Matemática e português. Muitas vezes, quando se fala em déficit na educação, essas duas palavras costumam surgir quase em um passe de mágica, uma vez que retratam duas das matérias mais desafiadoras para muitos estudantes. No entanto, para a cofundadora e CEO da ONG Embaixadores da Educação, Guilhermina Abreu, há um abismo muito mais profundo e comovente quando o assunto são jovens em idade escolar: a falta de sonhos. 
 
É justamente para combater esse quadro e inspirar os mais novos a fazer a diferença que o projeto Crie o Impossível é promovido desde 2018, com foco em alunos do ensino médio de escolas públicas. A ação é realizada pela ONG Embaixadores da Educação e correalizada pelo Sebrae, com apoio do Grupo Sada. Nomes inspiradores, os “heróis possíveis” contam suas histórias de vida e como conseguiram obter sucesso, mesmo diante de todos os desafios. Neste ano, o evento acontecerá em 3 de junho, das 8h às 12h, e, pela primeira vez, será transmitido ao vivo para escolas públicas de todo o país, para cerca de 100 mil estudantes, gratuitamente. Além disso, haverá um evento presencial no Estádio Beira-Rio, em Porto Alegre, no Sul do Brasil, para 10 mil alunos. 
 
O objetivo, segundo Guilhermina, é que os jovens participantes assistam à “aula mais inspiradora” de toda a trajetória deles. São, ao todo, 11 palestrantes, com histórias de vida bem semelhantes às dos estudantes – de dificuldades, mas também de empenho e dedicação. Ao longo de 12 minutos, esses palestrantes utilizam a linguagem dos mais jovens para mostrar que é “possível criar o impossível”. A meta é que esse pensamento de fé em si e na sociedade se torne realidade em grande escala. Conforme a CEO da ONG Embaixadores da Educação, é importante que histórias inspiradoras e de vitórias não sejam exceções, mas sim regra. 
 
“Não podemos comemorar exceções e achar bonito. Se só algumas dessas histórias acontecerem, não vão transformar a sociedade, o Brasil. Essa transformação só vai acontecer quando a exceção se tornar regra. Para que isso aconteça, a gente precisa oportunizar os alunos em escala”, diz Guilhermina. 
 
Heróis possíveis 
 
Vários nomes que fizeram história no Brasil já palestraram no Crie o Impossível. Alguns dos destaques em eventos anteriores foram a médica e vencedora do “Big Brother Brasil 20”, Thelma Assis; o rapper Emicida; a primeira mulher negra a ocupar a posição de CEO no Brasil, na Lacoste, Rachel Maia; e a executiva do Google Lisiane Lemos. A lista deste ano será divulgada em breve.  
 
Empower 
 
Apesar de representar momentos marcantes na vida dos jovens durante o evento transmitido para milhares de estudantes, o Crie o Impossível não é apenas um dia inspirador. No evento, os jovens são convidados a participar da jornada Empower, também desenvolvida pela ONG Embaixadores da Educação. 
 
No projeto, os alunos identificam problemas tanto em suas escolas quanto na comunidade onde vivem e criam soluções para um futuro mais próspero. No fim do processo, são distribuídos mais de R$ 10 milhões em bolsas de estudo integrais, para cursos na faculdade ou para aprender um novo idioma, por exemplo.  
 
Neste ano, os projetos que serão apresentados pelos estudantes na jornada Empower devem atender aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU), que abrangem temas como erradicação da pobreza, educação de qualidade, emprego digno, crescimento econômico e igualdade de gênero. “Esses objetivos focam os principais desafios atuais do mundo, por isso foram escolhidos”, explica Guilhermina. 
 
Tire suas dúvidas sobre o projeto 
 
Entrevista com a CEO da ONG Embaixadores da Educação, Guilhermina Abreu 
 
Qual é o objetivo do Crie o Impossível?  
 
O Crie o Impossível tem o objetivo de ser a aula mais inspiradora da vida do aluno. Muitos relatam que, de fato, este foi o dia mais inspirador, uma das experiências mais fortes que já tiveram. Convidamos pessoas que vieram da mesma realidade deles, e essas pessoas compartilham suas histórias. Muito mais do que uma inspiração, os alunos são chamados para a ação. 
 
Como criar/incentivar na vida desses jovens a capacidade de sonhar? 
 
Para os alunos sonharem, se tornarem empreendedores, eles precisam ver referências. Por isso, trazemos esses “heróis possíveis” para incentivar os estudantes nessa jornada. Desenvolvemos expertise para falar na linguagem deles. 
 
O que podemos falar sobre o nome “Crie o Impossível”? 
 
