Teatro

Grupo Batatas e Carambolas estreia “Não É Nada Disso”

Espetáculo tem como referência o conto “A Terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa

Por Carlos Andrei Siquara
Publicado em 21 de março de 2019 | 17:15
 
 
 
normal

A decisão de um pai deixar a família, partindo sozinho em uma canoa, é narrada por um dos seus filhos logo no início do conto “A Terceira Margem do Rio”, do escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967). Essa ficção é revisitada na peça “Não É Nada Disso”, que estreia neste sábado (23) e permanece em cartaz apenas até domingo (24) no Galpão Cine Horto.

Com dramaturgia de Cesar Macedo e direção de Lucas Emanuel, o espetáculo, a ser apresentado pelo Grupo Batatas e Carambola, concentra-se no cotidiano daqueles que ficaram e são afetados pela ausência da figura paterna. 

“Com o tempo, eles começam a apresentar sintomas e consequências desse abandono. O impacto é grande em relação à fala, e o assunto fica entre aquilo que não é dito. Por conta disso, eles começam a parar de dialogar entre si. A mãe, inclusive, revela dificuldades para pensar. Então, há esses reflexos dos problemas causados por essa ausência na própria linguagem”, comenta Macedo. 

Enquanto os silêncios perpetuam entre os membros da família, a peça, assim como o narrativa de Rosa, é estruturada a partir das memórias do filho, que é quem, agora, vê-se na necessidade de assumir o papel antes exercido pelo pai.

Imerso em suas próprias lembranças, o personagem chega a duvidar da própria sanidade, o que gera ambiguidade e, no palco, é abordado por meio da maneira como ele mantém contato com um conjunto de vozes. 

“Essas, no espetáculo, são representadas pelas próprias pessoas da plateia. Ele não assume uma comunicação direta com a família, mas mantém a relação com essas vozes, que não deixam de funcionar como uma espécie de fuga, que permeia a loucura”, completa o diretor. 

Por meio dos flashes de memórias, diversos conflitos vão surgindo. Além dessa necessidade de o filho assumir-se como esteio da família, surge também o drama da irmã que encara a situação de também ter de encarar a criação do filho sozinha, como se um ciclo de relações interrompidas se projetasse repetidamente sobre aquele lar.

Macedo observa que a peça também buscou traçar paralelos entre essa condição dos personagens e a de muitas outras famílias brasileiras. 

“Nós notamos que essa, entre outras questões ligadas a essa história, estão muito presentes na estrutura da família brasileira. Então, nós procuramos ampliar o olhar e construir uma série de características que se repetem para que essas comparações fossem possíveis. Nós também fizemos um trabalho corporal interessante, que projeta essa dificuldade de diálogo. Os atores quase não se tocam, mais uma vez reforçando essa limitação da fala”, acrescenta o diretor. 

Adaptação 

Para encenar essa história, o grupo optou por uma dramaturgia contemporânea, que, de acordo com Macedo, compreende as referências ao tempo e ao espaço como instâncias fluidas. 

“Não ficam muito nítidas as categorias de tempo e de espaço, mas nós compreendemos isso no decorrer da narrativa. Nós, primeiro, procuramos reconhecer as unidades do texto para depois pensarmos quais imagens poderiam ser transformadas em cenas. Então, por fim, nós chegamos a esse olhar para a história de uma família que está em ruínas, depois que o pai desaparece, e nesse gesto de recontar essa trajetória, a partir das memórias, nada está garantido. Esse olhar pode, inclusive, negar a própria história dessa família”, diz o diretor.

Serviço. Grupo Batatas e Carambolas estreia “Não É Nada Disso” sábado (23), às 21, e permanece em cartaz até domingo (24), às 19h, no Galpão Cine Horto (rua Pitangui, 3613, bairro Horto). Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia) disponíveis no site Sympla.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!