Justiça

MP processa ex-secretária de Educação do governo Pimentel por improbidade

Macaé Evaristo é acusada pelo órgão de dar continuidade em processo de licitação comprovadamente superfaturado para a compra de móveis escolares

Por Izabela Ferreira Alves
Publicado em 28 de outubro de 2020 | 18:42
 
 
 
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A 5ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias de Belo Horizonte intimou a ex-secretária municipal e estadual de Educação Macaé Evaristo dos Santos a apresentar sua defesa contra uma denúncia de improbidade administrativa feita pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

A suspeita que recai sobre a ex-secretária de Estado é de superfaturamento na licitação para compra de móveis escolares no ano de 2015, quando assumiu a Secretaria de Estado de Educação (SEE) na época do então governador de Minas, Fernando Pimentel (PT).

De acordo com o MPMG, no inquérito, também são denunciadas a empresa JDavóglio e a sócia Adriana Davóglio. O promotor Leonardo Barbabella solicita o bloqueio de bens dos envolvidos da ordem de R$1.890.138,75, montante apurado como equivalente ao prejuízo causado ao Estado, em 2015.

A acusação

Segundo o MPMG, naquele ano, ao assumir a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE), Macaé Evaristo lançou um edital de licitação para aquisição de carteiras escolares para todo o Estado. Até o fim de 2014, essas compras eram feitas de fornecedores mineiros, sendo que o preço máximo de cada kit era de R$100.

Entre as vantagens desse sistema, está a redução dos preços dos móveis, a proteção da indústria mineira e, consequentemente, a maior arrecadação tributária, já que os tributos incidentes na operação comercial, principalmente o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), permaneciam no estado.

No caso, o valor total da concorrência superou a marca de R$ 276 milhões e, segundo o Ministério Público, gerou uma perda de arrecadação de mais de R$30 milhões. Isso porque apenas uma das empresas vencedoras estava sediada em Minas.

Em 23 de dezembro daquele ano, a pasta assinou contrato com a empresa vencedora de quatro lotes do pregão para fornecimento dos móveis, a JDavóglio Móveis Ltda., com sede no bairro de Bonsucesso, no Rio de Janeiro, representada Adriana Maria Gradin Davóglio. A  empresa apresentou um valor de R$15.725.175,00 

Secretaria ignorou pedido do MP 

À época, o Ministério Público comunicou a secretaria de Educação que teria comprovado aquisição superfaturada e solicitado a suspensão da licitação ou da contratação da empresa vencedora.

Segundo o órgão, os valores oferecidos pelas empresas licitantes foram superiores aos valores de referência do Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação (FNDE) em R$ 6.413.306,90. 

Ainda conforme o inquérito, os móveis da JDavóglio, adquiridos em quatro lotes, não atendiam aos padrões mais recentes, mas já em validade, adotados pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). 

Mesmo com os vários indícios de irregularidades, o processo foi concluído e os contratos executados. 

O que dizem os acusados

Macaé Evaristo dos Santos disse ontem ter tido conhecimento da denúncia apenas pela imprensa, o que lhe causou muita surpresa. Ainda de acordo com a ex-secretária de Educação estadual, o estranhamento é ampliado, ao considerar que é uma mulher negra, candidata a vereadora em Belo Horizonte e estarmos a poucos dias da eleição.

Já a secretaria de Estado esclareceu que o processo é relacionado à gestão anterior. Ainda assim, informa não ter sido notificada oficialmente sobre o andamento das investigações pelo MPMG.

Sem fundamento

A empresa JDavóglio diz que as alegações do Ministério Público não têm qualquer fundamento. “Os produtos vendidos pela empresa sempre seguiram os padrões da portaria 105 do Inmetro, ao contrário do que foi temerariamente alegado no processo.”

Ademais, a firma sagrou-se vencedora em licitação concorrida e que observou todos os parâmetros legais. Os preços dos produtos estavam dentro dos padrões de mercado da época. A empresa garante não compactuar com quaisquer atos de improbidade administrativa.

No dia 5 de novembro, a empresa voltou a se manifestar e emitiu uma nota sobre o caso. Confira a íntegra:

A JDavóglio Comercial Ltda. viu recentemente seu nome denegrido em várias matérias jornalísticas as quais, estranhamente, foram publicadas próximas às eleições e envolvem a Ex-Secretária de Educação do Estado de Minas Gerais, Macaé Evaristo dos Santos, esta com grandes chances de ocupar o cargo de vereadora de Belo Horizonte.

A empresa não pode deixar de responder aos ataques feitos à sua honra.
Ao contrário do que relatado, inclusive na ação movida pelo Ministério Público mineiro, a JDavóglio não se trata de empresa de fachada que conta apenas com uma sala na cidade do Rio de Janeiro. 

