Quando João Bosco e a Orquestra Ouro Preto se reuniram para gravar “Gênesis”, em outubro do ano passado, algo para além da música foi revelado. Entre uma canção e outra, entre uma batida de violão e o movimento ligeiro e coordenado do maestro, o que saía dali era pura utopia. João Bosco explica: “Estamos falando do Brasil de forma sonhadora, positiva. Estamos em busca de uma nação que os brasileiros merecem viver com dignidade, sabendo que amanhã será melhor. Tudo isso é ‘Gênesis’, esse trabalho repercute isso”.
Neste fim de semana, o cantor, compositor e violonista e a Orquestra Ouro Preto lançam o CD e o DVD em dois concertos – um em Belo Horizonte, neste sábado (7), e no dia seguinte em Ouro Branco (detalhes no fim da matéria). Além das edições físicas, “Gênesis” também chegará às plataformas digitais nesta sexta-feira (6).
As releituras orquestrais ganharam arranjos assinados pelo maestro Nelson Ayres e regidos pelo maestro da Orquestra, Rodrigo Toffolo. Acompanham João Bosco o baixista Guto Wirti e o baterista Kiko Freitas. O flerte artístico com a Orquestra Ouro Preto inicialmente toca em uma relação sentimental profunda. Mineiro de Ponte Nova, João Bosco morou na cidade, berço da companhia, por 11 anos, onde formou-se engenheiro. “Gênesis”, como o próprio título sugere, é um nascer de novo, um recomeçar, voltar no tempo com a memória e com tudo aquilo que ela registrou ao longo das últimas décadas.
Segundo João Bosco, o público verá um repertório perseverante que insiste em continuar traduzindo o Brasil e que consegue se movimentar para ser agora resgatado com outra abordagem. Para João, “isso é uma metáfora da música brasileira, que está sempre sendo retomada”. “É importante a minha relação com a Orquestra porque ela provoca novas situações para essas canções, assim como os arranjos do Nelson. Esse encontro revolve o tempo de uma maneira especial e isso é que é bonito, e vai se misturando dentro do disco”, observa o cantor.
“Gênesis” traz jóias da música popular brasileira. “Quando o Amor Acontece”, “Incompatibilidade de Gênios”, “Papel Machê”, “O Bêbado e a Equilibrista”, “Bala com Bala” e “De Frente pro Crime” são algumas delas. Antes de interpretar “Corsário”, João evoca os versos do russo Vladimir Maiakóvski (1893-1930) e seu poema “E Então, Que Quereis?”.
No texto de divulgação enviado à imprensa, Rodrigo Toffolo também falou sobre a tabelinha da Orquestra Ouro Preto com o compositor. Toffolo celebra João Bosco, “a orquestra de um homem só” que, como violonista, “faz flutuar melodias com espantosa destreza, produzindo agudos e graves em notas que se multiplicam, numa rítmica muito particular”. O maestro, então, resume: “Em outras palavras, a arte de João Bosco é perfeita”.
O cenário do show é assinado pelo artista plástico ouro-pretano Jorge dos Anjos, cujas obras encontram as formas geométricas e referências afro-brasileiras também presentes nas canções de João Bosco.
Com Aldir Blanc sempre ao lado
João Bosco atendeu o telefonema da reportagem na tarde nublada de quarta-feira, 4 de maio, data em que a morte do compositor Aldir Blanc, seu grande e eterno parceiro, completou dois anos. Aldir foi uma das mais de 660 mil vítimas da Covid-19. A data, evidentemente, veio à cabeça do violonista nesta quarta. No Instagram, João compartilhou uma foto com o poeta e escreveu: “Dois anos de uma eterna saudade”.
“Gênesis”, naturalmente, é também um tributo a Aldir Blanc: Toda vez que eu canto uma canção nossa é uma homenagem que faço a ele, não tem como ser diferente. Se eu continuo vivo cantando as nossas canções é uma extensão da voz dele também. Eu disse isso logo quando ele faleceu”, comenta o músico. João e Aldir, que mesmo separados estavam juntos, são responsáveis por clássicos como “Angra”, “Agnus Sei”, “Bala com Bala”, “Dois Pra Lá, Dois Pra Cá” e “O Bêbado e a Equilibrista”.
Retomada com cautela
Embora os índices mostrem que a pandemia está um pouco mais controlada, e isso acontece graças ao avanço da vacinação no país, João Bosco se recusa a falar da Covid-19 como se ela já fizesse parte do passado. Ele prega cautela. Com a retomada dos shows, o cantor tem se apresentado aqui e ali em diferentes estados do país. A volta aos palcos, ele salienta, “é lenta, mas progressiva”. O compositor está sempre atento. “Ainda temos cuidados a tomar, o vírus existe, estamos assistindo lockdown na China, na Europa. Parece que tudo isso é passado, mas não é”, pontua.
João Bosco não sabe como vai se lembrar desses tempos pandêmicos: “Ainda estou vivendo esse presente, recentemente eu tive Covid, muitas pessoas que conheço também, mas graças às vacinas conseguimos superar. Mas a pandemia não passa assim, ela deixa sequelas e estamos trabalhando para curar essas marcas”.
Contudo, tal qual sua música, João Bosco se veste de esperança e coragem. Apesar de ver um Brasil no escuro, em desconstrução e sem trajetória que indique um futuro, o mineiro de Ponte Nova recorre a uma frase do amigo e parceiro Waly Salomão: “Fugir, só se for pra frente”. Ou, como diz o ditado, “lanterna na boca e facão na proa”. Nesse sentido, “Gênesis” ilumina a utopia de um Brasil que dança na corda bamba de sombrinha, meio bêbado, meio equilibrista.
Programe-se
O quê: Lançamento do CD e DVD “João Bosco e Orquestra Ouro Preto: Gênesis”
Quando: Sábado (7), às 21h, no Grande Teatro do Sesc Palladium (rua Rio de Janeiro, 1.046 - Centro); domingo (8), às 18h, na Praça de Eventos de Ouro Branco (rua Juscelino Coelho - Centro)
Ingressos: Últimos ingressos disponíveis a R$ 80 (inteira) e R$ 40 (meia-entrada) para o concerto em BH (as entradas podem ser adquiridas pelo Sympla); em Ouro Branco a entrada é gratuita
Informações: www.orquestraouropreto.com.br