Plantar sementes, aplicar adubos, pulverizar plantações. Essas atividades podem até não ser novas, mas o jeito de realizá-las tem se transformado nos últimos anos em Minas Gerais. Pequenos, médios e grandes produtores têm descoberto o potencial dos drones para promover operações agrícolas com mais rapidez, menos perdas e economia de recursos financeiros e naturais - sem falar na geração de negócios que movimentam milhões. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag) estimam que em 2024 havia 7.832 drones agrícolas registrados - um aumento impressionante de 2.106% em comparação com 2021, quando haviam 355 drones.

Apesar de a tecnologia ser usada há alguns anos no agronegócio, especialistas apontam que a grande virada se deu em 2021, quando o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) publicou a Portaria nº 298, regulamentando o uso da tecnologia no país e ajudando a popularizar os drones no campo. Desde então, muitos produtores têm comprovado as vantagens de usar o equipamento em suas lavouras, servindo de exemplo para novos adeptos e colaborando para “espalhar a palavra” entre quem planta e colhe no país - mesmo com alguns desafios que o setor enfrenta

Número de drones no agro brasileiro cresceu mais de 2.000% em quatro anos. Foto: Editoria de Arte/O Tempo 

Alexandre Martins, analista de formação profissional da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Sistema Faemg Senar), explica que um dos principais usos é no processo de pulverização - técnica usada para aplicar produtos químicos na defesa das lavouras contra pragas, doenças e plantas daninhas. De acordo com ele, a tecnologia é mais ágil que os tratores em áreas de inclinação acentuadas e mais precisa do que os aviões, uma vez que trata apenas a área afetada. 

“Um avião, por exemplo, daria um tiro de produto em uma área completa, o que gastaria mais produto e atingiria plantas saudáveis. O drone é muito mais preciso e, além disso, tira o contato do colaborador com o defensivo, diminuindo os riscos de intoxicação. Também fica muito mais fácil e rápido identificar problemas na safra e, consequentemente, a resposta se torna muito mais ágil, atenuando prejuízos econômicos”, detalha. 

E o uso dos drones não fica restrito à produção, podendo auxiliar os agricultores em outros aspectos da administração de seus negócios. “O drone pode monitorar focos de incêndio e invasão, aumentando a segurança no campo. É possível mapear áreas, identificando pontos topográficos, reservas ecológicas, estradas e áreas plantadas. Também fica muito mais ágil validar tamanhos de terrenos e registrar imóveis”, aponta. 

Jamerson Cunha, sócio da Facilit'Air, empresa de Belo Horizonte que presta serviços e forma pilotos de drones, acrescenta que a tecnologia também aumenta a capacidade de produção dentro de uma mesma área cultivada - uma vez que nem sempre é possível ao produtor expandir suas terras, seja por questões econômicas ou de licenciamento ambiental. Como exemplo, o empresário cita o caso de um cliente de Elói Mendes, no Sul de Minas.

“Esse produtor de milho fazia pulverização por arrasto, realizada por tratores, o que causava amassamentos e perda da produção. Com o drone, ele aumentou de duas para quatro aplicações foliares na safra - tendo um ganho de 40% a mais na produção final. Além disso, eliminou perdas, uma vez que não havia mais o atrito do veículo terrestre com a plantação.”

Como se não bastassem os ganhos diretos de aumento da produção, o empresário também cita outras vantagens, como a economia de até 80% de água, uma vez que é possível controlar melhor a vazão na hora de pulverizar, acarretando a economia de recursos naturais - o que colabora para potencializar a sustentabilidade no campo. 

“Também resolve uma questão de mão de obra, uma vez que nem sempre é fácil achar pessoas para aplicar os defensivos. O produtor que, no passado, contratava o pai, hoje, muitas vezes, não consegue contratar o filho desse ex-colaborador. Então, principalmente para quem é pequeno ou médio empresário, o drone ajuda a solucionar esse problema”, aponta. 

