Campos Altos (MG). O crescimento consistente do consumo de cafés especiais no mundo tem gerado oportunidades de negócios para cafeicultores e, agora, surge como alternativa importante em um cenário de aumento das tarifas de importação de produtos brasileiros nos Estados Unidos, principal comprador do grão nacional. Após alta de 31% em 2024, a Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) projetava, antes da taxação de 50% anunciada pelo presidente americano, Donald Trump, nova expansão de 30% nas vendas externas em 2025, puxada pela China e por países do Sudeste Asiático e do Oriente Médio.
Caso a sanção entre em vigor em 1º de agosto, o segmento deve continuar avançando, ainda que a taxas menores, em função da conquista dos novos mercados e da consolidação nos já tradicionais, como Canadá, Japão e Europa. O produtor Marcelo Nogueira, sócio-fundador da Bioma Café, especializada em grãos de alta qualidade, é um dos empreendedores na liderança desse movimento. Especialmente depois de a fazenda, localizada no município mineiro de Campos Altos, no Alto Paranaíba, conquistar o primeiro lugar na etapa nacional da competição Cup of Excellence 2024 (categoria experimental) e o segundo lugar mundial.
Com o título de melhor café do Brasil – e pontuação de 93,14 pontos, recorde nacional –, Nogueira já sentiu o interesse pelo produto aumentar no primeiro semestre de 2025. “O prêmio abriu o mercado para nosso café especial. Cresceu muito o interesse em vários países”, destaca o produtor, que intensificou contato com compradores de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, Singapura, entre outros países.
Atualmente, a Bioma exporta 90% da produção, por meio de parcerias, e tem como principais mercados EUA e Canadá. Os outros 10% ficam no Brasil. “A gente espera que o governo busque diálogo nesse conflito, porque a taxação de 50% torna o produto impraticável para os americanos, e não dá para diminuir o valor da saca para compensar. É preocupante”, avalia. Mas ele reforça, sem revelar investimento, que trabalha para alcançar outros compradores. “Estamos em fase de desenvolvimento de mercado para o mundo”, diz.
Entre os esforços está a recente contratação da Q-grader (profissional especializada na avaliação sensorial de cafés especiais) Cecília Sanada, que soma 18 anos de experiência na área. Em 2025, a fazenda projeta safra de 8.000 a 9.000 sacas de café, com 55% do total de grãos de qualidade superior.
Dedicação. Já a BSCA tem atuado em parceria com outras entidades, como a Specialty Coffee Association (SCA) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), em iniciativas para ampliar o consumo de grãos especiais brasileiros nos mercados interno e internacional. Para a China, por exemplo, onde as bebidas à base de café ganharam espaço, a expectativa é que os embarques alcancem até 150 mil sacas neste ano.
Para o Oriente Médio, que tem preferência pelo consumo do café puro, são ao menos 500 mil. O consumo nessas regiões mantém expansão consistente em torno de 30% ao ano, informa a BSCA, que indica que novos mercados valorizam cada vez mais o grão brasileiro de qualidade superior e produzido de forma sustentável da lavoura à xícara.
* A jornalista viajou a convite da Bioma Café.
Consumo interno cresce em ritmo lento
Conforme relatório do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), o segmento de cafés diferenciados registrou, em 2024, expansão de 31,2% nas exportações, na comparação com 2023, com remessa de 9,1 milhões de sacas de 60 quilos ao exterior. Isso representa cerca de 20% das vendas totais do grão do Brasil.
A receita atingiu US$ 2,53 bilhões no período. Estados Unidos, Europa (Alemanha, Bélgica, Holanda e Itália, principalmente) e Japão, juntos, consomem mais da metade desse tipo de café no mundo. No Brasil, no entanto, a evolução do público é lenta.
Na avaliação da Q-grader da Bioma Café, Cecília Sanada, o brasileiro ainda está aprendendo a tomar o café especial. “É uma mudança de cultura que leva mais tempo. Ainda falta informação, conhecimento, para comprar o produto”, relata. O diretor executivo da BSCA, Vinicius Estrela, destaca que, hoje, existem ações conjuntas para fortalecer o setor e promover imersão tanto para o consumidor interno quanto para o externo.
Entenda mais
- Café especial: é aquele que atinge nota acima de 80 pontos em uma escala de qualidade da Specialty Coffee Association (SCA), que chega a 100 pontos. São grãos que reúnem sabor limpo, boa acidez, complexidade aromática, corpo equilibrado e não têm defeitos.
- Avaliação. Além da qualidade sensorial, esses cafés diferenciados precisam de um cuidado extra em todo o processo de produção. Eles são plantados com técnicas de rastreabilidade, responsabilidade social e outras práticas sustentáveis, características requisitadas pelo mercado internacional.
- Certificação. A região do Cerrado mineiro, localizada no noroeste de Minas Gerais e onde fica a fazenda Olhos D’Água, da Bioma Café, é uma origem de produção de cafés de alta qualidade. Ela tem reconhecimento mundial e foi a primeira Denominação de Origem (DO) no Brasil. Na Cup of Excellence 2024, em novembro, 13 amostras do Cerrado mineiro foram finalistas nas diferentes categorias, o que consolida a região como referência na produção de cafés especiais.
- Processo. Para ser certificada como DO, as fazendas produtoras devem ser localizadas dentro da área da região designada, em altitude de 800 m a 1.300 m, primar pelo uso de boas práticas na produção, entre outros aspectos.