A pandemia do novo coronavírus chegou como um turbilhão na vida de todos e o mundo inteiro mudou em velocidade recorde. Mas se tem uma coisa que a coreógrafa e diretora do grupo mineiro Primeiro Ato, Suely Machado, conhece bem é sobre o termo instabilidade. Em 2014, Suely, em uma espécie de premonição, criou o espetáculo "InstHabilidade, Estado Permanente". O que a bailarina não sabia é que seis anos depois o projeto faria tanto ou mais sentido do que naquela época.
“Nada tem sido mais atual do que estar instável, aliás, quando você tira o pé do chão já está diante da instabilidade, mas não nos damos conta disso. Acho que agora mais do que nunca estamos exercendo a capacidade de cair e levantar a todo instante, de estar vulnerável", explica a diretora da companhia, que se prepara para apresentar mais uma vez o espetáculo no próximo domingo (20), às 20h, durante a programação online do Festival Arte como Respiro promovido pelo Instituto Itaú Cultural.
Na época em que foi criado, o espetáculo foi pensando sem adereços ou cenografias, eram apenas três cadeiras e oito bailarinos em movimentos bruscos, intensos, correndo muito pelo palco e dialogando com a trilha, que misturava músicas lusitanas, espanholas e alemãs. Mas agora, com cada bailarino em sua casa, o espetáculo precisou se readaptar aos limites de espaço, tato e contato de uma tela. Mas Suely garante que o recado é o mesmo: forte, duro, mas com momentos de puro lirismo.
"Trabalhamos em tempo recorde, em uma semana adaptamos os momentos em grupos para que se transformassem em solos. Tudo por reuniões online, porque cada bailarino estava em uma cidade, desde gente em Portugal e França até eu, que estava em Brumadinho. E o interessante é que não é o mesmo espetáculo, porque o momento de isolamento nos permitiu revisitá-lo de um outra forma, criamos outra instabilidade", conta a diretora, que admite a dificuldade de se criar para uma câmera.
"Não ter o olhar do público é diferente, porque arte é doação, então precisamos entender os movimentos das câmeras, os ângulos que podem ajudar em um detalhe de pé, mão ou olho. Não muda só a estética, mas a linguagem e conteúdo também, é uma amplitude maior na hora de criar, o que não deixa de ser um desafio de passar a intenção de um movimento em um quadradinho de tela", afirma.
Projetos
Em 38 anos de história, o grupo se prepara para inovar mais uma vez. Assim como em mais de seus 20 espetáculo, Suely não deixou de perceber as transformações do grupo, ao mesmo tempo em que observa o contexto em que vive. Previsto para estrear no próximo ano, a companhia já começou o processo de pesquisa para o próximo espetáculo, "Um Oceano entre Nós", que terá duas versões: uma presencial e outra online.
"A cabeça não para, eu não sei o que vai acontecer daqui para a frente, depois eu descubro, mas vamos nos adiantando. Se puder ter presencial vai ser maravilhoso, mas, se não, já vamos ter uma versão um vídeo. Por enquanto, todos continuamos em casa e estamos pesquisando poemas que queremos inserir durante o espetáculo", adianta a diretora da companhia.
Programação "Festival Arte como Respiro"
A partir desta quarta-feira (16) até o próximo domingo (20) de setembro, o site do Itaú Cultural volta a ser palco para a programação cênica do Festival Arte como Respiro, levando ao público mais um recorte dos contemplados na série de editais de emergência realizados pela instituição para apoiar artistas impactados pela suspensão das atividades culturais durante a pandemia do covid-19. Desta vez, 28 artistas de 12 estados apresentarão 34 espetáculos de dança, teatro e circo para adultos e crianças, que ficam disponíveis por 24 horas para serem assistidos virtualmente.
Ao longo do mês, o festival conta, ainda, com apresentação de contemplados de Música, do dia 23 ao 27, e de Artes Visuais, que entram no site do Itaú Cultural. As reflexões sobre as consequências físicas e emocionais do atual momento de pandemia, assim como questões raciais e sociais, continuam em pauta nos espetáculos para adultos nesta nova série de apresentações.
Com sessões em todos os dias da programação às 20h, este segundo recorte de espetáculos do mês também aborda memórias e lança o olhar ao ambiente externo, tendo a dança como linguagem predominante. Nas sessões infantis, que acontecem no sábado e domingo, às 15h, o circo é quem dá o tom da temporada, marcando presença com apresentações de números tradicionais.