Dê o play em “Por Quê”, primeira faixa do disco de estreia da belo-horizontina Kaust (mastigar, em alemão), lançado no Spotify em meados de abril. A história dos 30 minutos que preenchem o álbum homônimo começa a ser contada a partir do início de 2018, dois anos após a formação do grupo e meses depois do EP “Insana Inocência”.
Naquele período, o grupo reuniu novas composições. No meio do caminho, houve uma troca de integrantes – atualmente, o quarteto é formado por Dennis Martins (baixo), Emerson Fluyd (guitarra, voz, teclados e piano), Yuki Castro (bateria) e Adriano Bê (guitarra e voz). No fim daquele ano, os músicos decidiram que haviam chegado a uma boa quantidade de temas.
“Começamos a ver que as músicas estavam mudando, mas faltava alguma coisa para que elas dialogassem”, diz Emerson Fluyd. A chegada do produtor Luccones Nascimento fez grande diferença no resultado final, em detalhes minuciosos das músicas e na escolha das sete faixas que compõem o álbum, inicialmente trabalhado com um leque de 14 canções.
“Queríamos um álbum coeso, ensaiamos três ou quatro meses, depois decidimos por nove músicas, mas não batemos o martelo e entramos em pré-produção. Passamos duas semanas ouvindo o disco exaustivamente e ainda tiramos duas. Ficou muita coisa de fora”, comenta o vocalista.
Dentro de uma coerência buscada pela banda, a sonoridade do pós-punk abraça bem o som, ora melancólico e cheio de questionamentos existenciais, ora obscurecido pela fumaça das fábricas da Manchester de Ian Curtis e dos cigarros nos bares que baixavam as portas com o nascer do sol da Brasília de Renato Russo. Ao escutar “Dreams”, “As Horas” e “A Torre” fica fácil perceber as influências de Joy Division, New Order, Legião Urbana e Plebe Rude. “Echo & Bunnymen, Interpol e Ira! também pegam muito a gente”, conta o vocalista. A noventista “Eu Não Consigo Mais Me Divertir” antecede “Lunar”, a mais longa do álbum e a que fecha “Kaust”.
Antes mesmo do disco chegar aos meios digitais, a música “Por Quê?”, em dezembro, foi a escolhida para ter seu videoclipe, com direção do cineasta belo-horizontino Jefferson Assunção e, no início de abril, foi a vez de “Dreams” ganhar um lyric video, assinado por Rodrigo Fusa.
As composições, em português e inglês, surgem de forma natural, não é nada deliberado. “A maioria a gente faz em português mesmo, mas tem música que pede o inglês. É a língua oficial do rock, sempre encaixa muito bem. Colocar português não é tarefa fácil, mas é bom sair da zona de conforto”, destaca Fluyd.
Questionado sobre fazer rock atualmente no Brasil, sobretudo autoral, o músico admite que o estilo não ocupa mais a preferência da maioria das pessoas, mas pondera que se a banda fosse se preocupar com isso não iam mais tocar. Por outro lado, o alento fica por conta da paixão daqueles que carregam o gênero acima de qualquer modismo e a existência dos nichos, com pessoas ainda carentes pelo rock e suas diversas vertentes.
O desafio, segundo ele, é encontrar onde exatamente estão esses espaços: “É preciso dialogar com esses nichos, penetrar em outros estados. Sempre tem um burburinho, uma cena. O lance é focar nisso, sair da bolha, fazer amizades e intercâmbios com outras cidades”.
Quarentena
O lançamento acontece em meio à pandemia do novo coronavírus, que impõe isolamento social e a completa impossibilidade de realização de shows. “Claro que isso fez com que mudássemos os planos. Íamos lançar o álbum em 17 de abril e o show de lançamento seria em 9 de maio. Tivemos que antecipar e nos reestruturar diante dessa situação”, pondera Emerson Fluyd, que adotou o sobrenome em referência ao Pink Floyd, banda referência em sua vida.
O guitarrista diz que a Kaust tem feito uma massiva divulgação do disco pelas redes sociais e o fato de as pessoas estarem recolhidas em casa pode ajudar a banda a conseguir ouvidos atentos por aí. “Por enquanto, vamos dialogando com a galera, e isso pode nos ajudar no futuro, quando as pessoas já terão digerido do disco”, acredita.