Viagem no tempo

Johnny Hooker lança DVD, disco ao vivo e relembra aquela noite de abril de 2016

Cantor pernambucano fala sobre 'Macumba Ao Vivo em Recife' e diz que novo álbum deve sair ainda neste ano

Por Bruno Mateus
Publicado em 07 de maio de 2021 | 07:04
 
 
 
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Vinte e dois de abril de 2016. Antes de entrar no palco do Baile Perfumado, casa de shows em Recife, Johnny Hooker andava de um lado para o outro e, tal qual uma criança ansiosa esperando os convidados para seu aniversário na hora marcada, se perguntava: “Será que vai dar certo?”. O álbum “Eu Vou Fazer uma Macumba pra Te Amarrar, Maldito”, lançado no ano anterior, fazia muito sucesso. Johnny ganhou prêmios e tinha música em novela da Globo. Não era, entretanto, apenas mais um show. Mesmo sem patrocinador, o cantor e compositor recifense topou o desafio de lotar a casa de espetáculos para gravar um DVD. Hoje ele admira sua coragem, mas naquela noite tudo era um mar de incertezas.  

O projeto independente precisava do dinheiro da bilheteria. Johnny Hooker sentia um misto de emoções. Até que a produtora Érica Colaço o acalmou. Ele faria um show para uma plateia lotada. Quatro mil pessoas esperavam os primeiros acordes. “Nesse momento senti certa anestesia, uma adrenalina imensa, não dá para pensar muito. Ainda tinha um show inteiro para fazer. E deu tudo certo, foi lindo”, conta Johnny, 33, em conversa com o Magazine. “Quando tudo acabou, cheguei em casa, abracei a Érica, e a gente chorou muito. Conseguimos. Parece que tínhamos corrido uma maratona”, recorda.

Cinco anos após a gravação, o registro agora vem a público. Nesta sexta-feira (7), o DVD “Macumba Ao Vivo em Recife” chega em formato audiovisual ao YouTube. A apresentação conta com versões das canções de “Eu Vou Fazer uma Macumba pra Te Amarrar, Maldito”, como “Alma Sebosa”, “Amor Marginal”, “Volta”, “Segunda Chance”, “Boato” e a faixa-título. O hiato entre a gravação e o lançamento se justifica. Com o álbum “Coração”, de 2017, Johnny Hooker se consolidou como um dos artistas mais talentosos surgidos na última década no Brasil.

Ele fez turnês na Europa, passando por Portugal, Inglaterra, Alemanha, Irlanda e Espanha, rodou os quatro cantos do país com uma intensa agenda de shows, e um trabalho foi entrando na frente do outro.  

Quando o mundo parou com a pandemia, era hora de finalizar o projeto. O intervalo serviu para que a equipe visse que ali tinha um disco ao vivo, que também chega nesta sexta às plataformas digitais. “Foi legal descobrir que a captação de áudio tinha sido tão bacana que tínhamos um disco ao vivo”, comenta o compositor. Além das composições autorais, o registro traz parcerias em “Garçom”, com o conterrâneo Otto, “Menti pra Você”, tabelinha com Karina Buhr, e “Álcool”, música em que ele divide os vocais com a pernambucana Isaar. “Acabou que todas essas participações geraram materiais inéditos”, ressalta o cantor. 

Fafá de Belém também está entre as convidadas. Em “Abandonada”, teaser lançado há dois meses para divulgar o projeto, Johnny e a cantora, que gravou “Volta” em 2015, se derramam em uma interpretação que resume bem o que é esse DVD: “Tem essa coisa passional, chegar a beirar o kitsch, meio almodovariana. Quis chamar a Fafá para retribuir o carinho, chamando-a para fazer parte do meu universo”.

Viagem no tempo

Voltar a 2016 foi uma experiência incrível para Johnny Hooker. Ele se orgulha da “coragem punk-rock” de levar a empreitada adiante naquela ocasião. De lá pra cá, esteticamente heterogêneo e misturando glam rock, sofrência, pop, política, deboche e amor, ele conquistou um público fiel e celebrou um Brasil diverso, que ama sua cultura e suas raízes. “Acima de tudo, estou extremamente grato, e receber o carinho do público que criei me dá um gás para continuar no meio dessa tragédia toda”, ele pontua.

Ao falar sobre o intervalo de cinco anos e fazer um paralelo entre as mudanças políticas e sociais ocorridas nesse período, Johnny Hooker é só lamento e angústia. A despeito da alegria com o lançamento de “Macumba Ao Vivo em Recife”, o compositor diz que vê um Brasil envolto em uma nuvem de escuridão, retrocesso, intolerância e ódio coletivo. “Vejo um país ladeira abaixo. Todos os demônios saíram dos buracos, as elites brasileiras são perversas”, declara.

Johnny fala de um Brasil que não se confrontou com seu passado, que não julgou os crimes cometidos pela ditadura militar e não reparou séculos de escravidão. E isso, em um país que não se olha no espelho, traz sérias consequências: “O presidente homenageou um torturador da ditadura, é um absurdo. Não vejo muito futuro agora neste exato momento. O que vejo é um país que virou um espectro, um fantasma do que ele já foi e do que poderia ter sido”.

Cantor prepara novo disco

Johnny Hooker deve lançar seu terceiro disco de inéditas ainda neste ano. O álbum é inspirado no livro “Orgia: Diários de Tulio Carella”, que conta as aventuras do dramaturgo argentino Tulio Carella (1919-1972) em Recife dos anos 1960. A obra se tornou um clássico da cultura LGBTQIA+. Durante a pandemia, o artista montou um estúdio em sua casa, em São Paulo, onde mora desde 2017, para gravar o que faltava. O processo, que começou no início de 2020, está por terminar. “Já está bem adiantado, praticamente tudo pronto, espero mandar para a mixagem no mês que vem”, ele conta.

Enquanto o isolamento se mantém na rotina dos brasileiros, Johnny espera voltar a fazer shows menores, aos poucos, no primeiro trimestre de 2022. Até lá, fica a saudade dos palcos. “Não vejo a hora. O palco sempre foi muito importante para mim. É como se fosse um grande feitiço, um grande ritual”, afirma.  

DVD e disco

Gravado em abril de 2016, o DVD “Macumba Ao Vivo em Recife” tem 16 faixas e já está disponível no canal de Johnny Hooker no YouTube. O álbum, primeiro registro ao vivo do cantor recifense, tem 20 músicas e também chegou nesta sexta-feira (7) às plataformas digitais do compositor.

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