Visibilidade LGBTQIAPN+

Calcinha ‘trans’ criada por empresa mineira faz sucesso entre LGBTQIAPN+

Peça íntima pensada para mulheres trans conta com um bolso frontal para acomodar o órgão sem marcar na roupa; com a novidade, a La Bely Lingerie espera crescer 25% em vendas

Por Raíssa Pedrosa
Publicado em 19 de janeiro de 2024 | 06:00
 
 
 
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No Brasil, estima-se que a população transgênero ou não-binária seja de aproximadamente 2%, segundo pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB), em São Paulo. Isso representa cerca de 3 milhões de pessoas que habitam a comunidade LGBTQIAPN+, um universo que pede cada vez mais visibilidade e também representa um nicho de mercado que requer produtos representativos. Enxergando essa demanda, a empresa mineira La Bely Lingerie, localizada no Sul de Minas, criou, em julho de 2023, uma calcinha pensada especialmente para mulheres trans. Produto que, desde então, é só sucesso.

O modelo da lingerie foi pensado para facilitar na hora de acomodar o órgão genital - ato popularmente conhecido pela comunidade LGBTQIAPN+ como ‘aquendar a neca’. Uma solução ‘simples’ que agradou o público-alvo e trouxe um novo posicionamento da marca no mercado.

De acordo com a empresária e estilista da La Bely, Zaine Marques, a calcinha virou sucesso de vendas em poucos meses. Para se ter uma ideia, a primeira remessa, de 800 calcinhas, foi totalmente vendida em pouco tempo. Na segunda remessa, ela dobrou a produção e já vendeu 78% do estoque. A expectativa é que a empresa cresça 25% este ano. 

A fábrica trabalha com atacado e varejo e fornece, por exemplo, para sacoleiras, que “abraçaram” a ideia. “Não são todas que vão aderir à ideia e uma peça como essa, mas as que abraçaram a ideia têm tido um retorno muito bom e muito positivo. Tanto que elas têm voltado a comprar com a gente para repor o estoque”, revela Zaine.

Mas como assim calcinha trans?

A empresa, localizada em Juruaia, conhecida como a capital da lingerie, apostou no produto como um item que pode ajudar a solucionar um problema comum enfrentado não só por mulheres trans, como também travestis e drag queens: a hora de ir ao banheiro.

Zaine Marques conta que a ideia surgiu quando ela ouviu falar de relatos de mulheres trans a respeito da dificuldade que enfrentavam ao sair de casa para comer fora ou participar de eventos. “Elas não querem marcar a área íntima, né? E como elas não têm onde acomodar aquela área, acabam prendendo o órgão até com fita ou colocando várias calcinhas ao mesmo tempo. Então, muitas vezes, elas deixam de ir ao banheiro porque, se forem, sai tudo do lugar. Elas deixam de ter uma vida saudável por causa disso”, diz. 

“A minha família inteira tem problemas no rim, então, se nós temos problema no rim podendo ir ao banheiro toda hora fazer xixi, beber água e tal, imagina elas. Eu me coloquei na pele delas”, conta.

Após esse insight, Zaine procurou uma influenciadora local, a Marcelle, uma mulher trans, para ajudar na criação de um modelo de calcinha que auxiliasse no quesito de acomodar o órgão, sem necessidade de aparatos que trazem desconforto, como as fitas adesivas. “A gente foi fazendo os ajustes de acordo com o que ela passava para a gente”, conta Zaine sobre o processo de criação, que contou com inúmeras provas e experimentos de tecidos e modelos até ficar “perfeito”.

Após alguns meses e muitas trocas, em meados de julho de 2023, Zaine chegou a uma solução até “simples”. A versão final possui uma bolsa frontal para acomodar a genitália e um fecho atrás, na altura do cóccix, semelhante ao de sutiãs, para que o órgão fique alinhado e não “escape” da roupa íntima.

Influenciadora mostra como funciona a calcinha

Zaine conta que, mesmo com a aprovação de Marcelle, ela pediu feedback às demais clientes que compraram o item. “Cada uma tem um corpo, então eu precisava saber se o que deu certo para uma, deu para todas”, conta.

Após a criação da calcinha, em poucos meses, veio mais um produto da linha: o biquíni, chamado de Beach T, que também foi pensado com ajuda da Marcelle. Com o biquíni, Zaine pensou em novos modelos e cores que pudessem agradar os clientes.

As peças, inclusive, têm preços acessíveis e estão disponíveis no mercado em tamanhos diferentes e diversas cores. Durante a 15ª edição do Outlet de Juruaia, que acontece até 31 de janeiro, o biquíni é vendido a partir de R$ 59,90, e a calcinha entre R$ 29,90 e R$ 39,90.

Crescimento

A empresa de Zaine surgiu em 2012, ao lado da irmã, em Borda da Mata, no Sul de Minas, onde foi morar para construir uma família. Após cerca de quatro anos, elas retornaram para Juruaia, onde nasceram, para tocar a empresa na cidade que é também conhecida pelo recorde da maior calcinha fio dental do Brasil.

Trabalhando com lingeries de diversos tipos, Zaine viu com a criação do biquíni e da calcinha voltados para a comunidade trans a oportunidade de se posicionar no mercado e conquistar um novo nicho. “Foi muito bom para a gente tanto em faturamento quanto em crescimento profissional”, conta. “A criação da calcinha trans e do biquíni trans foi algo que veio para a gente ter um posicionamento bacana da empresa. O pessoal hoje nos conhece bem mais”, diz Zaine. 

A ideia agora é consolidar o produto e depois pensar, quem sabe, em novos produtos para atender novos públicos, como sutiãs que tragam bem-estar a mulheres que passaram por mastectomia ou mesmo mulheres trans que não têm busto. “Nossa meta é sempre criar algo inovador”, diz.

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