Crítica

Primeiro episódio de 'Watchmen', na HBO, tem chuva de lula e boas sacadas

Quem vigia os vigilantes? Damon Lindelof traz o questionamento já no capítulo de estreia e imagina o mundo após os eventos que encerram a HQ de Alan Moore e Dave Gibbons

Por Etienne Jacintho
Publicado em 21 de outubro de 2019 | 12:24
 
 
 
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Quando um fã da HQ "Watchmen" ouve a palavra "adaptação", já torce o nariz. Devo confessar que minha admiração pelos vigilantes foi maior do que minha cinefilia, no caso do longa-metragem assinado por  Zack Snyder em 2009. Não vi até hoje por medo de estragar a memória que tenho dos personagens. 

Ao ouvir falar sobre uma série inspirada nos quadrinhos de Alan Moore e Dave Gibbons, paralisei. Com o passar do tempo e com as notícias sobre a produção, o medo se transformou em curiosidade. Afinal, a série teria a grife da HBO - que quase nunca erra - e roteiro de Damon Lindelof. 

Na época em que estava tocando "Lost" com J.J. Abrams, Lindelof deixava claro, em qualquer entrevista, seu lado fanático por HQs. Ouvindo ou lendo suas palavras, dava para sacar o interesse e conhecimento dele sobre cultura nerd e pop. E vamos combinar que não dá para ignorar o poder de "Lost" só porque seu desfecho não foi assim tão incrível. "Lost" é uma série potente.

Ou seja, HBO e Damon Lindelof já bastariam para me levar a ver, sem muita desconfiança um projeto audiovisual de "Watchmen". Daí vieram os nomes dos atores envolvidos: Regina King e Jeremy Irons. Como não ver qualquer coisa que envolvendo essa dupla? Regina é maravilhosa, intensa, dramática. E Irons dispensa qualquer comentário. 

Foi com a expectativa lá em cima que assisti ao primeiro episódio domingo (20) na HBO GO. Demorei para me localizar, com os fatos acontecendo no passado e no presente. Depois percebi que, a minha confusão vinha da necessidade de conectar aqueles personagens com a HQ. Quando me esqueci disso, consegui entrar na história e, a partir daí, cada detalhe que Lindelof usou para colocar sua trama no contexto de "Watchmen" foi como uma cereja no bolo. 

O sabor veio mais forte com a cena da chuva de lulas, que serve para localizar o espectador dentro do universo que Lindelof criou. Explico: A HQ é ambientada num mundo polarizado e uma lula gigante é usada como artifício para unir todas as pessoas contra esse inimigo em comum. Depois de a lula matar milhões de cidadãos, as pessoas esquecem suas diferenças ideológicas para combater a fera. 

Isso era lá nos anos 80. Lindelof transporta sua história para os dias de hoje e usa o nazismo e o fascismo como mote para a polarização no planeta. Em "Watchmen", policiais andam mascarados para combater supremacistas raciais que caçam negros e pessoas contrárias às suas ideias. Os vilões se escondem atrás de máscaras de Rorschach, personagem dos quadrinhos com ideias fascistas. 

No universo de Lindelof, uma chuva de lulas já é algo comum. O portal de dimensões paralelas está aberto e o mundo se protege sendo analógico. O futuro em "Watchmen" não é conectado. 

O bacana da HQ de Moore e Gibbons é o caráter de seus mascarados que podem ser encarados como heróis, anti-heróis ou até vilões. O universo caótico em que os vigilantes estão inseridos os tornam sobreviventes e fonte de esperança - já que as pessoas vivem em um mundo hostil. Lindelof tamém cria seus personagens dessa forma. Seu heróis cometem atos que o espectador desaprova. Afinal, os fins justificam os meios? E, mais importante, Lindelof traz, já em seu primeiro episódio, o questionamento presente na HQ: "Quem vigia os vigilantes?" 

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