Na casa da designer Maira Gouveia, 28, a cama, a mesa de madeira de qualidade rara e o frigobar são de segunda mão. No guarda-roupa, muitas peças tiveram antes outras donas. Consumidora assídua de lojas, grupos de redes sociais e aplicativos voltados para a venda de produtos usados, ela vê a prática como forma de economizar, e, principalmente, como um estilo de vida.
“Eu acho uma saída para viver de um jeito mais saudável. É muito grave ver o tanto de lixo e desperdício no mundo, está chegando ao limite. Quando vou a brechó, estou dando uma nova vida a uma roupa que poderia ter sido jogada fora, e os móveis antigos têm qualidade muito melhor. Antes, as coisas eram feitas para durar uma vida e, hoje, são feitas para durar muito pouco”, diz Maira, ressaltando que é possível gastar bem menos com itens usados. “Compartilhar é o caminho. Não dá mais para ser tão individualista”, completa.
A crise dos últimos anos e a mudança de hábitos dos consumidores, mais preocupados com a sustentabilidade, em evitar o desperdício, estão impulsionando o mercado de produtos de segunda mão. Topa-tudo, brechós e sebos podem soar antiquados e coisas do passado para alguns, mas estão mais na moda do que nunca, sobretudo entre os jovens.
Há 20 anos na região Leste de Belo Horizonte, o Topa Tudo Avenida vende de tudo: de móveis mais antigos a novos, como cama, guarda-roupa, geladeira e sofá. O proprietário do estabelecimento, Givaldo Barros dos Santos, diz que a procura aumentou nos últimos anos e acredita que a recessão contribuiu: “A crise fez aumentar a demanda. O pessoal procura móveis usados como forma de economizar. A gente vende móveis usados por um preço 50% menor”.
Primeiro sebo da capital, a Livraria Amadeu completou 71 anos no último mês com um motivo a mais para comemorar: o aumento da presença de jovens.
Dos 40 mil livros do acervo, 95% são usados. A maioria sai por R$ 10, mas, quanto mais raro, mais caro – há, por exemplo, primeiras edições e obras autografadas. “O preço do livro novo é muito alto. As pessoas costumam dizer que o brasileiro não gosta de ler, mas acho que tem uma parte do país que gosta, sim, só não tem condições”, diz Lourenço Carrato Coco, filho do fundador do Amadeu, lembrando que, além do preço, os brechós guardam certa magia: “É como encontrar uma pedra preciosa”.
O Madame Mê, brechó na região Centro-Sul da capital, foi criado em 2012 e tem visto a clientela crescer, não só com peças antigas nas prateleiras – a loja vende, inclusive, tendências da moda. “No começo, as pessoas tinham até preconceito, queriam saber de onde vinha a roupa, tinha uma questão de energia. Hoje, elas querem qualidade, mas de forma sustentável”, diz a proprietária Carol Campos.
Internet é o meio mais utilizado para compra dos itens
A internet é, atualmente, o meio mais utilizado para comprar itens de segunda mão. Nos últimos 12 meses, 28% dos consumidores adquiriram um produto usado pela rede – percentual que chega a 39% entre os mais jovens, segundo pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) em setembro.
Os celulares foram os objetos usados mais comprados pelos usuários (29%), seguidos dos eletrônicos (27%). Os entrevistados também adquiriram roupas e calçados, eletrodomésticos, móveis, brinquedos e artigos infantis de segunda mão pela web.
Para 70% dos consumidores, a principal motivação para a compra de usados é a economia. Para 34% deles, há preocupação em consumir de forma sustentável e consciente, enquanto 24% dos usuários estão passando apertos no orçamento.
“Diante do cenário econômico atual, a venda de usados tem sido a chance para muitas pessoas de adquirir produtos a preços acessíveis e lucrar com objetos que estariam parados ou ocupando espaço em garagens e armários”, afirma a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti. Segundo o estudo, seis em cada dez internautas possuem itens sem uso em casa que poderiam ser vendidos a terceiros.
Para 88% dos entrevistados, a economia de dinheiro com a compra de usados foi significativa. (RM)