Drones no céu de Bom Despacho e região

Um dos motivos que tem ajudado a popularizar a tecnologia é a democratização do acesso ao equipamento. O setor tem se dividido entre operadores privados, geralmente produtores rurais ou empresas do próprio agronegócio que utilizam os equipamentos em suas áreas, e empresas prestadoras de serviço terceirizadas. Essa divisão permite tanto aplicações pontuais, quanto operações em larga escala. 

De acordo com números do Sindag, em 2024 os operadores privados corresponderam a 48,3% do mercado, enquanto as prestadoras de serviço representam 51,7% do segmento. Essa última alternativa, aliás, tem provocado uma verdadeira revolução nos céus de Bom Despacho, na região Centro-Oeste de Minas, e seus arredores.

Produtor de soja, e acostumado a usar tratores para realizar a pulverização do plantio, Fúlvio de Queiroz Cardoso Neto está utilizando drones para a realização deste trabalho pela primeira vez em suas fazendas. Ele conta que era resistente à tecnologia, por não saber se ela entregaria os mesmos resultados do veículo terrestre. O serviço, que era realizado por ele e um funcionário, agora fica a cargo da empresa Zagros Drone’s Services.

“Depois de ouvir relatos de amigos decidi testar o serviço e fiquei surpreso. Um dos maiores ganhos é a agilidade. O drone consegue pulverizar cerca de 70 hectares em apenas um dia, praticamente o dobro do que eu conseguia antes. O trator agora só entra na plantação para preparar o solo”, diz o agricultor. 

Fúlvio de Queiroz, presidente da Cooperbom, experimentou os drones pela primeira vez em sua lavoura. Foto: Arquivo pessoal

Proprietário de uma área com cerca de 160 hectares, Fúlvio ainda não consegue estimar se haverá aumento na produção por conta do uso dos drones - mas já comemora uma economia de 20% nos custos da pulverização. “A tecnologia também permitiu que eu plantasse sementes de pastagem, que é algo que eu não fazia antes”, conta. 

Ele, que também é presidente da Cooperativa Agropecuária de Bom Despacho (Cooperbom), afirma que o interesse e a adesão aos drones têm sido crescentes entre os associados. Ao todo, são cerca de 3.600 produtores de Bom Despacho e outros cinco municípios. “Tem sido cada vez mais comum ver os drones nos céus da cidade. Tem muito produtor usando e tendo bons resultados, acho que é um caminho sem volta”, afirma. 

O produtor rural Fabrício Rodrigues Campos, gerente do setor de armazenamento de grãos e da fábrica de rações da Cooperbom, utiliza a tecnologia há cerca de quatro anos, também contratando os serviços da Zagros Drone’s Services. Ele destaca que consegue economizar pelo menos 10% trocando os tratores pelos drones para pulverizar seus 180 hectares de milho e soja em Martinho Campos, que fica a 50 km de Bom Despacho. 

“O veículo terrestre acaba sendo usado em outras demandas. Além da economia financeira e da agilidade, o drone também resolve o problema da pulverização após as chuvas. Com o trator, precisamos esperar mais tempo até que o solo seque, pois corremos o risco de danificar o veículo ou compactar o solo, o que acarreta erosões no solo e redução da infiltração de água, atrapalhando o desenvolvimento das plantas. Com o drone não, basta que o sol seque as plantas e já é possível pulverizar, tornando o processo mais ágil”, compara.   

Já o técnico agropecuário da Cooperbom, Felipe Santos, conta que conheceu a tecnologia em 2019 - apenas um ano depois de começar a prestar serviços para os produtores associados à cooperativa. Atendendo principalmente o distrito de Engenho do Ribeiro, a 22 km de Bom Despacho, ele conta que é perceptível o aumento do interesse dos clientes.  

“Quando começamos, o primeiro produtor convidou outros para acompanhar o trabalho, o que ajudou a popularizar o uso. Hoje, alguns deles já têm seu próprio equipamento após perceber os ganhos operacionais. Para fins comparativos, um trator gasta de 50 a 200 litros de água por hectare, enquanto um drone gasta 8 litros em média. O produtor percebe essas vantagens econômicas e vai abrindo a cabeça para o novo”, garante. 

