O real está em crescimento frente ao dólar. Em 2025, desde o primeiro pregão, em 2 de janeiro, até às 11h23 desta sexta-feira, a moeda brasileira já se valorizou 14,22% frente à divisa norte-americana. O dólar está em queda firme nesta sexta-feira (22), após o presidente do Fed (Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos), Jerome Powell, sinalizar a possibilidade de corte de juros na próxima reunião, em setembro.
Às 11h23, o dólar caía 0,76%, a R$ 5,435, aprofundando as perdas em relação a mais cedo. No primeiro pregão de 2025, a moeda valia R$ 6,208. Powell admitiu a possibilidade de reduzir os juros do país na próxima reunião da autarquia, que será entre 16 e 17 de setembro. Em discurso no simpósio em Jackson Hole, ele apontou que o risco de a inflação acelerar e o mercado de trabalho enfrentar queda persistem, o que pode levar a uma mudança na política monetária dos EUA. Porém, o presidente do Fed evitou se comprometer com a redução dos juros. Esse foi o último discurso de Powell em Jackson Hole, tendo em vista o fim de seu mandato como chefe do banco central norte-americano em maio.
Nos últimos anos, ele tem usado o palco do simpósio de banqueiros centrais para sinalizar os próximos passos do Fed em relação à política monetária. Em 2024, por exemplo, anunciou que havia chegado a hora de cortar os juros, provocando uma forte desvalorização global do dólar nas semanas que se sucederam. A expectativa era a mesma neste ano. Desde o início do mês, após a divulgação de dados fracos de emprego e de inflação, o mercado tem apostado que um corte nos juros poderá ocorrer já na próxima reunião do Fed, em setembro.
Diferentemente de 2024, porém, o contexto atual tem um fator de pressão que aumenta a incerteza de forma considerável: o tarifaço do presidente Donald Trump. Analistas têm como certo que o aumento das sobretaxas de importação irá elevar a inflação ao consumidor e, no pior dos casos, estagnar o crescimento econômico - cenário que leva o nome de "estagflação" na economia.
Empresas norte-americanas têm contido os efeitos de curto prazo do tarifaço, por exemplo pela compressão de margens e pelo uso de estoques, o que tem afetado os relatórios de dados oficiais do país. Mas, para o mercado, não há como sustentar essas medidas por muito tempo, e algumas leituras já dão sinais de que as consequências das tarifas estão à espreita.
A Bolsa estava em disparada de 1,92%, a 137.094 pontos, no fim da manhã desta sexta (22).
Desdobramentos nos EUA
Na quinta-feira da semana passada, a divulgação dos preços ao produto superou as estimativas ao mostrar alta de 0,9% em julho, versus projeções de 0,2%. O dado é considerado um dos termômetros da economia, já que a inflação ao produtor costuma ser repassada para o consumidor ao longo do tempo. Até então, operadores precificavam 100% de chance de um corte de 0,25 ponto percentual na próxima reunião do Fed. Nesta sexta, a probabilidade está em 75%, segundo a ferramenta FedWatch, e os 25% restantes apostam em mais uma manutenção dos juros na atual banda de 4,25% e 4,5%.
Isso porque o Fed trabalha com um mandato duplo, isto é, observa de perto os dados de emprego e de inflação para decidir sobre a política monetária. O objetivo é levar a inflação à meta de 2% sem grandes danos ao mercado de trabalho. Tendo em vista esse objetivo, o tarifaço de Trump colocou o Fed em uma sinuca de bico. Como as sobretaxas tendem a aumentar os preços ao consumidor e a desacelerar as contratações, qualquer ajuste na taxa de juros terá um ônus para alguma das pontas do mandato duplo.
Por um lado, juros altos contêm a disparada inflacionária por desestimularem a tomada de empréstimos e o consumo. Por outro, afetam as empresas, que podem reduzir o número de funcionários ou parar as contratações, resfriando o mercado de trabalho. Já um corte nos juros traria o cenário oposto: aqueceria o mercado de trabalho, mas também estimularia a inflação.
"Os investidores aguardam para saber o que Powell vai trazer e é importante acompanhar a fala porque estamos em um contexto de incerteza econômica muito elevada, há muitas dúvidas e pouca confiança sobre como a economia norte-americana vai evoluir", diz Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.
A probabilidade de um afrouxamento monetário também caiu após a divulgação da ata da última reunião do Fed, em julho. O documento mostrou que os dois dirigentes favoráveis a um corte pareciam isolados entre os demais membros do comitê: "Quase todos os participantes consideraram apropriado manter a faixa da taxa de juros entre 4,25% e 4,50% nesta reunião", diz a ata.
Os dirigentes Michelle Bowman e Christopher Waller votaram pela redução de 0,25 ponto percentual para proteger a economia de um enfraquecimento ainda maior do mercado de trabalho. Os outros, porém, se mostraram mais preocupados com um possível repique inflacionário por causa das tarifas de Trump.
O discurso de Powell poderá mostrar se ele se uniu àqueles que acham que chegou a hora de tomar medidas para proteger o mercado de trabalho de um enfraquecimento maior, como Bowman e Waller, ou se ele continua alinhado com aqueles que são mais cautelosos com a inflação.
A perspectiva de cortes de juros pelo Fed pode favorecer o real devido à percepção de que, com a taxa Selic em patamar alto por tempo prolongado, o diferencial de juros entre Brasil e EUA permanecerá favorável para o lado brasileiro.
Por outro lado, a cena doméstica tem exercido pressão sobre o câmbio. Na segunda-feira, o ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros só têm validade no país se confirmadas pelo Supremo.
A decisão foi dada em ação sobre o rompimento da barragem de Mariana (MG) e não diz respeito diretamente à disputa entre Brasil e Estados Unidos. Na prática, porém, indica que o ministro Alexandre de Moraes, colega de corte de Dino, não pode sofrer as consequências da imposição da Lei Magnitsky, da qual foi alvo em julho pelo governo Donald Trump.
Como sinalizou o magistrado, instituições financeiras do país podem ser penalizadas se aplicarem sanções contra Alexandre de Moraes. Essa percepção fez o setor bancário derreter na Bolsa na terça, tendo perdido mais de R$ 41,3 bilhões em valor de mercado.
Relator do julgamento em que o ex-presidente Jair Bolsonaro é réu por tentativa de golpe de Estado, Moraes está na mira do governo Trump desde o mês passado. O magistrado é acusado de determinar prisões de forma arbitrária e suprimir a liberdade de expressão. (Com Folhapress)