Dois mil e dezenove foi um ano que impôs sentimentos antagônicos à cantora e compositora Tiê. Ao lançar um breve olhar sobre os últimos 12 meses, ela vê motivos para comemorar, mas também para “chorar sozinha muitas vezes”. A celebração fica por conta de “Dix”, disco ao vivo que marcou os festejos de uma década de carreira da paulistana. O álbum revisional, que ganhou edição em DVD, levou Tiê em turnê por alguns Estados brasileiros e apresentou um apanhado de releituras e três canções inéditas.
“Quis fechar um ciclo, fazer uma análise não só da minha carreira, mas também da minha vida. Vejo esse projeto como uma celebração, não é só um disco de releituras”, afirma a cantora, que surgiu em 2009 com o elogiado “Sweet Jardim” e, cinco anos depois, transformou a canção “A Noite”, tema da novela global “I Love Paraisópolis”, em música-chiclete.
Embora admita que 2019 tenha sido um bom ano no lado profissional, Tiê afirma que é impossível ficar alheia aos movimentos políticos e sociais que têm estremecido o mundo inteiro. Ela diz que procura ter gratidão pelas coisas boas que viveu, mas isso não impede que ela também sofra com as notícias – “uma pior que a outra” – que pipocam por aí. E quando fala dos acontecimentos no nosso país, a cantora classifica como “desesperador” o período pelo qual passamos.
“São muitos fatos de um governo mal-educado. Sabíamos que seria ruim, mas é muito pior do que imaginávamos, e isso torna a situação mais assustadora”, ela avalia. “É tão triste, parece o apocalipse. Sinto uma melancolia permanente”, lamenta a artista.
Composições
Embora reconheça não saber onde buscar esperança, a resposta, talvez até de maneira inconsciente, veio em forma de canção. Em dezembro passado, Tiê compôs canções que transmitem essa sensação de medo e fé e refletem esse momento introspectivo em que ela desabava em um choro dia sim, dia não.
“São oito músicas que se comunicam, são bem parecidas, e isso aconteceu pela primeira vez comigo. Elas contam uma história que ainda estou tentando entender. Meu momento é minha visão, e passei isso para o papel”, diz a compositora. Segundo ela, é hora de colocar cabeça e coração para trabalharem juntos e, “quem sabe, lançar esse projeto em breve”. Entre nocautes e vitórias, o mundo segue girando e Tiê diz que o trabalho continua: “Afinal, tenho de pagar as contas”.
Liberdade
Tiê conta que, após passar uns dias com a família em Florianópolis, onde o irmão mora, ela vai dar uma desacelerada de turnês e investir em shows no formato voz e violão em bares de São Paulo. “É bom mudar os rumos, conhecer gente nova e ver se dessa troca sai a esperança”, comenta a cantora.
Transitar por universos musicais distintos é uma marca da compositora paulistana. Entre as parcerias, que vão além do pop e da MPB, ela já fez tabelinhas com David Byrne, Tulipa Ruiz, Jorge Drexler e Toquinho, mas também gravou com o rapper Rael e Luan Santanna. Com o sertanejo, ela gravou a faixa “Duvido”, dos disco “Gaya”, lançado em outubro de 2017: “Eu mesma quis chamar o Luan, ele foi muito gentil. Com o Rael foi a mesma coisa. Quanto mais fora da bolha, mais interessante”.
Para Tiê, sair da bolha também é sinônimo de não deixar que a internet e as redes sociais nos tornem pessoas cínicas e falsas. Tentar achar um equilíbrio na meditação, voltar a fazer trabalhos voluntários, resistir artisticamente e plantar a semente de um novo mundo nas filhas são as armas que ela tem para mudar o que ela considera danoso. “Não podemos desistir, todos têm que fazer o máximo que der”, afirma Tiê, num tom mais confiante.