O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) investiga a conduta de 21 médicos que não cumpriam a carga horária estabelecida em contrato, mas recebiam o salário de maneira integral em Poços de Caldas, no Sul de Minas. Todos foram desligados da rede pública, mas, como atendem consultas eletivas, não há prejuízo no serviço de emergência e urgência. Segundo o promotor Sidnei Bocchia, a situação foi descoberta há dois anos, depois de uma denúncia de que um vereador, também médico na cidade, ainda trabalhava no Estado de Goiás.

"Apesar de vereador e médico, ele também prestava serviço em Goiás, o que denota uma incompatibilidade de horários. Ao ser questionado pelo Ministério Público, o médico respondeu que realmente aglutinava seu horário de trabalho às segundas e terças em Poços de Caldas e que nos outros dias realmente se deslocava ao outro Estado. Ele disse ainda que não era apenas ele a fazer isso. Todos os outros médicos da rede pública eram autorizados pela administração superior a fazerem práticas semelhantes", conta  Bocchia.

Após esse depoimento, o promotor deu início a investigação e descobriu um acordo informal firmado entre os médicos e a prefeitura em que a jornada de trabalho poderia ser substituída por número de atendimentos. "Eles se pautaram em uma resolução ou recomendação do conselho de medicina que prevê 15 minutos para um atendimento especializado. Em uma hora, um médico atenderia quatro pacientes. Ao longo de uma semana, portanto, atenderia 80 pacientes. Muitos médicos passaram a aglutinar 80 atendimentos em um ou dois dias. Isso representa, portanto, uma diminuição de 50% da carga horária de trabalho, mas mantendo o salário", explica Boccia.

Segundo o promotor, a situação é totalmente inaceitável, porque os médicos prestaram concurso já sabendo da jornada de trabalho. "Se o pleito dos médicos é justo porque argumentam que ganham pouco proporcionalmente, o que falar dos professores da rede pública? Os professores vão sair no meio da jornada e abandonar os alunos sob o pretexto de que ganham pouco e, portanto, vão usar metade da jornada para dar aulas particulares?", argumenta.

Boccia informou que os 21 profissionais demitidos estão em um universo de mais de cem médicos. Segundo ele, a jornada de trabalho, bem como a remuneração. "Em regra, os médicos de especialidades trabalham quatro horas por dia. O salário também muda muito. O desse vereador, por exemplo, é superior a R$ 20 mil, enquanto alguns médicos que pediram demissão e que entraram no sistema recentemente beire R$ 3.000. Eles cumprem uma jornada, às vezes, de uma ou duas horas por dia", explica.

Ainda de acordo com o promotor, o próximo passo é colocar sistema de biometria em todos os pontos de atendimento e em todos os serviços da prefeitura. Questionado se a administração municipal será investigada, ele disse que alguns inquéritos já foram abertos.

A reportagem fez contato com a prefeitura de Poços de Caldas e ainda aguarda um posicionamento sobre o caso. O Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG) também foi procurado, mas até o momento as ligações não foram atendidas.

Situação de emergência

O prefeito de Poços de Caldas, Sérgio Azevedo, anunciou nessa terça-feira (30) que a cidade está em situação de emergência financeira. Segundo ele, foi necessário fazer cortes em despesas para garantir compromissos de fim de ano, já que a cidade tem três folhas de pagamento nos próximos dois meses e quer honrar os compromissos, principalmente com os servidores.

Ainda segundo o prefeito, a dívida do Estado com Poços de Caldas chega à casa dos R$ 60 milhões. Destes, aproximadamente 40 milhões são referentes à saúde e os outros 20 milhões aos repasses de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Azevedo ainda afirmou que haverá corte das horas extras e revisão das despesas solicitadas, mas que as medidas ainda não estão em andamento. Apesar disso, as horas extras dos serviços essenciais vão ser permitidas para que a população não seja prejudicada - o que inclui Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), hospitais, serviço funerário, limpeza urbana e educação infantil.