O tarifaço de Donald Trump entra em vigor hoje com a cobrança de uma taxa de 50% às exportações brasileiras. E em meio ao início da vigência da barreira comercial, a agropecuária nacional aguarda novas isenções aos produtos do setor. A grande expectativa está em torno do café, responsável por quase 20% da receita das negociações do agro aos Estados Unidos no primeiro semestre deste ano.

Dados do Agrostat, do governo federal, mostram que as negociações brasileiras com os norte-americanos, entre janeiro e junho, totalizaram US$ 6,63 bilhões. Os valores relacionados ao café somaram US$ 1,29 bilhão. A relevância financeira do produto na balança comercial pesa para forçar uma negociação entre os países para tirar a bebida do tarifaço, mas outro fator que interfere nos debates é a produção nos cafezais dos Estados Unidos.

Por lá, a produção supre apenas 1% da demanda do país, enquanto a cafeicultura brasileira abastece quase 40% do volume ingerido pelos americanos. O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) trabalha junto ao setor nos EUA e agentes de comércio exterior para que o insumo seja tratado como produto natural e não seja incluído na política econômica da Casa Branca - cenário semelhante ao do cacau, responsável por US$ 73,7 milhões em exportações no primeiro semestre de 2025.

Caso as tratativas não avancem, a alternativa é incluir o café na lista de isenções anunciada por Trump no ato da oficialização do tarifaço ao Brasil, segundo o Cecafé. Um levantamento feito pelo Estadão mostrou que no agro mais de 80% dos produtos negociados com o mercado estadunidense não foram dispensados de cobrança. A lista de bens que estão livres da alíquota de 50%, entre eles o suco de laranja, representa uma movimentação de US$ 1,220 bilhão dentre o volume total embarcado pelo agronegócio no primeiro semestre.

Jackson Campos, especialista em comércio exterior, acredita que há um cenário favorável à retirada do café do tarifaço, mesmo que a curto prazo. No ano passado, o Brasil enviou cerca de 8 milhões de sacas do produto aos EUA. “Além de ser difícil de encontrar novos fornecedores, há a questão regulatória dos produtos que são adaptados ao mercado brasileiro e passam por testes de qualidade e pureza, o que acaba forçando o mercado americano a comprar do Brasil, ainda que por um tempo”, avalia.

Campos lembra que o risco inflacionário internamente na economia norte-americana, com a vigência da sobretaxa, também pode impactar a decisão. “Essa compra com a taxação deve elevar o preço e gerar inflação, o que provavelmente será motivo para que estes produtos sejam retirados em breve da lista”, analisa. Especialista em comércio exterior e gerente de produtos da Saygo Comex.

Stefânia Ladeira pondera que os Estados Unidos podem ter dificuldade de buscar o café em outros destinos, como Vietnã e Colômbia - que têm taxas mais atrativas do que a do Brasil para exportações. O entrave está ligado a uma oferta menor, além de entraves logísticos que podem ser enfrentados. “É um movimento sensível e mais complexo do que simplesmente mudar o porto de destino, porque envolve negociações e liberações sanitárias adicionais”, complementa.

Outros produtos

Além do café, agentes do mercado apostam que a carne vermelha, que também ficou de fora das isenções, possa ser incluída em uma nova lista ou ter uma taxa diferenciada dos demais setores. “Os pescados devem ter redução, mas não é esperada para todos os produtos, porque os Estados Unidos têm alguns ítens, como a lagosta, cultivada em regiões americanas. Carnes e frutas esperamos uma redução, mas o setor de frutas não exporta tanto para os Estados Unidos, então, mesmo com a tarifa, não terá um impacto tão relevante”, aposta Stefânia Ladeira.

Os Estados Unidos absorveram cerca de 77 mil toneladas, ou US$ 148,3 milhões, de frutas brasileiras no ano passado, de acordo com a Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados. Além do agro, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, pondera que o setor de ferro-ligas pode ficar livre de taxas - ou ter um alívio na alíquota.

“É um setor de interesse dos americanos”, analisa Roscoe que vê o setor industrial com maior relevância à economia dos EUA do que a agropecuária. O presidente da Fiemg cita, ainda, que é positiva a possibilidade, aventada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de incluir a exploração de terras raras e minerais críticos em negociações com a Casa Branca.

“É uma negociação, inclusive, com a gente. Porque quem detém essa tecnologia hoje é a Fiemg e o Senai de Minas Gerais. O que eles querem não é a terra rara propriamente, é o desenvolvimento em comum de tecnologia”, observa. “Mas tudo vai depender de negociações bilaterais. Não adianta a gente conjecturar o que pode acontecer, se essa mesa de negociações não for trabalhada. É hora do Brasil sentar à mesa”, finaliza Roscoe.