Há algo de novo na região da Pampulha. Não é novidade que grandes marcas e empreendimentos de alto nível sempre existiram por lá. Mas, tem se observado um fluxo maior de negócios voltados para o público A e B, que inauguraram recentemente uma filial por lá - para captar a classe média alta que não quer ir para a região Centro-Sul em busca de produtos, serviços e lazer. Bares como Tatu Bola e Rei do Pastel Gourmet abriram novas unidades na avenida Fleming e a concessionária Bamaq Great Wall Motors (GWM) investiu R$ 15 milhões na loja da avenida Presidente Antônio Carlos, inaugurada em setembro. É a segunda unidade da marca em BH, após a abertura na avenida Raja Gabáglia em 2023.
“No mercado de luxo, não faz sentido o cliente ir até você para comprar. A Pampulha tem uma alta concentração de pessoas de alta renda, milionários, costumamos dizer que o ‘dinheiro antigo’ de BH está lá. Também são pessoas que gostam de consumir no seu entorno, são fiéis à região. Então, faz todo o sentido investir em uma unidade específica lá”, analisa Marcelo Rohlfs, diretor de operações da divisão automotiva do Grupo Bamaq.
Segundo ele, o ticket médio da venda de carros elétricos e híbridos tem girado em torno de R$ 280 mil na região, com tendência de aumento. “Também nos surpreendemos com os resultados do primeiro mês. Esperávamos vender cerca de 30% do que faturamos na Raja, mas chegamos a 40%. Considerando que ainda estamos no início, é uma resposta bastante positiva da região”, garante.
Localizado no Caiçara, na região Noroeste, o Shopping Del Rey tem passado por uma transformação em seu conceito para atrair um público de maior poder aquisitivo. Assim, eles não precisam ir até os shoppings da zona sul atrás de marcas como Coco Bambu, Madero, Farm e Reserva - que chegaram por lá nos últimos tempos. De acordo com Kátia Andrade, gerente de marketing, o local continua democrático, mas, tem sido ocupado principalmente pelo pessoal das classes A e B.
“Sentimos que foi uma demanda natural do público. Os clientes desejavam acessar as marcas de visibilidade nacional, como Outback, mas sem grandes deslocamentos. Hoje, há uma busca pela praticidade e pela otimização do tempo. Também temos investido mais em experiências, como a exposição do Van Gogh, e algumas grandes marcas já estão engatilhadas para ocupar o shopping no futuro”, diz.
Para Marcelo Silveira, superintendente da Associação dos Lojistas de Shopping Centers de Minas Gerais (AloShopping), a presença de shoppings próximos à região da Pampulha, como Del Rey, Estação e Minas Shopping, estimula melhorias na infraestrutura da área e torna o entorno mais atraente para novos investimentos. “Esse processo pode ainda elevar o valor imobiliário e incentivar o surgimento de novos empreendimentos residenciais e comerciais na região, consolidando o desenvolvimento da área”, diz.
Mercado imobiliário
Com a valorização da Pampulha, muitas empresas também miram no público que deseja morar ou alugar um imóvel em um empreendimento que mistura lojas, serviços, escritórios e apartamentos. Neste mês está prevista a inauguração de um street mall no bairro São José, próximo à avenida Abrahão Caram, que vai mesclar 20 lojas, 48 salas comerciais e 73 apartamentos de um quarto e totalmente mobiliados. O projeto é da incorporadora mineira Vettore e o investimento previsto é de R$ 80 milhões. A empresa já tem outro street mall na região, na avenida Fleming, inaugurado em 2021.
“Sentimos que há uma demanda reprimida por apartamentos compactos para estudantes universitários que chegam de outros estados ou jovens executivos. Há opções mais populares, principalmente nos bairros Liberdade e Ouro Preto, mas faltam opções de moradia para a classe B. Também teremos serviços, como dentista e salão de beleza, e os moradores do entorno não vão precisar se deslocar tanto para resolver suas pendências”, aponta Emmerson Ferreira, arquiteto autor do projeto e diretor-executivo da Vettore.
Para Luís Rezende, diretor da Câmara do Mercado Imobiliário e Sindicato da Habitação de Minas Gerais (CMI/Secovi-MG), o interesse pela região aumentou principalmente após a pandemia. A situação de isolamento fez com que compradores e locatários procurassem por mais qualidade de vida e arborização, características presentes na Pampulha. Ele prevê que as vendas entre janeiro e setembro tenham aumentado 10% em relação ao mesmo período de 2023.
“E ainda há espaço para crescer. Ainda temos muitas áreas onde construir. Tenho percebido que os novos empreendimentos também têm tido mais espaços para lazer e convivência, algo que não se via muito nos prédios mais antigos. É um sinal de que as pessoas querem permanecer por mais tempo onde moram e aproveitar o entorno”, aponta.
No entanto, o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Raphael Lafetá, tem uma visão menos otimista. Para ele, há sim um aquecimento pontual em alguns bairros, como Jaraguá, Castelo e Ouro Preto, mas ainda falta uma maior ocupação do entorno da lagoa da Pampulha.
“Ainda há muitas restrições, o que não favorece o crescimento. Poderia haver o mesmo movimento que acontece na Vila da Serra, em Nova Lima, ou na lagoa Rodrigo de Freitas, onde as pessoas aproveitam a orla. Acho que precisa haver uma revisão do Plano Diretor de Belo Horizonte para incentivar uma melhor ocupação”, opina.
Varejo exclusivo
Entre os empreendimentos que investiram na Pampulha também há uma empresa do setor de supermercados, segmento que o belo-horizontino adora. Chegou por lá, em maio, a rede Sam’s Club, que tem como diferencial a venda de produtos importados, como a The Cheesecake Factory, uma torta congelada americana que só a rede tem no Brasil. Além dos perecíveis, o cliente encontra roupas, eletrodomésticos e utensílios para casa.
Outro diferencial é que, para fazer compras, é necessário pagar uma assinatura anual de R$ 75 para ter acesso ao clube de sócios do supermercado. “Já temos quase 80 mil associados, principalmente das classes A e B. A Pampulha tem se tornado uma região estratégica para nós. Assim como os clientes das outras unidades, nossos clientes da região têm o perfil de gostar de marcas exclusivas e da seleção de produtos que importamos de vários lugares do mundo”, explica a diretora de marketing Claudia Vilhena.
Turismo rentável
A vocação turística também é um dos fatores que ajudam a valorizar a região. Após ganhar o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, em 2016, o Complexo Arquitetônico da Pampulha - que inclui a famosa igrejinha e os museus - tem ajudado a atrair turistas e novos moradores para lá. Quem faz essa análise é Lucas Pitta, vice presidente da da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH).
“Temos acompanhado, nos últimos anos, o processo de revitalização dos equipamentos públicos. Como não temos praia, a lagoa da Pampulha acaba sendo essa referência de ambiente aberto e arejado, o que ajuda a aquecer a região. Mas, esbarramos na questão ambiental. O turista que sente o mau cheiro pode não querer retornar para outra visita”, diz.
Ele também aponta a vocação para eventos esportivos, como as maratonas e a corrida de Stock Car, e os shows e festivais que ocupam o Mineirão. “Mas, tudo isso ainda é muito sazonal. Precisamos fortalecer ainda mais as atrações e atividades na região, para trazer um consumo do comércio e uma ocupação de hotéis ainda mais recorrente”, afirma.