Após o caso do suspeito de cometer abusos sexuais contra dezenas de crianças em Várzea da Palma, no Norte de Minas, vir à tona, diversas vítimas resolveram contar o que sofreram, com o intuito de fazerem justiça e incentivarem mais pessoas a denunciarem Dinamá Pereira de Resende, de 54 anos.
Segundo Daniele Cordeiro, que atualmente tem 34 anos, os crimes aconteceram quando ela tinha aproximadamente 9. "Eu conheci ele através do projeto que ele coordenava, a Liga Católica. O meu avô era integrante, depois a minha tia e depois eu fui convidada. Eu participava de eventos sociais, do Dinamitas, da Liga Mirim e fazia danças e apresentações para falar sobre igreja e as coisas de Deus", disse.
De acordo com a vítima, por ser criança, ela não sabia que ele já cometia os abusos antes do dia que mais marcou-a. "Um dia, nós fomos fazer uma viagem de manhã, mas no dia anterior ele disse que não ia dar para passar na minha casa para me buscar, então, eu teria que dormir na casa dele. Eu estava no sofá, assistindo televisão, e adormeci. No meio da noite, eu acordei, e ele estava em cima de mim, já cometendo o ato. Fiquei assustada e joguei ele no chão", relatou.
"Que eu me lembre, só foi dessa vez, tirando aquelas situações em que ele ficava passando a mão na gente, ficava se esfregando. Nós fazíamos exercícios e ele ficava lá olhando debaixo da nossa saia, da nossa calcinha. Só agora que eu vejo que era abuso", disse.
Ainda conforme Daniele, ela não contou para ninguém sobre o fato, nem mesmo para sua mãe, por medo. "Eu não contava para os meus pais porque a minha mãe vivia com um homem que era muito agressivo, então, eu tinha medo de falar para ela e ele fazer alguma coisa comigo. Eu cheguei a contar para um moço que fazia o mesmo serviço social que ele. Como ele era palhaço, ganhou a minha confiança, mas ele não fez nada. Posteriormente, ele tentou fazer a mesma coisa comigo", afirmou.
A vítima disse que também denunciou esse segundo suposto pedófilo. A reportagem de O TEMPO perguntou à Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) se ele também está sendo investigado, e tivemos a resposta de que, durante as investigações ocorridas na época, não foi possível apurar elementos ou indícios que evidenciasse o envolvimento desta pessoa com a prática dos crimes. "O que eu quero agora é justiça e que ele pague por seus crimes" concluiu Daniele.
"Eu sentia medo e vergonha"
Ana Paula, de 25 anos, contou que o abuso aconteceu em 2004, em plena campanha eleitoral para vereador de Dinamá, que colocava as crianças para distribuir panfletos para ele. "Eu conheci ele quando eu estava na escola. Ele ensaiava a gente para dançar quadrilha, e ele estava em todos os eventos que envolvia crianças. Aí um dia ele me chamou para participar do grupo dele, e ele foi à minha casa e ganhou a confiança da minha mãe, até que ela deixou eu participar do terço e participar do grupo de dança", explicou.
"Nesse ano, ele se candidatou para vereador da cidade e não ganhou, mas eu ajudei a distribuir santinhos. E em determinada ocasião, que ia ter um comício, ele falou que tinha que voltar em casa para poder buscar mais e me levou. Foi quando ele cometeu o abuso, no quarto em que ele dormia com a mulher dele. Ele chegou a tentar a penetração, mas como eu reclamei de dor, ele parou", contou.
Depois disso, ela não teve mais contato com Dinamá. Segundo Ana Paula, ela não contou para ninguém porque se sentia culpada pelo ato. "Eu tinha medo e vergonha, porque eu pensava que era culpa minha, pensava que eu tinha feito alguma coisa para ele querer fazer isso. Eu pensava a todo momento que se eu contasse para a minha mãe ela não ia acreditar ou ela ia me bater. E então bloqueei isso", relatou.
Apenas depois que o caso veio à tona, a vítima resolveu compartilhar sua história nas redes sociais para incentivar outras pessoas a fazerem o mesmo e buscarem justiça.
Padrasto
Aos 14 anos de idade, Silmara Alves Soares, hoje com 29 anos, pediu para que o namorado da época a engravidasse. Ser mãe precoce não era sua vontade, mas sim uma estratégia para sair de casa e parar de sofrer os abusos sexuais praticados pelo pedreiro, que na época era seu padrasto.
"Os abusos começaram quando eu tinha de 5 para 6 anos. Minha mãe começou a nos levar na Liga Católica Mirim, um grupo de oração para crianças que ele coordenava. Depois ele se envolveu com minha mãe e foi quando começou tudo", conta.
Segundo ela, os abusos eram frequentes e ocorriam em vários lugares, na casa dela, na escola onde ensaiavam as danças e apresentações teatrais e até mesmo nas dependências da igreja. “Ele passava as mãos nas minhas partes íntimas e fazia sexo oral, além de passar a genitália dele no meu corpo. Eu tinha medo de contar porque ele dizia que se eu falasse ele ia estourar o botijão de gás da minha casa e matar eu e minha mãe”, lembra.
Segundo ela, aos treze anos ela começou a namorar e o suspeito não aceitava o relacionamento e chegou a dar um soco no rosto dela. “Eu cheguei a fazer uma denúncia na polícia, mas minha mãe tirou a queixa. Ela não acreditava em mim. Ninguém acreditava porque ele transparecia ser um anjo”, lamenta.
Silmara conta que quando o pedreiro começou a namorar com sua mãe ela tinha esperança de ter um pai, já que o pai dela tinha morrido. “Eu tinha nele a imagem de super protetor, achava que ele ia cuidar de mim, mas não foi nada disso. Virou um tormento”.
Silmara disse que somente hoje ela descobriu que várias outras meninas da sua família também foram estupradas por ele. Atualmente ela tem quatro filhos, três meninas e um menino, e diz que não confia de deixar nenhuma das três filhas com nenhum homem mesmo sendo parente. “É um trauma para a vida toda. Nunca vou esquecer”, completou.
Outro lado
A reportagem conseguiu contato com o advogado do acusado, que já foi indiciado pela PCMG. De acordo com Santiago Átila, seu cliente nega todos os crimes; ele não quis dar mais detalhes pois o processo segue em segredo de justiça.
O homem não ficou preso pelo fato de os crimes serem antigos e já terem prescrito. A Polícia Civil representou pela prisão preventiva, mas a Justiça decidiu que ele devia cumprir medidas cautelares, como não realizar mais nenhum tipo de trabalho com as crianças ou religioso e como ele não descumpriu não precisou ser preso.
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