O gesseiro Carlos William Gonçalves de Oliveira, 20, vítima de um acidente de trânsito no centro de Belo Horizonte há um mês, pode ser um dos últimos a ter direito à indenização do seguro obrigatório Dpvat. Atingido por um carro quando transitava de motocicleta pela avenida Afonso Pena, o jovem autônomo recebeu com pesar a decisão do governo federal de extinguir o seguro a partir de 2020, conforme a Medida Provisória (MP) 904/2019, publicada ontem no “Diário Oficial da União”. “É um dinheiro que pode ajudar não só a mim, mas a todas as pessoas que se machucam no trânsito”, lamentou.
Por dia, em média, 94 pessoas em Minas Gerais recebem indenização do Dpvat por acidentes de trânsito. Somente nos seis primeiros meses de 2019, foram 17.092 pagamentos no Estado, segundo dados da Seguradora Líder, atual gestora dos recursos do Dpvat. Desse total, 10.031 pessoas obtiveram o recurso após um diagnóstico de invalidez permanente, e 5.141, para cobrir as despesas médicas decorrentes de um acidente. Outras 1.921 pessoas receberam a indenização depois da morte de um familiar no trânsito.
Para Fernando Diniz, presidente da ONG Trânsito Amigo, a extinção do seguro vai atingir diretamente as vítimas em situação de baixa renda. “Esse é um recurso que faz muita diferença para a população mais pobre, que precisa desse dinheiro para pagar por um remédio, fazer uma fisioterapia”, disse Diniz.
É o caso de Oliveira, que quebrou a perna direita e sente dores intensas. Por recomendação médica, ainda não pode trabalhar e conta com o pagamento da indenização – que pode chegar a R$ 2.700 – para repor o dinheiro gasto com remédios e curativos. “É um jeito de compensar todos os dias que estou parado”, afirmou o gesseiro.
Ao justificar a edição da medida provisória, o governo federal afirmou que o objetivo é evitar fraudes no seguro e garantiu que o cidadão não vai ficar desassistido, já que será atendido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e poderá contar com auxílio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ou do Benefício de Prestação Continuada (BPC). No entanto, o fim do Dpvat pode representar um rombo ao SUS, já que 45% do total arrecadado com o seguro vai para o atendimento às vítimas de acidente na rede pública. Neste ano, foram R$ 965 milhões no Brasil.
Autarquia nega que fim do seguro terá impacto no SUS
Uma das responsáveis por apresentar ao governo federal dados que levaram à decisão de se extinguir o Dpvat, a Superintendência de Seguros Privados (Susep), autarquia vinculada ao Ministério da Economia, argumenta que o fim do seguro obrigatório não vai causar rombo aos cofres do Sistema Único de Saúde (SUS).
Segundo a Susep, o recurso repassado pelo seguro ao SUS neste ano representou apenas 0,79% do orçamento total da saúde pública. A autarquia afirma ainda que, no ano passado, o SUS usou somente 14% do valor proveniente do Dpvat para arcar com despesas relacionadas a acidentes de trânsito.
A Susep calcula que, até o fim de 2025, o SUS deverá receber cerca de R$ 5 bilhões em repasses do Dpvat. Segundo o órgão, o “valor corresponde ao excedente acumulado em função das fraudes sistemáticas do seguro”.