Fabrício Rodrigues (de chapéu, à esquerda) e Felipe Santos (de blusa verde e jaqueta marrom, à direita): economia financeira e de água com os drones. Foto: Arquivo pessoal 

Além da pulverização, duas safras atrás os produtores da região também passaram a utilizar a tecnologia para realizar o processo de sobressemeadura - técnica na qual novas sementes são plantadas sobre uma cultura já estabelecida, geralmente para aumentar a produção de forragem ou cobertura do solo. Nesse caso, os produtores plantam milheto ou braquiária na pré-colheita da soja. 

“Os drones sobrevoam a área realizando o plantio sem causar danos à cultura, que está no final do seu ciclo e próxima de ser colhida. Também é possível fazer a semeadura, associando duas culturas, como o milho e a braquiária. Assim, o drone realiza a semeadura da pastagem e, em seguida, é feito o plantio em linha usando tratores e plantadoras”, diz. 

Os grandes também usam 

Na contramão de pequenos e médios produtores, que precisam terceirizar o serviço em suas terras, as grandes fazendas já têm seus próprios equipamentos e equipe capacitada para realizar o serviço. Um dos exemplos é a Fazenda Água Santa, que tem quatro unidades e é a maior produtora de batatas do país - sendo uma das fornecedoras da marca Bem Brasil. Uma das unidades, localizada em Perdizes, no Alto Paranaíba, tem 12 mil hectares e começou a usar os drones no ano passado. 

Uma das pessoas à frente desse movimento é o agrônomo e piloto de drones Aaron Morita, que começou como estagiário e foi contratado no mesmo ano em que a tecnologia desembarcou na fazenda. Hoje, ele não apenas é responsável pela pulverização, como também treina outros colaboradores para realizarem a atividade. 

O agrônomo e piloto de drones Aaron Morita em cima de um monte de calcário para ter melhor conexão de sinal (à esquerda) e pilotando um drone (à direita). Foto: Arquivo pessoal 

“Foi algo novo para todo mundo, ninguém sabia usar no início. Tivemos o treinamento básico do pós-venda, mas o restante aprendemos na raça, com informações colhidas na internet e a prática do dia a dia. Mas, é um caminho sem volta. A operação fica mais barata e, ao contrário do que muita gente pensa, os custos de aquisição dos equipamentos também não são altos. Com o valor de um pulverizador terrestre é possível adquirir cinco drones em média”, compara. 

Além dos dois drones em Perdizes, a fazenda também conta com o equipamento em outras unidades: um drone em Uberlândia e outro em Sacramento, no Triângulo Mineiro. Fora do Estado, a fazenda também tem dois drones na Bahia. 

Aaron Morita com outros trabalhadores na Fazenda Água Santa, em Perdizes. Foto: Arquivo pessoal 

“Além da pulverização, também usamos para aplicar bioestimulantes, realizar fotos e mapeamento visual, que nos permite constatar anormalidades, observar onde a cultura não se desenvolveu corretamente e identificar erosões no solo em épocas de muitas chuvas. Todas essas funcionalidades ajudam a mitigar perdas e, consequentemente, aumentar a produtividade”, explica. 

Novidades a caminho 

Após o Mapa regulamentar o uso da tecnologia no país em 2021, a pasta anunciou que um novo decreto e uma nova portaria devem ser publicados em breve. “Os drones evoluíram e a legislação precisa acompanhar”, explicou Uéllen Colatto, auditora fiscal federal agropecuária e chefe da Divisão de Aviação Agrícola do ministério. A fala aconteceu no início de junho em São Paulo durante a Droneshow, evento voltado a prestadores de serviços de drones agrícolas.

Apesar de não detalhar as novidades, Uéllen Colatto afirmou que duas audiências públicas foram realizadas, e a proposta do novo decreto já está sendo direcionada à Casa Civil. Após a assinatura pela Presidência da República, o Mapa deve publicar novas portarias, com regras específicas e atualizadas. 

Outra novidade deve ser a substituição do sistema Sipeagro pelo novo SDA Digital, mais moderno e eficiente, destinado ao credenciamento das entidades de ensino e à certificação do corpo técnico de aviação agrícola.