O ator, humorista e escritor Gregório Duvivier publicou em suas redes sociais um protesto contra a anulação de uma prova do Colégio Loyola, de Belo Horizonte, que usou um texto de sua autoria para formular uma das questões do teste.
Diante das reclamações de algumas famílias de estudantes sobre a posição política do texto e de seu autor, a escola decidiu anular a prova.
No Instagram, Duvivier publicou o seguinte texto:
"O Colégio Loyola em BH usou um texto meu numa prova e um grupo de pais de direita conseguiu cancelar a prova. Sinto muito pelos professores e alunos da escola. Dia 1 estou indo a BH, se quiserem encontrar para debater a crônica e a censura", escreveu.
Gregório Duvivier estará em BH nos dias 1º e 2 de novembro para apesentar seu espetáculo "Sísifo", no Teatro Sesiminas. As apresentações serão realizadas na sexta-feira, às 21h, e no sábado, às 20h. Os ingressos custam R$ 70 e R$ 35 (meia-entrada).
Entenda a polêmica
Na semana passada, os alunos do 2º ano do Ensino Médio fizeram uma prova de Língua Portuguesa, em que algumas questões foram baseadas em uma crônica de Gregório Duvivier, em que o autor critica algumas ações do governo do presidente Jair Bolsonaro, como o afrouxamento das políticas de proteção às populações indígenas e quilombolas; a liberação de agrotóxicos considerados perigosos por muitos países; a contestação de dados científicos sobre o desmatamento na Amazônia; entre outras.
As questões formuladas pela professora tinham foco na gramática e na estrutura de texto.
A direção do Colégio Loyola explica, no entanto, que não houve censura. "O Colégio Loyola trabalha com formação integral dos alunos e para tal, precisamos cuidar de todos os lados da informação", afirma o diretor acadêmico Carlos Freitas. "A prova em questão tinha apenas um lado", diz o diretor.
Freitas diz que as provas são elaboradas pelos professores com total liberdade, mas existe um regulamento feito pelo próprio colegiado em 2018, que cuida da abordagem de "temas transversais", que evolvem política, meio ambiente, ética, saúde, etc. "Sempre que esses temas transversais são abordados, os professores têm de dar os dois lados", explica Freitas. "A prova teria de ter um outro texto com o outro lado e não tinha. Fim de ano é uma correria e a questão passou batida tanto pela professora que fez a prova quanto pelo assessor que a revisou", diz o diretor.
Segundo Freitas, os alunos farão uma nova prova e, para não prejudicar quem foi bem no primeiro teste, valerá a nota mais alta.
Nota de repúdio
Nesta quinta-feira (10), um documento com 410 assinaturas foi entregue ao Colégio Loyola para contestar a decisão de anular a prova. O diretor Carlos Freitas diz que a direção "aplaude" a iniciativa de outras famílias da instituição de escreverem esse manifesto.
"Isso é o retrato do que queremos dos nossos alunos, que eles se posicionem. Recebemos inclusive os membros do grêmio estudantil e tudo isso foi explicado e resolvido", afirma Freitas.
O manifesto enviado à instituição de ensino critica o conservadorismo e repudia a censura à liberdade de expressão e à pluralidade de ideias.
“Algumas famílias da comunidade Loyola parecem ver na pluralidade uma ameaça à qualidade de ensino, tão prezada pela instituição, e aos valores pessoais dos alunos, aparentemente frágeis e manipuláveis", diz a nota de repúdio. "Esse tipo de pensamento, retrógrado e conservador, foi uma alavanca para o episódio que ocorreu no começo da semana”, prossegue o documento, que defende a liberdade dos professores e a pluralidade.
“Urge destacar que a diversidade de ideias, tão cara ao Colégio, é característica fundamental do Estado Democrático de Direito, e, portanto, deve ser defendida. Nós ressaltamos o nosso compromisso com a pluralidade de ensino, com a autonomia dos professores. Dessa forma, repudiamos os ataques direcionados ao corpo docente do Colégio, assim como a propagação de informações equivocadas a respeito do ocorrido. Contestamos, também, o posicionamento adotado pelo Colégio ao anular a avaliação e, assim, ameaçar a autonomia dos professores em sala de aula", diz a nota.
Na carta, os alunos e familiares afirmam que a questão estava de acordo com o conteúdo trabalhado durante o ano letivo em sala de aula. “O texto apresentado ia de acordo às diretrizes da disciplina de Língua Portuguesa, que, ao longo de todo o ano letivo, trabalhou, em sala de aula, os diferentes gêneros textuais, como artigos de opinião, crônicas e resenhas. No terceiro trimestre, inclusive, as aulas foram destinadas aos textos humorísticos e aos recursos utilizados pelos autores para o desenvolvimento do humor. Ademais, é importante destacar que, das quatro questões referentes ao texto, uma é relacionada à colocação pronominal, e as outras três à estrutura característica dos textos de humor. Portanto, nenhuma das questões da avaliação exige posicionamento político dos alunos. Não há teor ideológico em nenhum dos exercícios propostos”, atesta o documento.
Reportagem atualizada às 14h30.