Tenho uma família de circo”, define o cineasta Andrucha Waddington. Em seu novo filme, “O Juízo”, parte dela está reunida no picadeiro. O longa de suspense tem roteiro de sua mulher, Fernanda Torres, e elenco que reúne a sogra, Fernanda Montenegro, e o filho, Joaquim Torres Waddington.
Apesar de estar em família, Waddington afirma que, no set, era apenas um diretor trabalhando com profissionais, mesmo vendo ali, em posição privilegiada, o filho em sua estreia no cinema. “Foi como dirigir qualquer outro ator com quem firmo uma parceria no set. Tento trazer o melhor do ator, sendo ele da família ou não”, conta o diretor ao Magazine.
Para Waddington, o que fez diferença no set foi a presença do rapper Criolo. “Ele é um ator fenomenal e esse foi o primeiro papel grande dele. Criolo deu signos e profundidade para o Couraça”, diz.
O filme acompanha o tormento de um homem ao mergulhar em seu passado. Augusto (Felipe Camargo) leva a mulher Tereza (Carol Castro) e o filho Marinho (Joaquim Torres Waddington) para a propriedade de sua família, uma fazenda na rota do café. No passado, o casarão foi palco de um episódio trágico, em que Couraça, um homem em busca de liberdade, é traído e morto ao lado de sua filha. “Essa fazenda passa a ter uma dívida com esse cara, que fica esperando gerações para saldá-la”, comenta o diretor.
Quando chega à fazenda, guiado por uma história que seu pai lhe contava sobre diamantes que “brotavam” naquelas terras, Augusto começa a beber e ter alucinações com Couraça. Em meio ao seu delírio, ele começa a desenterrar o passado. Enquanto isso, a família toda sente a pressão das histórias guardadas entre as paredes da propriedade. Assim como em “O Iluminado” (1980), suspense de Stanley Kubrick inspirado na obra de Stephen King, a construção é ponto central na trama e envolve o protagonista em seu surto.
“A casa é um personagem”, atesta Waddington. “Visitamos algumas fazendas entre São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro e, quando chegamos nesta propriedade em Barra do Piraí – no Rio, quase na divisa com Minas –, não saímos mais de lá”.
Espiritismo
“O Juízo” trabalha bem essa linha entre a fé e a razão, colocando a questão não somente para os personagens, mas também para o público. O espectador pode ter uma leitura completamente cética em relação ao comportamento de Augusto, explicando os fenômenos todos como parte de um surto, fruto de uma esquizofrenia.
Outra leitura possível é altamente espiritual, com a possessão de Augusto por Couraça. Nos momentos em que Augusto luta contra essa manipulação espiritual, ele foca em pessoas antigas da cidade – na pele de Fernanda Montenegro e Lima Duarte – que guardam fragmentos da história de sua família. A razão está presente na figura do doutor Lauro (Fernando Eiras), psiquiatra que tenta ajudar Augusto.
No fim, não há interpretação certa ou errada. Para Waddington, “cabe ao público tomar sua decisão”.