Campos Altos (MG). Uma "virada de chave" na cultura e no processo de produção da Bioma Café, há cinco anos, foi essencial para garantir os títulos de melhor grão do Brasil e segundo melhor do mundo, conquistados no final de 2024, além de abrir mercados. Localizada em Campos Altos, na região mineira do Alto Paranaíba, a fazenda, especializada em cafés especiais, passou a investir na agricultura regenerativa, prática que busca minimizar impactos ambientais, recuperar ecossistemas e fortalecer a resiliência das áreas plantadas. Isso se refletiu em mais sustentabilidade nas lavouras e mais qualidade e sabor ao produto que é colhido e chega às xícaras dos consumidores.

A proposta consiste em adotar um sistema agrícola com foco em restaurar e melhorar a saúde do solo, a biodiversidade e os ecossistemas. No caso da Bioma, o cuidado com a terra se destaca. No ciclo de produção, são usadas técnicas como cobertura vegetal, rotação de cultura e compostagem, de acordo com o sócio-fundador da empresa, Marcelo Nogueira. “Eu colho o café e faço meu composto orgânico, evitando o uso de outros fertilizantes”, comenta. Hoje, mais de 60% do enriquecimento do solo da propriedade ocorre pela compostagem, e a meta é alcançar 100% ao longo do tempo.

Na fazenda, o adubo natural é produzido por meio da coleta e do aproveitamento de resíduos do próprio processo, como restos de poda, folhas, cascas e palhas, alimentos, entre outros materiais e minerais. Além disso, utiliza-se o plantio em curva de nível em consórcio com abacateiros para prevenir erosão e manter nutrientes na terra. Dos 300 hectares de área, 250 são destinados ao café e 50 aos abacates. “A gente precisa manter o solo vivo, o que significa ter uma diversidade microbiana, com cobertura vegetal o tempo inteiro, sem solo exposto e usando adubo orgânico com alto poder de regeneração. É uma produção inteligente e sistêmica”, detalha. 

Interesse. Nogueira observa que essas práticas se traduzem em qualidade da bebida e reconhecimento no mercado. É também o que atesta o engenheiro agrônomo Caio Lazarini, consultor agronômico e gerencial do projeto Educampo Café, do Sebrae-MG. Ele reforça que a agricultura regenerativa tem ganhado relevância no mundo e se tornou fundamental para quem deseja conquistar mercado, especialmente no exterior, além de se proteger do impacto das mudanças climáticas. “São técnicas que auxiliam o produtor a ter uma plantação mais resiliente na propriedade e manter a produtividade, mesmo com os efeitos climáticos que ocorreram nos últimos anos”, ressalta.

Outro ponto importante, segundo Lazarini, é o aumento da demanda global pelos produtos que utilizam essa técnica. No caso da cafeicultura, são os cafés especiais, cuja produção não se limita aos grãos de alta qualidade e envolve, ainda, manejos sustentáveis. “Os produtos da agricultura regenerativa têm demanda muito forte nos últimos anos, inclusive por grandes empresas, como Nestlé, Danone, Pepsico”, diz. Dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) indicam que exportações de cafés diferenciados cresceram 30% em 2024 em relação a 2023. No primeiro semestre deste ano, há um recuo de 7,4% no volume embarcado, mas a receita aumentou 66%.

Novas gerações são aposta para ampliar o consumo mundial

Contratada pela Bioma Café para acelerar o processo de internacionalização, a Q-grader Cecília Sanada acredita no poder de mudança das novas gerações para que os cafés especiais conquistem mais espaço no futuro. Atualmente, o produto ganha mercado em vários países, mas há grande potencial de crescimento, especialmente no Brasil. “Falta informação, conhecimento. É difícil mudar hábitos e comprar um produto mais caro, porém com alta qualidade e sustentável. Os jovens já têm mais interesse. Estão bebendo menos álcool e optando por bebidas como o café especial”, avalia. 

O sócio da Bioma, Marcelo Nogueira, acrescenta que, apesar dos investimentos na sustentabilidade, dos certificados e dos prêmios conquistados, a fatia de mercado que se preocupa é pequena. “Gostaria de agregar valor ao meu produto, mas o cliente final ainda não exige, na maior parte das vezes”, completa. Por isso, a Bioma iniciou o programa Café com Futuro, que leva estudantes da região para conhecer a produção na fazenda. 

Procura. A demanda no Brasil ainda avança lentamente. Conforme a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), em 2024, embora o consumo geral de café tenha crescido, houve queda na venda das versões tradicionais e extrafortes. Já as categorias superior, gourmet e especial, além de cápsulas e solúvel, registraram alta no ano. 

Assim, a opção dos produtores tem sido ampliar o manejo sustentável das lavouras, aponta o diretor da Federação dos Cafeicultores do Cerrado Mineiro, Juliano Tarabal. “Há investimento contínuo em boas práticas agrícolas, tecnologias sustentáveis e na busca pela qualidade superior do grãos”, afirma. A região é referência em cafés especiais.

No foco da COP30

A COP30, 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, reunirá líderes globais em Belém, no Pará, em novembro, dando ênfase ao debate sobre soluções climáticas e sustentáveis para o mundo. Dentre os temas que serão abordados por entidades e empresas brasileiras está a agricultura regenerativa, com destaque para novas maneiras de produzir alimentos. 

*A jornalista viajou a convite da Bioma Café.