Finanças

Consignado do Auxílio Brasil pode endividar os mais pobres, dizem especialistas

Beneficiários poderão tomar empréstimo com desconto diretamente do benefício, quando Medida Provisória for sancionada pelo governo federal

Por Gabriel Rodrigues
Publicado em 24 de julho de 2022 | 08:10
 
 
 
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Os cerca 18 mihões de beneficiários do Auxílio Brasil terão acesso ao crédito consignado, modalidade de empréstimo cujo pagamento será descontado diretamente do benefício pelos bancos. A medida pode ajudar a aliviar dívidas, ponderam especialistas, mas, por outro lado, se não houver planejamento financeiro pode aprofundar ainda mais o endividamento das famílias brasileiras, em um país que soma quase 67 milhões de inadimplentes, segundo a Serasa. 

A liberação do crédito consignado para o Auxílio Brasil foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Além de estender o empréstimo para quem recebe o Auxílio Brasil, a Medida Provisória (MP) 1.106/2022, que legaliza a opção, também aumenta a margem consignável de trabalhadores com carteira assinada, servidores público e aposentados, isto é, permite que uma parte maior da folha de pagamento seja comprometida pelo empréstimo. Para os beneficiários do Auxílio Brasil, o limite previsto é de 40%, ou até R$ 240 mensais. 

“Vejo que é uma mudança positiva, porque, de maneira geral, o consumidor está precisando desse dinheiro, e esse valor gera uma liquidez que ajuda a pagar o que ele precisa e a girar a economia. Mas ela se torna negativa se o consumidor não tomar o crédito de maneira consciente ou para algo de que não precise efetivamente”, pontua a gerente da Serasa Amanda Rapouzo. A O TEMPO, ela também deu uma série de dicas para avaliar se o crédito consignado vale a pena

Ele ganha vantagem em relação a outras categorias de empréstimo porque, como está atrelado diretamente à folha de pagamento, fornece uma garantia maior aos bancos e, por isso, tem uma taxa de juros menor. Mas, justamente por descontar o valor automaticamente, é um risco para quem não tiver planejamento financeiro. Quando for transformada em lei, a MP ainda precisará de uma regulamentação sobre o crédito consignado, que poderá estabelecer limite de juros cobrados pelos bancos. Hoje, em bancos privados, os juros mensais da modalidade vão de 1,22% a 4,82%, segundo o Banco Central. O rotativo do cartão de crédito, em comparação, pode ter taxa de juros de até 22,39% ao mês. 

“Se a pessoa consome toda a sua margem de crédito para comprar algo de imediato, sacrifica sua renda futura, o que pode se tornar um problema. Se você tem um empréstimo pessoal e a taxa de juros do crédito consignado for menor, pode usar esse crédito para reduzir seu endividamento, trocando uma dívida cara por uma menor, mas cuidado, porque estará usando parte da folha de pagamento para cobrir uma dívida, então precisa de muito controle do seu rendimento”, orienta o Danilo Pereira Brito, certificado pela Associação Brasileira de Planejamento Financeiro (Planejar). 

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) publicou uma nota condenando a liberação do consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil, em que enfatiza que apenas os bancos se beneficiarão. “A concessão do crédito consignado para população que depende da renda de programas sociais, é, antes de qualquer crise, um ato de covardia do governo para dar mais dinheiro ao setor bancário às custas do endividamento dos mais pobres”, afirma a economista e coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto, Ione Amorim, ao site do Idec. A entidade calcula que os bancos poderão reter até R$ 36 bilhões dos beneficiários com a nova medida. 

Os especialistas também alertam que a onda de tentativas de golpe pode aumentar após a extensão do crédito consignado para mais pessoas. Só entre beneficiários do INSS, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), vinculada ao Ministério da Justiça, registrou 32.221 reclamações relacionadas a crédito consignado entre janeiro e maio de 2022. O próprio Banco Central dá uma série de dicas para consumidores tentarem driblar golpes de empréstimo

O que muda com a MP do crédito consignado?

A MP estende o crédito consignado para mais pessoas e aumenta o limite da renda que pode ser comprometida mensalmente pelo empréstimo. Confira os principais pontos de mudança:

  • beneficiários do Auxílio Brasil poderão tomar crédito consignado e comprometer até 40% do benefício com o empréstimo;
  • empregados celetistas e servidores públicos poderão comprometer até 40% da renda
  • aposentados do INSS, quem recebe Benefício de Prestação Continuada (BPC) ou Renda Mensal Vitalícia (RMV), terão margem consignável de 45%.

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