Rombo

Cigarro ilegal apaga R$ 2,3 bi

Organização criminosa sonegava impostos utilizando até títulos de mais de cem anos, diz Receita

Por Wallace Graciano
Publicado em 20 de julho de 2017 | 03:00
 
 
 
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Em atuação conjunta, a Polícia Federal (PF), a Receita Federal e o Ministério Público Federal (MPF) deflagraram, nessa quarta-feira (19), em Varginha, no Sul de Minas Gerais, a operação Ex Fumo. A investigação busca desmembrar uma quadrilha que atua na fabricação de cigarros e que teria sonegado ao menos R$ 2,3 bilhões aos cofres públicos.

De acordo com a PF, as investigações, que foram iniciadas em 2015, identificaram uma quadrilha que atuava há mais de uma década no setor cigarreiro de segunda linha, com três marcas (não reveladas pela PF), duas fábricas e diversas distribuidoras, sem repassar os devidos tributos ao Tesouro. No Brasil, o cigarro é vendido pelo preço mínimo de R$ 5, sendo que R$ 4 são impostos.

Uma das fábricas funcionou na legalidade até 2014, quando foi fechada após acumular mais de R$ 1 bilhão em dívidas tributárias. Os contraventores migraram para outra fábrica e aprimoraram o esquema, montando uma complexa engenharia para driblar a Receita e blindar os reais beneficiários do esquema.

Eles atuavam na produção paralela de cigarros – fabricavam mais do que estavam autorizados, fraudando a contagem da Receita Federal –, e na sonegação de impostos. A partir de 2014, passaram a declarar parte desses impostos por meio da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF), e, em seguida, faziam a compensação com créditos “podres” de títulos da dívida pública até do ano de 1916, que não poderiam ser usados.

Assim, a empresa, embora tenha declarado milhões de reais em débito de IPI, recolheu impostos correspondentes a apenas 5,97% de seu faturamento em 2015 e 0,00% em 2016. Ou seja, no ano passado, o grupo não pagou um real sequer em tributos federais, embora tenha tido um faturamento milionário.

Segundo o delegado da Receita Federal em Varginha, Alessandro Martins dos Santos, além da dívida tributária, a atuação do grupo é uma questão de saúde pública. “Nossa ação conjunta mostra o esforço da nossa linha de investigação. Imagina o reflexo que esses R$ 2,3 bilhões teriam para a sociedade, as políticas que seriam revertidas. Imagina como é perigoso ter um produto sem fiscalização circulando por aí”, avalia.

No total, foram cumpridos 20 mandados de busca e apreensão, além de quatro de prisão temporária nos municípios de São Gonçalo do Sapucaí, no Sul de Minas; em São Paulo, Campinas, Ribeirão Preto, São José dos Campos, São José do Rio Preto, no interior paulista, no Rio de Janeiro e em Uruguaiana (RS).

Três pessoas teriam sido presas, e uma quarta ainda tem mandado de prisão em aberto. Os envolvidos são investigados por associação criminosa, falsificação de papéis públicos e sonegação fiscal, podendo ser condenados a até 12 anos de prisão.

Produção paralela renderia R$ 50 milhões/ano

Além da fraude tributária, as provas coletadas até o momento apontam, ainda, para a existência de uma linha paralela de cigarros, que seriam produzidos e comercializados fora dos controles da Receita Federal e do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo o órgão, a comparação do estoque de insumos da fábrica atualmente operada pelo grupo com a produção da empresa nos anos anteriores indica que foram adquiridas matérias-primas suficientes para produzir uma sobra de, pelo menos, 15 milhões de maços de cigarro. Esse valor corresponderia a quase um terço da produção anual da empresa. Ainda de acordo com a Receita Federal, somente essa produção paralela renderia ao grupo em torno de R$ 50 milhões por ano.
De acordo com a Anvisa, o quadro é ainda mais alarmante, pois a ausência de controle sobre o produto pode trazer ainda mais riscos ao consumidor.

A reportagem entrou em contato com a Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo) para repercutir a operação Ex Fumo, porém, até o fechamento da edição, não obteve respostas. (WG)


Ex Fumo

Nome. A operação foi batizada de Ex Fumo em referência à expressão latina “ex fumo dare lucem” (algo como “produzir a luz a partir da fumaça”), que foi utilizada na obra “Ars Poetica”, do poeta romano Horácio, escrita em 19 a.C.

Apreensão. Nos quatro Estados onde a operação foi realizada, foram apreendidos documentos, computadores, HDs internos e externos, celulares e mídias de armazenamento, que serão posteriormente analisados pela Polícia Federal

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