É firma fundada em 1998, que tem sede no interior de São Paulo e filial na capital fluminense, com faturamento de vários milhões de reais por ano e que vende para os mais respeitáveis órgãos públicos do Estado de São Paulo e de todo o Brasil, em todas as esferas de governo, nunca tendo envolvido-se em qualquer ato de corrupção.

É imprecisa e maliciosa a afirmação de que o Governo de Minas comprou por R$ 188,00 conjuntos escolares que antes eram adquiridos por R$ 100,00. De fato, as carteiras que a Administração mineira comprava antes de 2015 eram modelos antigos, que não possuíam ergonomia, segurança e durabilidade, colocando em risco a integridade física dos alunos da rede pública de ensino.

Este fato arrazoa o alegado aumento de preço, uma vez que o custo dos conjuntos escolares modernos, projetados pela respeitadíssima Fundação para o Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo - FDE - em parceria com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e com selo do Inmetro, tendem naturalmente a custar mais caro.

Entretanto, a diferença no preço é igualmente proporcional às qualidades do produto, que são duráveis e preservam a integridade física das crianças e dos adolescentes.

Afirmou-se que uma das irregularidades da licitação seria a falta de exigência de adequação dos móveis às normas do Inmetro (Portaria 105); entretanto, o que aconteceu foi exatamente o oposto: pela primeira vez Minas exigiu produtos com garantia oficial de qualidade, mesmo porque a Portaria 105 proibiu a venda, em todo o país, de conjuntos aluno não certificados e sem o selo de qualidade do Inmetro.

Outra absurda inverdade é a alegação de superfaturamento. Os preços dos produtos entregues em Minas foram equivalentes àqueles registrados, no mesmo ano, na licitação promovida pelo FNDE, autarquia federal ligada ao MEC. 

Mesmo sendo a licitação federal muito mais vultosa, pois compreende compras para todo o país, o que em tese geria preços menores, o conjunto escolar foi vendido a R$ 188,00, idêntico preço pago pelo governo mineiro.
Abre-se parênteses para aqui destacar que o conjunto aluno comprado pelo MEC, que abastece todo o Brasil, é exatamente aquele projetado pela FDE/FNDE e que também foi adquirido em Minas.

Pois bem. Para apontar-se o tal sobrepreço, foi adotada uma inescrupulosa técnica: do valor do conjunto vendido pela empresa JDavóglio (R$ 188,00) subtraiu-se o menor preço do conjunto escolar registrado na própria licitação da Secretaria de Educação de Minas (R$ 165,00), chegando-se a uma diferença de R$ 23,00 por unidade, a qual foi multiplicada pelo número de carteiras vendidas.

No entanto, esqueceram-se de considerar alguns aspectos, tais como o fato de que a firma que vendeu por R$ 165,00 é de microempresa, optante pelo Simples Nacional e que, portanto, tem uma carga tributária muito reduzida, o que a permite praticar preços mais baratos.

De mencionar-se que essa empresa venceu o menor lote da licitação, pois, pequena, não tinha capacidade de comercializar maior quantidade de produtos. Fosse ela de mais elevado porte e tivesse condições de ganhar outros lotes, decerto não conseguiria ofertar os conjuntos com aludido valor, posto que inexistiriam benefícios fiscais.

Também foi desprezado, dentre outros fatores, o valor do frete.

Outra falácia é que Minas teria deixado de arrecadar ICMS por não ter favorecido a indústria estadual. Ora, segundo a Lei de Licitações, não se pode privilegiar fornecedores do estado licitante, sob pena de restrição de competitividade (o que geraria preços mais altos) e de ferir a igualdade de condições entre os concorrentes.

Finalmente, importantíssimo dizer que, depois de efetuadas as entregas do conjuntos escolares, o Governo de Minas Gerais demorou nada menos de um ano e dois meses para pagar por eles. Tal fato fez com que a empresa quase falisse. Quando pagou, o estado não agregou ao valor devido juros e sequer a correção monetária os quais, tivessem sido cobrados, seriam da ordem de mais de R$ 1 milhão de reais.

Entende-se que está aquém da nobreza da missão do Ministério Público atacar uma figura pública, bem como uma empresa proba, que gera empregos e renda, sem o mínimo de suporte para tanto e sem ter, ao menos, feito as contas corretamente e ido às escolas para averiguar a diferença entre os conjuntos escolares modernos e aqueles que antes eram utilizados.

Por todos esses lamentáveis fatos é que se indigna a empresa e presta estes esclarecimentos ao bom povo mineiro e a todos os brasileiros que tiveram contato com a falsa notícia.

Prazo de 15 dias

A ex-secretaria de Educação bem como a empresa e Adriana Davóglio têm 15 dias, contados a partir da data de recebimento da denúncia, para apresentarem à Justiça a primeira defesa.

A partir daí, o juiz Rogério Santos Araújo Abreu, da 5ª Vara de Fazenda Pública e Autarquias, vai decidir se aceita a acusação do MPMG e instaura o processo e se vai conceder, liminarmente, o bloqueio dos bens.

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