A Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP) pedindo o bloqueio de ao menos R$ 66,4 milhões em bens e recursos da Associação Círculo Nacional de Assistência dos Aposentados e Pensionistas (CINAAP). A entidade é acusada de descontos indevidos em benefícios de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)

O escândalo nacional, conhecido como ‘fraude do INSS’, tomou notoriedade na semana passada com a realização da 'Operação Sem Desconto'. O esquema consistia em descontos irregulares que podem chegar no desvio de mais de R$ 6 bilhões, de acordo com dados preliminares da investigação conduzida pela Polícia Federal (PF), e terminou com a demissão do então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto

Em Minas, a ação foi ajuizada com pedidos de tutela de urgência, nesta segunda-feira (28/4), pelo coordenador da Coordenadoria Estratégica de Tutela Coletiva (Cetuc), o defensor público Paulo Cesar Azevedo de Almeida. 

Apurações do órgão indicam que somente na Justiça, em Minas, já há 625 registros de processos cíveis, além daqueles que tramitam em sigilo, contra a entidade. De acordo com a Defensoria Pública, em todos os casos atendidos, por ora, os aposentados e pensionistas negavam ter contratado qualquer serviço da Cinaap e tampouco ter autorizado a realização dos descontos de mensalidades associativas em seus benefícios previdenciários. 

“Em razão disso, a DPMG já vinha formulando pedidos de declaração de inexistência de negócio jurídico com o CINAAP, suspensão das cobranças indevidas, bem como devolução dos valores em dobro aos lesados e condenação ao pagamento de indenização por danos morais”, informou o órgão.

Em março deste ano, a DPMG oficiou o INSS e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) para apurar indícios de vazamento de dados pessoais e previdenciários de aposentados e pensionistas, além de averiguar a legalidade da prática comercial utilizada pela associação. Em análise dos casos individuais, a Defensoria identificou um padrão de comportamento ilícito dos funcionários da Cinaap no momento da oferta dos serviços às vítimas. 

Ficou configurado, segundo o órgão, uma “evidente ofensa aos deveres de boa-fé objetiva e de prestação de informações adequadas e claras quanto às condições e preços impostos aos consumidores abordados por telefone”, disse a DPMG. A conduta, conforme a ação, viola diretrizes básicas do direito do consumidor, além das regras de uma Instrução Normativa do INSS. 

“Embora a Associação alegue ter havido suposta autorização dos consumidores e consumidoras quanto às cobranças, e que as anuências teriam sido concedidas por meio de contatos telefônicos, os registros dos áudios mostram que os colaboradores do Cinaap apresentavam apenas as vantagens de se ingressar na Associação, omitindo intencionalmente os custos dos serviços e informações sobre a cobrança de mensalidades”, argumentou a Defensoria Pública. 

Além disso, o órgão salientou que a suposta adesão dos beneficiários à associação decorreu de uma simples confirmação de dados pessoais e informações previdenciárias previamente detidas por funcionários da ré. 

Responsabilização

A associação mencionada não consta na relação das associações e sindicatos investigados pela PF e Controladoria-Geral da União (CGU). No entanto, a defensoria argumentou que o há detalhes que demandam uma intervenção do judiciário.

“O volume expressivo de ações judiciais por cobranças indevidas em desfavor de beneficiários do INSS respondidas pela entidade em Minas Gerais, bem como o padrão de comportamento lesivo aos consumidores, que em muito se assemelha ao das entidades já investigadas, são detalhes que invocam a necessidade de intervenção urgente do Poder Judiciário, a fim de coibir práticas abusivas contra pessoas em situação de vulnerabilidade”, sinalizou o órgão. 

A DPMG mencionou também a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e de normas de proteção especial dirigidas à pessoa idosa. Na ação, entre outros pedidos, a Defensoria Pública requer liminarmente: a interrupção imediata dos descontos realizados pela associação nos casos em que não há autorização formalizada pelos aposentados e pensionistas; e o bloqueio de bens móveis, imóveis, e aplicações financeiras em nome da ré de valor não inferior a R$ 66.431.880,00.  

