Meio Ambiente

Caça ao javali é questionada 

Grupos de proteção animal são contra metodologia usada na perseguição em todo o país

Por Johnatan Castro
Publicado em 26 de julho de 2016 | 03:00
 
 
 
normal

Araxá. A Lei Federal 5.197/1967 proíbe perseguição, destruição, caça ou apanha de qualquer animal silvestre. Depois de décadas de combate a uma prática enraizada no interior do país, a decisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de liberar o abate controlado de javalis e javaporcos, em 2013, logo despertou a dimensão polêmica da atividade. Em todo o Brasil, entidades de proteção animal questionam os métodos empregados pelos caçadores da espécie, que costumam “sangrar” os bichos com facas e chuchos – espécie de lança de ponta de metal e cabo de madeira. Outra reclamação é o uso de cães de caça no processo.

Como O TEMPO mostrou nessa segunda (25), uma superpopulação de javalis tem causado danos a lavouras e ao meio ambiente em diversos Estados. Em Minas, os animais estão em ao menos 300 municípios. Vanice Teixeira Orlandi é presidente da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa), entidade formada em 1895, e classifica as caçadas como um massacre. Ela acredita que os controladores usam a prática como um caminho para a regulamentação da caça esportiva no país.

“O Brasil não pode ver o javali como uma espécie invasora, porque ela foi importada. Nunca foi feito um controle dessa população. Não se pode resolver o problema às custas de crueldade com o animal”, questiona. Meses atrás, a Uipa enviou ao Ibama um ofício criticando o controle de javalis, mas não recebeu resposta. Na última sexta-feira, a entidade protocolou a reclamação no Ministério Público Federal (MPF). “Tem que ter um método de controle populacional aceitável”, argumenta Vanice.

Defensora da causa animal há 45 anos, Sheila Moura expõe no site da Sociedade Educacional Fala Bicho vídeos e fotos em que caçadores exibem a captura e o abate dos javalis. “Não sou contra a matança, sou contra a forma da matança. Sou a favor de que o Ibama tire a responsabilidade do caçador, porque é um absurdo colocar o caçador para resolver o problema da praga”, critica.

Morte. De fato, os caçadores admitem o uso de chuchos e facas, mas dizem priorizar uma morte rápida e com o mínimo de sofrimento para o animal.

O empresário André Luiz Honorato, 55, coordena uma equipe de caçadores autorizados em Araxá, no Alto Paranaíba. Ele diz pedir para que membros de seu grupo não exponham os manejos em redes sociais, mas destaca que não é possível fugir de alguns aspectos do abate. “Quando o Tony Ramos mostra a carne, lá na propaganda, ninguém mostra o funcionário com a mão suja de sangue abatendo o boi”, argumenta.

Ecóloga e doutora em ecologia pela Universidade Federal de Lavras (Ufla), Clarissa Alves da Rosa defende a caça controlada. “Os maus-tratos são reais, não podemos negar isso, e não é o tipo de caça que queremos. Por isso, as sociedades (protetoras dos animais) deveriam trabalhar em parceria com os controladores para identificar e minimizar os maus-tratos em vez de unicamente jogar contra”, avalia.

Para João Riograndense, coordenador geral de Fauna e Recursos Pesqueiros do Ibama, os maus-tratos precisam ser minorados ao máximo. “A caça, em qualquer lugar do mundo, importa em alguma ação que submete o animal a alguma possibilidade de sofrimento. Temos que respeitar a questão animal para ter um abate de uma maneira mais profissional possível”, afirma.

Ação

Conflitos. Entidades de proteção animal afirmam que, muitas vezes, até 20 cachorros são empregados na imobilização de um único javali, o que promove, segundo essas associações, “um verdadeiro banho de sangue”.

Saiba mais

Ração. No canil de Araxá, os 84 cachorros consomem 1.500 kg de ração por mês. O produto é feito no próprio espaço. Os controladores dizem ter parcerias com ONGs de proteção animal da região, que compram parte da ração por R$ 1,60 o quilo.

Encontro. No dia 20 de agosto, Varginha receberá um encontro de cães de trabalho. O local terá a reunião de criadores de animais farejadores, usados para rastreamento.

Congresso. Em abril, Goiás recebeu o primeiro Congresso Brasileiro de Caça, organizado pela ONG Brasil Safari Clube. O objetivo foi dar visibilidade à causa e mudar a imagem de quem pratica a caça perante a opinião pública.

Cães ficam feridos após caçadas

Tyson tem 2 anos e meio e é o que caçadores chamam de “cão de agarre”. Da raça dogo argentino, o cachorro já está aposentado há meses e exibe cicatrizes adquiridas em conflitos com javalis. Ele foi o último cão de agarre da equipe de caçadores autorizados de Araxá, que mantém um canil com 84 cães. “As fêmeas de javali ficam furiosas e detonam os cachorros. É um massacre”, diz Sheila Moura, da Sociedade Educacional Fala Bicho.

Os controladores defendem que os cães são fundamentais para a caça. “Não tem ninguém que quer melhor os animais do que a gente. Cuidamos deles com muito carinho”, diz André Luiz Honorato, 55. (JHC)

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!