Pará. Hilma Vanda Alves de Souza, de 62 anos, deixou a roça no Tocantins aos 12. Aos 18, embarcou em um ônibus rumo a Tucuruí, no Pará. A estadia por lá durou um ano, até que ela decidiu seguir para a cidade das oportunidades: Parauapebas — no sudeste do Pará, sede do complexo minerador de Carajás. A vida de Hilma não foi nada fácil. Há 30 anos, ela perdeu o marido e precisou criar sozinha os três filhos — de 1, 3 e 8 anos. O sonho de voltar para a roça sempre pulsou no coração da tocantinense, mas, antes, ela precisava formar os filhos. Com os filhos criados, Hilma mudou-se para um terreno na área rural de Parauapebas, largou o ofício de costureira e se tornou uma empreendedora.

Ela é uma das 55 mulheres que mudaram de vida por meio da agricultura. Juntas, fornecem merenda para escolas de Marabá e Parauapebas. Para além das hortaliças hidropônicas (cultivadas na água), mandioca, mamão, entre outros, elas cultivam empoderamento, independência e qualidade de vida. O projeto CoopMusa é uma das iniciativas apoiadas pela Vale e tem como objetivo acelerar e fomentar negócios sustentáveis que, às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), precisam receber cada vez mais foco — o evento vai acontecer entre os dias 10 e 25 de novembro em Belém.

Hilma é empreendedora da CoopMusa / Foto: Elienai Araújo

Com três anos de trabalho na cooperativa, Hilma já realizou sonhos. “Consegui tirar meu carro novo. É um incentivo (o projeto) que faz a diferença e, hoje, me sinto bem, preenchida e estou cuidando da saúde”, conta, com um sorriso largo. A história dela se repete com a de várias outras mulheres que toparam o desafio do empreendedorismo na região. Em 15 anos de atuação, o Fundo Vale investiu R$ 400 milhões, especialmente na Amazônia. Até 2024, foram 400 negócios de impacto apoiados e acelerados. “A gente tem uma diretriz, que é ser um bom vizinho. A empresa tem uma diretoria de relacionamento com a comunidade, e o papel dessa diretoria é estar junto à comunidade, escutando e tentando trabalhar com ela. E aí, quando tem um gap (brecha), a gente pode ajudar a melhorar a vida dessas pessoas”, explica a diretora de Soluções Baseadas na Natureza da Vale, Patrícia Daros.

Diamante Negro da Amazônia 

E as iniciativas são variadas. As irmãs Thainara Vasconcelos, de 24 anos, e Thayse Vasconcelos, de 27, largaram o emprego formal — com benefícios como plano de saúde — para criar uma startup de pimenta sustentável. A Dinam (Diamante Negro da Amazônia) é pautada pela sustentabilidade e utiliza uma árvore (gliricídia) como suporte para o crescimento da pimenta, o que evita o desmatamento para obtenção de madeira. Elas fornecem suporte técnico para produtores locais e firmam parcerias. Também planejam implementar outros Sistemas Agroflorestais (Safs), como o cultivo de cacau e açaí.

Pimenta do reino produzida de maneira sustentável / Foto: Elienai Araújo

As empreendedoras contam ainda com o apoio da Vale e de outras entidades, como o Serviço de Apoio as Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). “A gente se sente como um exemplo que empurra mulheres”, diz Thainara. Já Thayse relembra a reação do pai quando soube dos planos das filhas: “Vai trabalhar, menina”. Mas a confiança não demorou a chegar: a startup foi criada em 2022 e já é um sucesso. “Quem mantém essa floresta em pé são essas pessoas (a comunidade). Então, a gente também precisa conectar essas pessoas, pensar na criação de novas florestas. É um ecossistema, tudo é interligado”, ressalta Patrícia Daros sobre a multiplicação dos Safs.

A história das Filhas do Mel

Para Ana Alice de Queiroz, de 72 anos, o trabalho com o mel a tirou de uma condição de submissão e analfabetismo. Essa história começou quando Izabel Maria Scapim Renosto chegou a Parauapebas e se engajou em projetos sociais. “Ela me incentivou a ir para a escola. Eu não sabia ler nem escrever. Era submissa. Mas conseguimos nossa independência”, conta Ana, que hoje é presidente da Associação Filhas do Mel da Amazônia (AFMA), formada por 23 famílias e com 10 anos de estrada.

Todas as mulheres da iniciativa — que é apoiada pela Vale — são gratas a Izabel, que dedicava horas para ensinar o ofício da apicultura. “Tudo começou há 20 anos com a Izabel, uma mentora que veio do Rio Grande do Sul. Quando ela chegou, houve uma resistência dos homens, mas o tabu foi quebrado”, relembra Rosemir Ferreira Sousa, de 41 anos.

Mulheres aprenderam o ofício da apicultura/ Foto: Elienai Araújo

Com a venda de mel e derivados, Rosemir conheceu o mar, passou a comprar roupas e conquistou muitos outros bens. Jorselância de Arruda, de 46 anos, também ganhou asas com o projeto: “A gente vivia só para cuidar da casa. Izabel veio e nos ensinou a técnica. Tivemos muitas dificuldades, mas fomos nos esforçando e aceitando a ideia de que éramos muito submissas e de que somos capazes. Mudou minha qualidade de vida. Hoje a gente sai, vai a feiras”, diz.

Atualmente a iniciativa conta com o apoio da Vale e da prefeitura para questões como construção de novos projetos, auxílio com aspectos técnicos e tecnológicos.

Mulheres de Barro

Outra frente de atuação das mulheres do sudeste do Pará é a arte. Em 2013, foi criada a Cooperativa Mulheres de Barro que atrai compradores de todos os cantos com vasos únicos feitos com cerâmica e técnicas que dão aspecto único às peças. “A gente agrega também os minérios da região, como o manganês e o  ferro, que é mais avermelhado”, descreve Sandra dos Santos Silva, de 57 anos. No total, a iniciativa conta com 20 cooperadas que trabalham alinhadas à sustentabilidade. O centro de Mulheres de Barro, espaço colaborativo, é patrocinado pelo Instituto Cultural Vale e oferta oficinas para a população com intuito de formar e empoderar mais artesãs. 

Artesanato atrai pessoas de todo o país/ Foto: Elienai Araújo

Preciosidades da Amazônia 

Em 2021, mulheres de Parauapebas começaram a usar sementes, folhas e outros produtos sustentáveis da floresta Amazônica para criar arte. A união entre elas teve início após um curso oferecido pela prefeitura e, agora, vai alcançar um novo patamar. O grupo, que conta com o apoio da Vale, deixará de ser uma associação para se tornar uma cooperativa. Um designer dará consultoria para ajudar na criação de coleções e na profissionalização do trabalho.

“A criatividade do artesão é 24 horas. Eu, particularmente, tenho noites em que acordo com ideias, faço anotações ou gravo um áudio para, no dia seguinte, executar”, conta uma das integrantes do grupo, Gilsandra Brasil Pereira, de 43 anos.

Biojoias da Amazônia/ Foto: Elienai Araújo

*Jornalista viajou a convite da Vale