No mérito, a DPMG pediu, ainda, a declaração de inexistência ou nulidade dos negócios jurídicos celebrados pela Cinaap a partir da oferta telefônica e pela mera confirmação de dados pessoais dos consumidores abordados e a interrupção definitiva dos descontos realizados pela ré nessas hipóteses de contratação. 

“A Defensoria Pública pleiteia ainda que a Associação restitua em dobro e atualizados os valores cobrados indevidamente e que seja ela condenada à indenização de danos morais”, finalizou o órgão. A reportagem procurou a Cinaap que, em nota, disponível na íntegra a seguir, informou que não foi notificada na ação até o momento. 

"O CINAAP – CÍRCULO NACIONAL DE ASSISTÊNCIA DOS APOSENTADOS E
PENSIONISTAS, esclarece que ainda não foi citada nesta ação e que no momento oportuno irá analisar todos os termos desta demanda e apresentará sua defesa para elidir todos os pedidos formulados.

Cumpre ainda destacar que esta Associação é voltada para a promoção do bem estar social de seus associados, disponibilizando diversos serviços que permitem o mínimo de conforto a uma parcela da população desassistida por diversos fatores.

Nota-se que a quantidade de processos, refletem um retrato pouco explorado pelas autoridades, pois tratam-se de ações ilegítimas que muitas vezes são promovidas por escritórios de advogado(a)s que se utilizam do poder judiciário para incorrer em advocacia predatória, no qual esta entidade vem obtendo resultados positivos perante os Tribunais do País na demonstração do vínculo legítimo com seus associados.

Importante ressaltar que muitas vezes os associados sequer tem a ciência que está assinando uma procuração para demandar contra uma entidade associativa, e esse fenômeno se tornou exponencial com as primeiras denúncias ocorridas em meados de março e abril do ano de 2024, com a vinculação pela imprensa de que algumas entidades efetivavam descontos não autorizados nos benefícios pagos pelo INSS, acarretando uma enxurrada de ações que visam fomentar a indústria do dano moral.

Nesse cenário, os nossos Tribunais não se quedaram inertes, expedindo resoluções e normativas que visam coibir tal prática, inclusive por muitas vezes observando de ofício, incongruências nos documentos pessoais apresentados pelos supostos autores, determinado em suas decisões a instauração de inquéritos policiais, ofícios ao MP, OAB para apuração de eventuais ilícitos.

Esta entidade foi demasiadamente afetada por estas inúmeras ações, mas vem paulatinamente apresentando as suas contestações com a finalidade de demonstrar que o vínculo associativo é legítimo, conquistando resultados positivos em todos os Tribunais do País, inclusive no Estado de
Minas Gerais.

Por fim, importante frisar que esta entidade não foi citada na recente operação deflagrada pela Polícia Federal, e que sempre trabalhou junto ao INSS para propor uma autorregulação das entidades que possuem Acordo de Cooperação Técnica, e que após a edição da Instrução Normativa PRES/INSS
Nº 162, DE 14 DE MARÇO DE 2024 e a liberação da ferramenta digital pelo “INSS”, 100% (cem por cento) de todos os termos associativos foram assinados dentro do ambiente do sistema “DATAPREV”, com biometria facial que utiliza o banco de dados do Governo Federal, e demais validações exigidas pelo aplicativo “PDMA” (Portal de Desconto de Mensalidade Associativa), portanto, sendo sistema hígido com acesso efetuado somente pelos associados, sem a possibilidade de intervenção de qualquer terceiro.

Certos de que os esclarecimentos foram devidamente prestados nos canais de atendimento da associação, e aguarda um posicionamento. O espaço segue aberto."

Operação

A Operação Sem Desconto, realizada em conjunto pela Polícia Federal e pela CGU, identificou um aumento de 578% nos descontos de mensalidades associativas concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de 2016 para 2024.

De acordo com dados apresentados pelo ministro da CGU, Vinicius de Carvalho, os descontos saltaram de R$ 413 milhões em 2016 para R$ 2,8 bilhões em 2024. "Identificamos que maioria de aposentados de uma amostra não reconhecia que havia autorizado descontos", disse. 

Matéria atualizada em 30/04/2025, às 15h.