O presidente Lula chegou a cogitar ligar para Donald Trump, para convidar o líder norte-americano para a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), que será realizada em novembro, em Belém (PA). Mas todo mundo sabe que, se a ligação acontecesse, seria apenas protocolar. Os Estados Unidos decidiram sair do Acordo de Paris e não devem ter uma representação federal no evento que trabalha as negociações para mitigar as questões climáticas. 

O governo Trump faz questão de se manter afastado de todas as discussões mundiais ligadas ao meio ambiente, mas é bem possível que os Estados Unidos percam muito ao deixarem de estar presente em eventos que acabam envolvendo praticamente todas as nações do mundo - sejam elas ricas ou pobres, impactadas ou não pelas mudanças climáticas.

Numa reportagem intitulada “Os EUA estão de fora da cúpula climática mais importante da última década. Isso pode representar uma vitória para a China”, a CNN internacional mostra que a ausência oficial do país na COP30 pode entregar vantagens ao principal concorrente econômico. “(Isso) poderia dar uma vantagem geopolítica à China, permitindo que o maior concorrente global dos Estados Unidos se posicionasse como um parceiro global mais confiável e estável”, diz a reportagem. 

A reportagem deixa claro que a mitigação das mudanças climáticas se tornou um ponto estratégico para a China, que não só utiliza as tecnologias de baixa emissão de gases do efeito estufa em seu país, como também as exporta. “É provável que a voz da China seja ouvida mais alto (na COP30), já que eles identificaram o crescimento em tecnologias verdes como um pilar fundamental de sua estratégia econômica”, disse Joeri Rogelj, cientista climático do Imperial College London, à reportagem da CNN.

Lugar de diálogos

A COP30 poderá ser um espaço de liderança estratégica para a China não só no campo das questões ambientais, mas também em todos os debates diplomáticos relevantes do mundo. Isso porque a conferência é uma grande oportunidade para encontros de diplomatas e líderes mundiais. 

"Como toda a certeza, não é raro que espaços multilaterais, sejam eles quais forem, dedicados às mais diversas matérias, sejam aproveitados pelos representantes nacionais para que travas possam ser desatadas nesses momentos. Um grande exemplo que a gente tem é, por exemplo, o próprio G20, que é um outro momento multilateral. Foi onde o (chanceler brasileiro) Mauro Vieira fez encontros bilaterais com praticamente todos os países que estavam aqui no Rio de Janeiro”, explica Caio Victor Vieira, que é especialista em políticas climáticas, parceiro da ONG Instituto Talanoa na preparação para a COP.

Segundo ele, ainda não é possível mensurar qual será o impacto da ausência oficial dos Estados Unidos na conferência, porque os agentes subnacionais (como governadores, por exemplo) devem estar presentes. “Sejam os republicanos, sejam os democratas, eles são muito interessados nos debates e na economicidade das soluções às mudanças do clima, principalmente a energia solar e eólica. A gente percebe que principalmente na Alemanha existiram diversos representantes estatais interessados em estar no debate, em participar e de alguma forma, em fazer negócios”, prevê Vieira. “Seja a adaptação climática, seja a transição energética, no final do dia mesmo, isso ocorre em nível municipal ou estadual”.

Para o especialista, uma prova de que muitos países estão interessados nos debates diplomáticos previstos para a COP30 é a pressão que tem sido feita para que a rede hoteleira de Belém reduza os valores absurdos que estão sendo cobrados para o período do evento. “Isso é um sinal claro de que os países ainda estão interessados em manter não só o debate, mas também manter viva a implementação das ações necessárias para combater as mudanças climáticas”, afirma Vieira, lembrando que além da China, a União Europeia também é um ator que está entre os principais emissores de gases do efeito estufa, porém interessados em mitigar a questão. 

Vieira explica que o debate em torno da questão climática é incontornável. A questão é: quem vai ganhar e quem vai ganhar mais com ele? "Ganha mais quem faz mais, melhor e primeiro. Então, está todo mundo disposto a dar essa importância para a COP, principalmente os setores econômicos, mas não somente eles. Porque tem na COP para esse ano todo um debate sobre como é que isso chega nas vidas das pessoas do dia a dia, do cotidiano, no rotineiro", diz.

"Mudanças climáticas são sobre isso, sobre essa modernização ecológica da economia, mas também sobre os efeitos na vida das pessoas. É sobre o carbono? Sim. Mas também é sobre a humanidade. É sobre o risco, sobre o preço dos alimentos, sobre a capacidade econômica de continuar se desenvolvendo e gerando bem-estar para as pessoas. Nisso está todo mundo interessado", completa o especialista.