeal, uma mulher de 33 anos conta que todos que acompanham o time estavam muito felizes, uma vez que o título era aguardado há cerca de 12 anos. "Meu pai ela jogador do Candeal, esperamos por esse título há muito tempo. Isso vai muito além de um simples campeonato. Estávamos felizes, era só família comemorando", disse.

Evangélica, a mulher não bebe e estava apenas acompanhando o evento junto do companheiro, da filha de 6 anos e com a bebezinha, de 2 meses, no colo. "Meu esposo estava perto da churrasqueira, batendo papo, quando a polícia chegou. Tomei um tiro de borracha no olho e outro nas costas. Imagina se pega (o tiro) em uma das minhas filhas? Meu bebê poderia morrer. Não teve confusão, não teve nada, só chegaram atirando", denuncia.

PM alega que moradores jogaram pedras em policiais

Procurada pela reportagem, a PM de Ouro Preto informou, por nota, que foi acionada até o distrito por volta de 18h20 para atender uma chamada de "perturbação de sossego" — por conta do som alto que estaria incomodando moradores. Porém, a viatura teria constatado a existência de 300 pessoas, aproximadamente, e, por isso, solicitou apoio.

Ainda conforme a corporação, enquanto os policiais aguardavam a chegada do reforço, houve uma nova solicitação via 190 dando conta de uma "rixa" no local da comemoração. "As viaturas se depararam com dois veículos com som alto. Após a intervenção policial, alguns populares começaram a hostilizar os policiais com palavras e tentaram impedir a ação policial, ocorrendo agressões e arremesso de pedras', justificou a PM.

Após o suposto ataque dos moradores, a PM alega ter reagido com uso de granadas de gás lacrimogênio, sprays de pimenta e balas de borracha. "Foi visualizado um indivíduo em meio à multidão portando arma de fogo e apontando na direção dos militares, seguido do barulho de estampido de arma, de forma que os militares fizeram uso de arma de fogo contra o cidadão que ameaçava a vida dos militares", completou a corporação.

Foram apreendidos, no local, uma arma de fogo, cinco munições calibre 380, uma foice e um facão. "O registro da ocorrência foi acompanhado por advogados dos envolvidos e encerrado na delegacia de Polícia Civil para as providências decorrentes. Em relação à atuação policial, foi instaurado um inquérito policial militar para apurar os fatos", finalizou.

A corporação foi indagada sobre as acusações de ação truculenta, arma "plantada" e prisão de pessoas feridas, mas a corporação preferiu não se posicionar. Entre os dez detidos, estão: oito homens com idades entre 24 e 42 anos e uma mulher de 58. Já um homem de 27 anos foi preso por porte ilegal de arma de fogo.

Comunidade pede imagens de câmeras dos policiais

Questionadas sobre as alegações da PM sobre o momento da abordagem, as moradoras do distrito ouvidas por O TEMPO cobram que as imagens das câmeras dos uniformes dos policiais militares sejam divulgadas para provar o que a corporação alega. "É só investigar a câmera deles, para ver se a gente estava errado, já que dizem que estamos falando mentira. Não tinha arma, pegaram uma faca e uma foice velha e forjaram a apreensão junto da arma", disse.

Segundo a outra mulher, não houve apreensão de arma no local. "Só se foi em outro lugar, lá não acharam arma nenhuma. Por isso estamos cobrando as imagens das câmeras dos policiais. A nossa comunidade já não tem um espaço de lazer, o esporte é a única forma que a gente tem de tirar os jovens da criminalidade e, quando vamos comemorar a vitória no futebol, vemos isso acontecer", protestou.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!