Algumas coisas, em um primeiro momento, parecem impossíveis. É necessário que existam ajuda e oportunidades. Às vezes, os jovens estão imersos em uma realidade bastante desafiadora. 
 
Quais são as principais demandas na vida dos jovens atualmente? 
 
Falta de oportunidade, de educação de qualidade, de perspectiva; mas o maior déficit é o de sonhos. 
 
Na pandemia, a situação dos jovens estudantes ficou ainda mais desafiadora? 
 
O ensino médio já é a cicatriz da educação brasileira, com o maior número de evasão. Com a pandemia, a aula remota foi difícil para muitos alunos da escola pública, e o desânimo com os estudos aumentou.  
 
História de sucesso 
 
Para sonhar, é preciso acreditar. Mas, muitas vezes, “acreditar”, inclusive no próprio potencial, é um desafio – é necessário que alguém faça isso por você primeiramente. A constatação é de Kimberlly Vertelo, 19, uma das participantes inspiradas pelo Crie o Impossível.  
 
Após assistir o evento, a jovem seguiu em frente criando e desenvolvendo ações que ajudam a modificar a sociedade, por meio da jornada Empower. E foi assim, se destacando em suas ideias diferenciadas, que Kimberlly conseguiu uma bolsa para estudar direito em uma faculdade de Belo Horizonte e não parou mais de lutar por seus objetivos. Na bagagem, agora, ela carrega, além do desejo de se tornar advogada, a esperança de desbravar o mundo: conhecer outros países, como o Canadá, e até mesmo estudar fora do Brasil. 
 
“Os Embaixadores da Educação (ONG responsável pelo projeto) acreditaram em mim, em um momento em que eu estava desacreditada. Agora, vejo que tudo valeu a pena. O ser humano é que ‘faz o impossível’”, diz ela. 
 
A história de Kimberlly com o projeto começou numa época em que ela morava em um abrigo na capital mineira, após alguns problemas em casa. Ela foi incentivada a participar da ação por meio da gestora de projetos especiais Rayanne Oliveira, que atuou como parceira da iniciativa. Na jornada Empower, a jovem foi responsável pela criação de dois projetos: um de compostagem em escolas públicas e outro chamado “Save Money”, que visa levar aos jovens a importância de uma boa organização financeira. Mais do que a premiação recebida por suas criações, todo esse trabalho rendeu um sentimento de “dever cumprido”. 
 
“O projeto me ajudou muito. Corri bastante atrás”, conta Kimberlly, que agora planeja voos ainda mais altos, depois de aprender tantas lições com o projeto e de ajudar tanta gente com suas criações. “Pretendo entrar em Havard”, diz ela.  
 
Assim como encontrou pessoas para acreditar em seu potencial, a jovem crê no poder de transformação da sociedade. Ela acredita ser possível que outros estudantes, como ela, façam a diferença e se realizem nas mais diferentes frentes. O segredo? A persistência, o que pode ser resumido em apenas duas palavras na visão da jovem: “não desista”. “O segredo é não desistir de nada”, conclui Kimberlly. 
 
Indo além 
 
Apesar de se falar muito em sonhos e até de levar o nome “impossível”, o projeto também revela que é essencial ter em mente a importância de um trabalho sério para alcançar os objetivos. Ver que nem tudo é fácil e que o sucesso vem após diversos processos, segundo a gestora de projetos sociais Rayanne Oliveira, é um dos pensamentos relevantes quando se trata de inspirar estudantes. 
 
Para ela, o Crie o Impossível é importante justamente por isso: mostra que também é preciso colocar a mão na massa. Segundo Rayanne, é necessário sempre pensar além de só inspirar os jovens: é fundamental que eles tenham boas ferramentas para alcançar seus objetivos. 
 
“Dando essas ferramentas, é possível mostrar que os jovens são capazes. As pessoas podem mudar o mundo, de verdade”, diz ela. 
 
E, para ajudar o mundo, a participação dos responsáveis pelos adolescentes e dos educadores também é muito importante. Para a CEO da ONG Embaixadores da Educação, Guilhermina Abreu, é de suma importância que professores e diretores das escolas públicas se engajem e promovam a transmissão do evento nas escolas onde atuam – o que, muitas vezes, passa a ser outro desafio. “É essencial que os diretores inscrevam as suas escolas, pois os alunos ganham muito”, frisa ela. 
 
Nas três edições anteriores, o Crie o Impossível alcançou 50 mil alunos de escolas públicas, de 3.000 cidades de todo o Brasil. A edição remota de 2020 teve 170 mil acessos.