Alerta

Morte única em Nova Lima gera desconfiança sobre notificações

Para especialista, falta mais clareza na divulgação de dados sobre a Covid-19 em alguns municípios mineiros

Por Gabriel Rodrigues e Rafaela Mansur
Publicado em 19 de junho de 2020 | 03:00
 
 
 
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Minas Gerais atravessa atualmente seu pior momento na luta contra a Covid-19. E se, por um lado, alguns municípios são transparentes e adotam medidas severas para mostrar a real situação em relação ao número de casos, outros dão a impressão de que testam pouco, o que resulta em um baixo número de registros da doença.

Para se ter uma ideia das divergências que ocorrem em Minas, Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, registra, em mais de três meses de luta contra a doença, apenas uma morte e 331 casos confirmados da Covid-19. Questionado sobre a real situação do município e sobre qual seria a “fórmula de sucesso” adotada pela prefeitura, o secretário municipal de Saúde, José Roberto Machado, disse que as condições socioeconômicas da cidade contribuem para a baixa taxa de letalidade. “Mais de 70% dos casos positivos são de pessoas que confirmaram em laboratórios particulares”, afirmou.

Machado disse que todas as pessoas com suspeita de coronavírus, mesmo com sintomas leves, passaram a ser testadas na cidade há cerca de duas semanas. Para especialistas, o atraso pode justificar o baixo número de registros, já que a Covid-19 vinha sendo testada em maior volume por outros municípios mineiros desde meados de março.

O secretário de Nova Lima descarta a possibilidade de subnotificação de mortes no município, alegando que “o hospital é obrigado a fazer a coleta da amostra em 100% dos casos”.

O professor Luiz Henrique Duczmal, do Departamento de Estatística da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), faz análises sobre a curva de casos de Covid-19 em Minas Gerais em diferentes locais e cobra que todos os municípios sejam mais transparentes sobre a quantidade de testes que realizam.

Pesquisadores e médicos apontam que grandes discrepâncias são notadas entre os municípios mineiros, não necessariamente porque a doença se manifesta com maior gravidade em algumas cidades, mas devido a diferentes processos adotados, como o número de pacientes testados. “A doença é igual em todos os lugares. Essa diferença pode ser questão de testes mesmo. Talvez o sistema de vigilância de alguns municípios seja mais fraco, e a cobrança, menor. Trata-se mais de processo do que de perfil populacional”, aponta a infectologista Helena Duani, professora da UFMG.

Na capital, é registrada uma morte para cada 44 casos. Boletim divulgado ontem pela prefeitura destaca que, no primeiro quadrimestre, houve 15,1% de aumento nos óbitos por causas respiratórias e 17,7% por causas não definidas em relação ao mesmo período de 2019. Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde informou que faria coletiva hoje para explicar o caso.

Especialista prevê risco para controle

Rodrigo Molina, infectologista e professor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), destaca que, sem precisão nos testes ou quantidade similar de testagem em cada município, proporcionalmente, é difícil entender a dinâmica precisa da pandemia nas cidades. “Vai haver uma ideia falsa porque onde não se faz teste não aparecem casos e se passa a imagem de uma cidade muito tranquila”, diz. Nesse cenário, ele prevê perigo para o futuro: “Isso é um risco, porque, quando as pessoas começam a circular, a epidemia é mantida, ela não acaba”.

Segundo a Secretaria de Estado de Saúde, o critério de testagem deve ser o mesmo nos municípios, e óbitos suspeitos precisam ser testados. 

Formas diferentes

A SES-MG informou, por nota, que não há como estabelecer um único fator para as diferenças entre municípios mineiros, como a taxa de mortalidade em relação ao número de infectados, “pois os municípios apresentam realidades muito diferentes e formas diferentes de lidar com a pandemia”. A pasta também esclareceu que as cidades devem informar casos e óbitos à secretaria e que os dados sobre o total de testes realizados são enviadas diariamente por prefeituras e laboratórios parceiros. 

Retorno é demorado

Questionada sobre relatos de óbitos que não aparecem nos boletins da SES-MG e se isso explicaria a quantidade inferior de mortes em algumas cidades, a secretaria respondeu que não é possível fazer essa inferência, já que todos os óbitos suspeitos seriam testados para o novo coronavírus, conforme orientação do Ministério da Saúde. A pasta ainda lembra que a notificação de um caso ou óbito passa por diversos processos de investigação e informação até aparecer nos boletins estaduais diários.

Por meio de nota, a Prefeitura de Nova Lima informou nesta sexta-feira que o fato de a cidade ter registrado apenas uma morte até o momento se deve à efetividade das ações que a administração municipal tem realizado nos últimos meses.

Leia a íntegra do comunicado:

Em resposta às publicações feitas por O Tempo/Super nesta sexta-feira (19/06), a Prefeitura de Nova Lima esclarece que sempre atuou de maneira transparente e repudia a ilação de que estaria subnotificando os óbitos na cidade, feita de maneira leviana, na matéria que tem como título, no portal, “Morte única em Nova Lima gera desconfiança sobre notificações”.

A Administração Municipal da cidade tem agido com veemência e responsabilidade no combate à doença por meio de investimentos estruturais, técnicos e amparados no trabalho sério de especialistas da saúde e de outras áreas. É importante esclarecer que todas as mortes suspeitas são investigadas e, até o momento, cerca de 60% dos casos notificados de coronavírus no município foram testados, fato que coloca Nova Lima em um cenário bem diferente de outras cidades, do estado e do país. Como forma de dar transparência aos cidadãos e à imprensa, o número de casos notificados, confirmados, recuperados, descartados e em investigação são divulgados diariamente, sem exceção.

Cabe ressaltar ainda que o município foi pioneiro em Minas Gerais na desinfecção de locais com maior circulação de pessoas e um dos primeiros da região a determinar a obrigatoriedade do uso de máscaras pelas pessoas que saírem de casa. Além disso, desde o início da pandemia, a Prefeitura de Nova Lima instituiu um gabinete de crise, publicou decretos e realizou uma série de ações para conter o avanço da doença: suspensão das aulas e de eventos, reorganização dos serviços públicos, contratação de profissionais para a saúde, fechamento do comércio por 45 dias (seguida de abertura gradativa e responsável), mais de 3 mil ações de fiscalização dos estabelecimentos, recomendação e incentivo ao isolamento social, criação do Alô Saúde, parceria com o Hospital Nossa Senhora de Lourdes, definição de protocolo de atendimento de casos suspeitos, abertura do Centro de Atendimento - Coronavírus (Ceacor), instalação de pias com sabão em pontos estratégicos, realização de um amplo serviço de comunicação educativo e informativo, dentre tantas outras.

Se até o momento Nova Lima registra um óbito em razão da doença, muito se deve, justamente, à efetividade das ações que a Administração Municipal tem realizado nos últimos meses. O fato de outras cidades apresentarem índices diferentes não significa que essa realidade possa e deva ser aplicada às demais. A Prefeitura de Nova Lima repudia o uso de comparações estatísticas e percentuais para levantar suspeitas sobre as informações oficiais repassadas. Colocar em dúvida a notificação da quantidade de mortes ocorridas no município evidencia apenas o desconhecimento dos protocolos e a distorção das informações repassadas ao veículo. 

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